Representantes de entidades da sociedade civil e de movimentos sociais, e parlamentares do PT, acusaram o governo Bolsonaro pela carestia dos alimentos e pela onda de fome que assola o Brasil. Durante audiência pública da Comissão de Legislação Participativa (CLP), ontem (2), que debateu o tema, de iniciativa do deputado Rogério Correia (PT-MG), foi apontado que a insegurança alimentar que atinge mais da metade da população brasileira é fruto de um projeto de poder que beneficia apenas a exportação de grãos, ao mesmo tempo em que deixa a agricultura familiar e as políticas públicas de combate à fome morrerem à míngua.
Logo na abertura da audiência pública o presidente da CLP, deputado Pedro Uczai (PT-SC), destacou que “discutir a carestia, a fome e insegurança alimentar e nutricional que atinge os brasileiros é tratar da falta de qualidade de vida experimentada pelo povo no atual governo Bolsonaro”. Sobre esse assunto, o representante da Rede PENSSAN Renato Sérgio Jamil Maluf apresentou números que provam incontestavelmente a falta de ação do governo Bolsonaro para tentar reduzir a fome e a insegurança alimentar que atinge grande parte do povo brasileiro.
Desigualdade social
Segundo ele, a organização produziu dois inquéritos sobre a situação brasileira nos últimos anos. No primeiro, realizado em dezembro de 2020, foi detectado que 45% dos domicílios se encontravam em situação de insegurança alimentar. Já no levantamento realizado em dezembro de 2021, este número chegou a 60% da população, o que representa um acréscimo de 36 milhões de pessoas nessa condição.
“E os domicílios mais vulneráveis à insegurança alimentar são aqueles chefiados por mulheres, sustentados por pessoas de cor parda ou preta, com baixa escolaridade e localizado no meio rural. Isso mostra que a fome e a insegurança alimentar têm gênero, cor e reflete a imensa desigualdade social que existe no País”, denunciou Renato Maluf.
Representando o Instituto Fome Zero, Flávio Botelho disse que esse cenário assustador só ocorre pela total ausência do Estado. “Temos poucas políticas públicas para combater a fome e a prioridade do atual governo para essa área é zero”, lamentou.
Falta de prioridade
Ao contrário da ausência de prioridade do atual governo para combater o problema, o deputado Rogério Correia observou que nunca antes o agronegócio ganhou tanto dinheiro com a exportação de grãos.
“Além da carestia dos alimentos, quando vemos pessoas ‘namorarem’ a carne nos supermercados e terem que levar ovo, vemos que esse governo não tem política pública para beneficiar a agricultura familiar que coloca a comida de verdade na mesa do povo, mas que apenas privilegia a exportação de grãos”, acusou.
Alexandre Conceição, da coordenação nacional do MST, afirmou que essa situação é fruto de uma escolha política do atual governo. “Na época da colonização portuguesa, o Brasil era obrigado a produzir para exportar. Como já dizia Karl Marx, a história se repete como tragédia ou farsa. A nossa se repete como tragédia. Para combater a fome precisamos combater o latifúndio fazendo reforma agrária e incentivando a agricultura familiar. Este governo é de raiz latifundiária, por isso o Brasil voltou ao Mapa da Fome”, observou.
O representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Aristides dos Santos, apresentou números que comprovam a opção do atual governo Bolsonaro pelo agronegócio e o abandono da agricultura familiar. Segundo ele, enquanto nos governos do PT os recursos para assistência técnica chegaram a atingir R$ 600 milhões por ano, agora não passam de R$ 40 milhões.
“Também tínhamos um plano safra específico, hoje não temos mais. Não temos recursos para o Programa de Aquisição de Alimentos (da agricultura familiar) maior prova do abandono dos agricultores familiares é que a Lei Assis Carvalho, aprovado pelo parlamento e que ajudaria o setor a minimizar as perdas com a pandemia e produzir alimentos para o povo brasileiro, até hoje não foi regulamentada por este governo”, reclamou.
Mudança de rumo e volta do Consea
Para o deputado Padre João (PT-MG), da Frente Parlamentar da Segurança Alimentar e Nutricional, o País chegou à atual situação a partir de um processo iniciado já no primeiro dia de mandato do presidente Jair Bolsonaro, quando em uma só canetada o Consea, Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, foi extinto. O órgão reunia a sociedade civil para discutir políticas públicas para o setor.
“Bolsonaro elegeu como inimigo aqueles que combatiam a fome, a miséria. Por isso que nós temos que mudar o rumo dessa política, retomando o Estado brasileiro para servir ao povo e recriando o Consea para voltarmos a articular políticas públicas de combate a fome no País”, defendeu.
Também discursaram durante a audiência pública as deputadas Maria do Rosário (PT-RS) e Erika Kokay (PT-DF), os deputados Bohn Gass (PT-RS) e Nilto Tatto (PT-SP).
Pelas entidades, participaram ainda representantes do colegiado de presidentes e presidentas dos Conseas estaduais; do Banquetaço; da Fian Brasil; do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional; da Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida; da Frente Parlamentar Contra a Fome na América Latina e Caribe; da Articulação Brasileira pela Economia Francisco e Clara; do Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos; do Conselho Federal de Nutricionistas; dos Agentes de Pastoral Negros, da Ciranda internacional de Comunicação Compartilhada.
Héber Carvalho