Momento lúdico, com Hino Nacional sendo dedilhado em viola de cocho por Abel dos Anjos, maestro, pesquisador e professor, e expositores soltando a voz, antecederam o debate político que ocorreu no Seminário de Nacional de Cultura, nesta quarta-feira (25), em Brasília. Organizado pela Comissão de Cultura da Câmara Federal, presidido pela deputada Professora Rosa Neide (PT-MT), o evento apontou para a retomada do Ministério da Cultura como eixo principal, e pelo estado de conferência permanente em busca de políticas públicas que vão ao encontro do setor.
“Diante do cenário de luta e resistência do setor cultural, temos a missão de defender a cultura nesses tempos sombrios e ampliar as bases para a travessia nesse ano decisivo para a democracia brasileira, quando precisamos desafiar todos os desmontes impostos e sonhar com as perspectivas para reconstruir a pasta da cultura”, afirmou Rosa Neide na abertura dos debates.
Rosa Neide convidou os participantes a engrossarem fileira nessa luta que, para ela, é de todos. “Considerando o objetivo desse primeiro Seminário Nacional de Cultura, em 2022, com o tema Esperançar: Cultura em Estado de Conferência, provoco e convido cada um dos senhores e das senhoras, cada agente cultural e a sociedade civil como um todo, para sonhar um sonho possível: a recondução da cultura como um dos alicerces para as mudanças necessárias da nossa sociedade e estrutura de base para a soberania nacional”, enfatizou a parlamentar.
Reconstrução do Brasil
Em sua exposição, o presidente do Fórum de Secretários e Dirigentes Estaduais de Cultura do Nordeste, Fabiano Piúba, apontou à necessidade de se pensar o papel e o lugar da cultura na reconstrução do Brasil. Ele acredita que a cada momento em que um artista, um agente cultural “põe o pé em qualquer lugar, estaremos em processo de reconstrução do Brasil, mas, sobretudo, na sua redemocratização”.
Para ele, o processo de redemocratização do País tem a ver com a ideia de restauração, renovação, e de reforçar as fundações depois de “uma longa tempestade”. “Porque esses quatro anos que ainda estão em passagem, eles são muito longos. Precisamos pensar na construção na perspectiva de recuperar os valores que se perderam no tecido social ou moral”, recomendou Fabiano Piúba.
“Quero destacar que nessa redemocratização, reconstrução, refundação e regeneração do Brasil através das artes, da cultura, temos a retomada do Ministério da Cultura e a retomada do Ministério da Cultura num outro patamar, que o deve assumir um outro lugar de relevo na agência política social e institucional”, afirmou Piúba.
Estado de Conferência
Sobre o estado de conferência, o ativista cultural lembrou que faz algum tempo que os fazedores culturais já se encontram nesse estado. “Estado de conferência político, espírito e mobilização que nos fez aprovar e executar a Lei Aldir Blanc 1, e que vai nos fazer também, derrotar os vetos das Leis Aldir Blanc 2 e Paulo Gustavo. É esse estado de conferência que vai fazer com que a gente possa estar derrubando esses vetos”, mostrou-se, esperançoso, Piúba.
Cesta básica
O cantor Flávio Renegado disse que as pessoas precisam entender a cultura não só como algo extraordinário, mas como algo ordinário, que tem que estar no dia a dia da população. “Ela (cultura) tem que estar na cesta básica, ela é que nos alimenta, que nos ajuda a situar a história de um povo, a história de para onde avançar o povo, porque um povo sem passado é um povo sem presente, é um povo sem futuro. E é isso que eles querem quando fazem esse desmonte das políticas culturais”, afirmou Renegado.
Segundo o músico, os governantes atuais querem fazer com que as pessoas esqueçam do passado e daquilo que as alimentam e dão força. “E a cultura é, sim, o nosso arroz com feijão. Ela que precisa alimentar o nosso povo com alegria, com esperança e com muito amor para gente continuar seguindo nessa luta”, defendeu.
Pandemia
Renegado lembrou que setor cultural foi altamente abalado, o que mais sofreu com a pandemia e o menos assistido pelo governo. Segundo ele, o governo deveria entender que tem profissionais, famílias que dependem e vivem da produção cultural desse País. “A gente quer atenção para que a gente possa continuar dando o mínimo de dignidade, que é pôr comida na mesa dessa população que precisa”.
Nesse processo pandêmico, lembrou Renegado, a cultura ajudou de forma diária as pessoas a resistirem, “porque a gente estava presente nas casas com lives, com shows, com peças de teatro e ajudando a não enlouquecer, apesar desse País ser uma máquina de triturar as pessoas, de triturar seres humanos, triturar sonhos, a gente continua mantendo acesa a chama da esperança no coração povo brasileiro”.
