A importância de ampliar a participação da sociedade civil no debate sobre a substituição da Lei de Segurança Nacional (LSN) foi o tema de destaque da audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, realizada nessa quarta-feira (28). “Existe uma convergência de que a Lei de Segurança Nacional, elaborada no período da ditadura, precisa ser revogada, por causa de seus traços autoritários. Ao mesmo tempo, os crimes contra o Estado de Direito ainda precisam ser punidos pela lei brasileira. Mas isso não pode ser feito sem a participação popular”, afirmou o deputado e presidente da CDHM, Carlos Veras (PT-PE), ao abrir o debate no colegiado.
Aristides Santos, presidente da Contag, e Alexandre Conceição, do MST, questionaram a aprovação da urgência do projeto de lei (PL 6764/2002), e argumentaram que neste momento a prioridade deveria ser a luta por vacina e alimentos para todos.
Para o ex-deputado federal Miro Teixeira, do Instituto dos Advogados Brasileiros, é necessário que o STF enfrente a análise da constitucionalidade da LSN. A avaliação do advogado é de que existe risco de que a proposição resulte em algo distante do proposto. “Ninguém sabe o que sairá”, declarou. O advogado argumentou que nunca acreditou que a LSN seria recepcionada pela Constituição Federal de 1988.
O jornalista Leonardo Sakamoto falou sobre o impacto da LSN na vida dos jornalistas e sinalizou trechos que considera preocupantes no projeto de Lei. “A Lei de Segurança Nacional vem sendo usada para punir a atividade jornalística, e isso não é de agora, mas tem se acentuado nos últimos tempos. Eu mesmo venho sofrendo ameaças por parte de políticos que utilizam a Lei de Segurança Nacional para tentar dissuadir o meu trabalho. Tanto eu quanto vários colegas temos sido alvo do mesmo artigo, o 26, caluniar, difamar presidente, Senado, Câmara, Supremo, imputando-lhe fato ofensivo à reputação. Mas também há entraves ao trabalho jornalístico presentes nesse novo projeto e nos preocupa. A Lei de Segurança Nacional é um entulho da ditadura, mas para ela ser substituída é preciso ter espaço para um debate amplo, um debate público, para que na prática não tenha um efeito pior”, observou Leonardo Sakamoto.
A 3º vice-presidente da CDHM, Sâmia Bomfim (PSOL-SP), fez um apelo ao presidente da Câmara para que o projeto não seja rapidamente apreciado, sem a participação efetiva da sociedade civil. “Precisamos de uma nova previsão legal que garanta o direito à participação, à livre manifestação e à liberdade de expressão, no entanto, esse debate tem sido conduzido, infelizmente, por ora, de uma forma bastante equivocada, açodada”, comentou a parlamentar.
Criminalização de movimentos sociais
Os participantes apontaram entre os problemas o uso de tipos penais vagos, muito abertos, termos imprecisos, que poderiam favorecer a criminalização de movimentos sociais e agravar condutas autoritárias.
O presidente da CDHM, Carlos Veras, se comprometeu a passar a íntegra das contribuições da audiência para Margarete Coelho (PP-PI), relatora do projeto de lei, e para o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
A audiência contou, ainda, com a participação de diferentes instituições, como o Conselho Nacional de Direitos Humanos, a Comissão Arns, a Associação Brasileira de Imprensa, a Federação Nacional de Jornalistas, o Instituto Vero, o Instituto Vladimir Herzog, entre outras.
A audiência é resultado da aprovação dos requerimentos 7/2021, das deputadas Sâmia Bomfim (PSOL-SP) e Vivi Reis (PSOL-PA); 39/2021, dos deputados Marcon (PT-RS), Patrus Ananias (PT-MG), Frei Anastácio Ribeiro (PT-PB), Nilto Tatto (PT-SP) e João Daniel (PT-SE); e 41/2021, de autoria do deputado e presidente da CDHM, Carlos Veras. O encontro contou com o apoio dos parlamentares Bira do Pindaré, Erika Kokay (PT-DF), Frei Anastácio, Padre João (PT-MG), Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), Helder Salomão (PT-ES) e Orlando Silva (PCdoB- SP).
LSN
A Lei de Segurança Nacional (LSN), criada ainda no período da ditadura, em 1983, lista crimes contra a segurança nacional e a ordem política e social. Aplicada pontualmente desde a redemocratização, a LSN passou a ser utilizada com mais frequência, principalmente por causa do art. 26, que prevê pena de reclusão de 1 a 4 anos para quem “caluniar ou difamar o Presidente da República, o do Senado Federal, o da Câmara dos Deputados ou o do Supremo Tribunal Federal, imputando-lhes fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação”.
O número de procedimentos aumentou 285% nos primeiros dois anos do governo Bolsonaro, em comparação com o mesmo período dos governos Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB), segundo levantamento da Agência Estado.
A Câmara dos Deputados aprovou no último dia 20 de abril a urgência do Projeto de lei 6764/2002 e apensados, que define, no Código Penal, os crimes contra o Estado Democrático de Direito e revoga a Lei de Segurança Nacional.
Assessoria de Comunicação-CDHM