Em nota oficial divulgada nesta segunda-feira (12), o deputado Padre João (PT-MG), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, repudiou a nova legislação para a demarcação de terras indígenas que o governo golpista de Michel Temer pretende, segundo o jornal Folha de São Paulo, impor através de decreto.
Na nota, Padre João diz que a eventual alteração da legislação para favorecer os grandes latifundiários “será o maior retrocesso nos direitos indígenas desde a promulgação da Constituição de 1988”. Segundo o parlamentar, a medida poderia acirrar ainda mais os conflitos no campo. “A média de assassinatos de indígenas por ano é atroz: são 68 mortes no Brasil ao ano. Esse quadro de violência tem raízes históricas profundas, relacionadas ao próprio processo de colonização, mas persistente ainda no século XX, quando, segundo documentos levantados pela Comissão Nacional da Verdade, os indígenas seguiram sendo expulsos de suas terras”, ressaltou o deputado mineiro.
“Esperamos que a notícia não se confirme, e que possamos avançar, e não retroceder na proteção dos direitos humanos no Brasil”, conclui a nota assinada por Padre João, cuja íntegra segue abaixo.
Presidente da CDHM repudia nova normativa para demarcação de terras indígenas
Repudiamos veementemente o que seria a nova normativa para demarcação de terras indígenas, segundo divulgado pela Folha de São Paulo na data de hoje. Tal decreto, se realmente publicado, será o maior retrocesso nos direitos indígenas desde a promulgação da Constituição de 1988.
A possibilidade de contestação de terras indígenas demarcadas e consolidadas e a positivação, por via infralegal, de propostas contidas na PEC 215 implicarão no agravamento dos conflitos no campo. Além disso, são medidas inconstitucionais. A Constituição determina que as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios sejam demarcadas. A norma maior do ordenamento jurídico brasileiro não estabelece quaisquer outros requisitos além da tradicionalidade. Esse conceito, aliás, é eliminado pela proposta anunciada: não conta o vínculo existencial de uma comunidade indígena com determinado território. O que conta é a necessidade de expansão do agronegócio e de liberar terras para o mercado.
A proposta desconsidera ainda a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, que estabelece que qualquer ato normativo que tenha implicação nos direitos indígenas deve passar por consulta prévia desses povos.
A média de assassinatos de indígenas por ano é atroz: são 68 mortes no Brasil ao ano. Esse quadro de violência tem raízes históricas profundas, relacionadas ao próprio processo de colonização, mas persistente ainda no século XX, quando, segundo documentos levantados pela Comissão Nacional da Verdade, os indígenas seguiram sendo expulsos de suas terras.
Esses problemas têm se agravado nos últimos anos: estabelecimento do marco temporal pelo STF e o avanço da tramitação da PEC 215 – esses dois retrocessos podem ser consolidados pela proposta anunciada. Além disso, há a CPI do INCRA e da FUNAI, que visa a criminalizar gestores e lideranças indígenas. A proposta é coerente com a linha do governo não eleito, usurpador dos direitos dos trabalhadores e das minorias. A previsão de perda orçamentária da FUNAI em 2017, em comparação com o ano de 2007, beira os 70%.
A Comissão de Direitos Humanos e Minorias vem, nos últimos anos, dedicando-se com afinco à questão indígena. E não apenas integrantes do legislativo brasileiro se preocupam. A ameaça aos direitos desses povos é reconhecida internacionalmente. Na última semana contamos com a participação do Parlamento Europeu em diligência à terras tradicionais no Mato Grosso do Sul. O Parlamento Europeu aprovou resolução pela qual condena veementemente os atos de violência perpetrados contra as comunidades indígenas do Brasil. A resolução faz um apelo às autoridades pela demarcação de terras e para as políticas pelos povos indígenas. A resolução ainda manifesta preocupação quanto à PEC 215. A normativa que seria proposta pelo Ministro da Justiça vai no sentido justamente oposto da preocupação internacional, além de ter o potencial de estimular mais atos de violência contra indígenas.
Esperamos que a notícia não se confirme, e que possamos avançar, e não retroceder na proteção dos direitos humanos no Brasil.
Brasília, 12 de dezembro de 2016.
Deputado Padre João
Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias
Câmara dos Deputados