“O que a gente quer é dignidade, a gente não está pedindo nada demais, a gente quer dignidade para continuar o nosso exercício, que é de levar cultura para as pessoas”, reiterou Flávio Renegado.
Reconstrução do MinC
Em sua fala, o secretário Nacional de Cultura do PT, Márcio Tavares, disse que um dos grandes desafios do momento é a reconstrução do MinC e a importância dessa reconstrução.
“O MinC é uma conquista democrática do Brasil. É um ministério que surgiu com a derrota da ditadura, com a reconquista da democracia em 1985”, lembrou o dirigente.
Outro fato destacado pelo dirigente partidário foi a fala de Celso Furtado, figura ilustre que exerceu a função de ministro, na criação do MinC. Segundo Márcio Tavares, o economista foi o segundo ministro que passou pela pasta e cunhou a frase: “A sociedade é que produz cultura, ao Estado cabe o papel de animador, difusor e promotor de cultura”.
Para Márcio Tavares, essa frase do então ministro “embala e sintetiza” a importância e o motivo de o MinC ser tão necessário. “Se a gente não tiver o Ministério da Cultura como uma instituição governamental capaz de agir na indução, promoção e na condução das políticas culturais, essa finalidade fica inviabilizada”, sentenciou.
Trincheira
A ex-presidente da Cecult, deputada Benedita da Silva (PT-RJ) destacou a importância do seminário para que se retome o momento rico que foi a discussão e aprovação da Lei Aldir Blanc 1. “Nós tornamos a Comissão de Cultura uma trincheira e nós recebemos nesta Casa muito apoio, exatamente dos fazedores de cultura quando nós unimos nossas forças, e a capacidade de articulação feita por Marcio Tavares e Cris Ramirez foram fundamentais para que nós tivéssemos, em tempo, todas as considerações necessárias e demandadas pelo conjunto dos coletivos, dos profissionais, trabalhadores da cultura”, recordou Benedita.
Mobilização
A parlamentar destacou também a importância da mobilização para derrubar os vetos de Bolsonaro às leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc 2, previstos para serem apreciados na próxima semana. “É importante que os vetos às duas leis sejam derrubados, mas como vocês fizeram com a Lei Aldir Blanc 1, quando tivemos assembleias permanentes, e é exatamente o que está se propondo agora com relação às conferencias”, afirmou a deputada ao se referir ao estado de conferência.
Conferência Nacional
Sobre as Conferências Nacionais de Cultura, Benedita disse que não se pode aceitar que o elemento cultura, que é fundamental na formação do povo brasileiro, tenha o tratamento que o governo Bolsonaro quer dar. “Não podemos aceitar uma conferência vinda de um governo que não dialogou com ninguém, que é de cima para baixo. Vai propor o quê? Vai restaurar o Ministério da Cultura? Vão restaurar o orçamento? Vai dar robustez ao Plano Nacional de Cultura? Não. Nós sabemos que nada disso irá acontecer”, criticou Benedita.
Ataque ideológico
Em breve substituição à coordenação da mesa de debate, o deputado Airton Faleiro (PT-PA), que já foi vice-presidente da CCult, disse que o setor cultural brasileiro foi vítima de muito ataque, mas também de muita reação e conquista. “Quando acabou o MinC, quando se atacou ideológica e politicamente a cultura, nesta comissão aprovamos a Lei Aldir Blanc 1”, lembrou.
“O Brasil hoje está mobilizado. Os fazedores de cultura estão mobilizados para derrubar os vetos. É um jogo de braço, temos muito que costurar na Câmara, Senado e nos diversos fóruns para derrubar os vetos a essas leis tão importantes para o setor cultural brasileiro”, afirmou Faleiro.
Também participaram do evento os parlamentares Erika Kokay (PT-DF) e José Guimarães (PT-CE), Aurea Carolina (Psol-MG), e Manoel Rangel, cineasta, ex-diretor-presidente da Ancine (2006-2017); Maria Mariguella, vereadora de Salvador (PT) e gestora cultural; João Roberto Peixe, gestor cultural; Clarice Calixto, professora de Direito da Cultura e doutora em Direito; Joana Munduruku, professora, mestra em História; Tatá Edson, coordenador do Colegiado das Teias Nacionais Legislativas em Defesa dos Povos Tradicionais de Matriz Africana; Karla Martins, presidente da Comissão Organizadora de Conferência Popular de Cultura.
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Benildes Rodrigues