Na CCJ, parlamentares pedem vista ao relatório do projeto que ameaça terras indígenas

Indígenas continuam mobilizados em Brasília. Foto: Tiago Miotto/Cimi

O relatório do deputado Arthur Maia (DEM-BA), sobre o projeto de lei (PL 490/2007) que praticamente acaba com a demarcação de terras indígenas no País e permite a violação desses territórios por meio de atividades econômicas, foi lido nesta quarta-feira (16), na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. Durante toda a manhã, parlamentares do PT e dos demais partidos de Oposição tentaram obstruir a votação a fim de impedir a leitura do relatório. Porém, a maioria governista derrubou todas as tentativas. Restou à Oposição pedir vista ao relatório e empurrar a votação para a próxima semana.

Entre outros retrocessos, o parecer sobre o PL 490/2007 transfere do Poder Executivo para o Congresso Nacional a responsabilidade pela demarcação de terras indígenas e ainda restringe essas demarcações com base no marco temporal, tese que prega o reconhecimento de terras indígenas apenas daquelas ocupadas no ato da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. A proposta ainda permite a execução de obras de infraestrutura (hidrelétricas, estradas) sem a permissão dos povos ocupantes do território e ainda libera atividades econômicas como a mineração.

Durante o debate, os parlamentares petistas reafirmaram que a proposta é totalmente inconstitucional, porque tenta alterar a proteção assegurada pela Constituição Federal aos povos indígenas por meio de um simples projeto de lei. Falando em nome da Liderança da Minoria, o deputado José Guimarães (PT-CE) afirmou que, se a CCJ realmente aprovar o projeto, certamente ele será derrubado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

“Esse projeto terá grande repercussão mundial. Investidores estrangeiros já estão saindo do Brasil por conta da desastrosa política ambiental, e a CCJ ainda quer mudar a Constituição por um projeto de lei? Nunca vimos isso no Congresso Nacional. A CCJ não tem esse poder”, protestou.

A coordenador da Bancada do PT na CCJ, deputada Maria do Rosário (PT-RS), ressaltou que esse projeto é mais um ataque sofrido pelos povos indígenas ao longo da história. Ela ainda reafirmou o compromisso do PT em lutar contra a aprovação da proposição.

“Os povos indígenas são atacados desde a ideia falsa de um descobrimento quando na verdade os índios aqui já viviam. Esses povos resistentes do Brasil, desde a Região Amazônica até o Rio Grande do Sul, olham para nós agora e perguntam: continuará esse genocídio e teremos nossos direitos desrespeitados? Nós, do PT, não seremos cúmplices desse genocídio e convocamos todos os brasileiros a se colocarem contra o PL 490/2007 e a favor da Constituição Brasileira, que garante o direito à terra aos povos indígenas”, destacou.

Maria do Rosário coordena bancada do PT na CCJ. Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

A quem interessa a aprovação do PL 490/2007?

Ao também criticarem a tentativa de aprovação do relatório contrário aos direitos dos povos indígenas, a deputada Erika Kokay (PT-DF) e o seu colega Rui Falcão (PT-SP) apontaram que interesses econômicos poderosos estão interessados no projeto. Segundo Erika Kokay, “impedir novas demarcações de terras baseadas no marco temporal” – ignorando que vários povos foram expulsos de suas terras tradicionais antes da promulgação da Constituição de 1988 – “e permitir que territórios sejam explorados sem a autorização dos povos indígenas, interessa apenas ao garimpo e madeireiros ilegais que querem se apropriar das terras indígenas”.

Já o deputado Rui Falcão reclamou que esse tipo de proposta seja discutida sem a participação de representantes das comunidades indígenas do País. Cerca de 700 lideranças indígenas de todo o País ocuparam nesta quarta o gramado do Congresso Nacional e protestaram contra o projeto.

“Enquanto lá fora centenas de lideranças indígenas são barradas por uma muralha de policiais, aqui dentro os ruralistas, e os representantes dos grileiros, dos garimpeiros e madeireiros ilegais, que têm como cúmplice o ministro bandido do Meio Ambiente, Ricardo Salles, comemoram. Eles são os únicos beneficiados por esse projeto de lei”, acusou.

O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) disse que a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara está praticando uma violência contra os povos indígenas do País.
“A CCJ está praticando a maior violência contra os povos originários do Brasil que preservam o nosso meio ambiente com um olhar superior à nossa cultura branca. Temos que retirar esse PL da pauta porque além de inconstitucional ele é imoral”, criticou o petista.

Na justifica do PL 490/2015, o autor da proposta – ex-deputado Homero Pereira (PR/MT), que já faleceu – confessa que a transferência da responsabilidade pela demarcação das terras indígenas do Poder Executivo para o Congresso Nacional visa atender interesses econômicos. À época, o autor do PL dizia que esse tema não é um assunto exclusivamente indigenista porque envolve temas como exploração mineral, recursos hídricos, além de construção de grandes obras de infraestrutura, como hidrelétricas e estradas. A bancada ruralista e da mineração são entusiastas do projeto.

STF pode sepultar a tese do marco temporal

Um dos pilares do projeto de lei 490/2207 pode ser derrubado nos próximos dias pelo STF. Desde a última sexta-feira (11) a Suprema Corte, por meio do plenário virtual, julga uma ação de repercussão geral (que vale para as demais decisões na justiça sobre temas semelhantes), sobre a utilização da tese do marco temporal para demarcação de terras indígenas. O julgamento deve durar até o dia 18 de junho. O ministro Edson Fachin já apresentou voto contrário à tese do marco temporal.

Representantes de tribos indígenas na Câmara pressionam contra aprovação do PL 490. Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Héber Carvalho

 

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