Sem a presença do ministro da Saúde, Ricardo Barros, a segunda audiência pública da comissão especial que analisa a proposta de emenda à Constituição (PEC 241) que congela investimentos da União para os próximos 20 anos serviu para que representantes da saúde e da educação denunciassem o tamanho do retrocesso dessa iniciativa legislativa para as duas áreas.
Segundo dados apresentados por Mauro Junqueira, presidente do Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), a perda total da União na aplicação da PEC 241 nos próximos 20 anos, caso a PEC prospere, chegará a R$ 654 bilhões. Desse total, R$ 111 bilhões deixarão de ser repassados aos estados e R$ 308 bilhões aos municípios.
Para defender a proposta em nome do ministro, falou Arionaldo Rosendo, subsecretário de Planejamento e Orçamento do Ministério da Saúde mas quem deu o tom da gravidade da PEC, além de Mauro Junqueira, do Conasems, foi o professor Alessio Costa Lima, presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), e o deputado Patrus Ananias (PT-MG).
O petista fez toda uma argumentação para dimensionar o tamanho do prejuízo da PEC 241, que vai muito além dos setores da saúde e da educação. O parlamentar defendeu que, qualquer caminho a tomar, deve ser decidido juntamente com a sociedade. “Se queremos uma sociedade justa, se queremos políticas públicas eficazes, se queremos segurança pública e educação de qualidade, se queremos ciência e tecnologia para fazer do Brasil um país soberano e independente, se queremos cuidar dos mais pobres, se queremos políticas vigorosas de assistência, de inclusão social, de segurança alimentar, de saúde, de moradia, temos que investir mais dinheiro. Então, é fundamental discutirmos com a sociedade brasileira quais são as prioridades, o que nós devemos fazer para atender essas demandas”, defendeu Patrus.
Nessa perspectiva, o deputado fez várias ressalvas à proposta, que ele chamou de PEC do Desmonte. Disse que, cada vez mais, está convencido de que se trata do desmonte de direitos consagrados pela Constituição de 1988. “É uma PEC inconstitucional, não só porque fere dispositivos ligados a cláusulas pétreas da Constituição, mas porque desmonta a Constituição como um todo. Como ficará o Bolsa Família nesse contexto? Como ficarão os benefícios previdenciários não contributivos? Como ficará o Beneficio de Prestação Continuada? Esse grande BPC, que garante um salário mínimo a pessoas muito pobres, idosas e com deficiência, que tem uma renda inferior a um quarto do salário mínimo? Como ficarão esses benefícios? Temos que discuti-los também!”, questionou.
Saúde – O presidente do Conasems, Mauro Junqueira, fez todo um histórico de como o orçamento da saúde está estrangulado e como é equivocada a decisão de reduzir ainda mais a participação da União no custeio de ações e serviços públicos em saúde (ASPS), já que a própria União, segundo dados apresentados, é o ente federal que, percentualmente, menos investe nessas ações.
“Desde a Constituição de 88, a União vem transferindo responsabilidades para o conjunto dos municípios, e os recursos não acompanham. Desde 2000, os municípios vêm cumprindo a Emenda Constitucional 29 e agora a Emenda Constitucional 86, tendo aplicado no ano passado, em média, 23,5% de recursos próprios da saúde, oito pontos percentuais acima do mínimo constitucional. Isso significou no ano passado para os municípios brasileiros R$ 24 bilhões, além do mínimo constitucional. Ou seja, 100% do IPTU arrecadado no conjunto dos municípios foram aplicados além do mínimo constitucional na saúde”, argumentou.
Junqueira explicou que o mais nocivo da PEC é que ela vai congelar o orçamento da União em saúde tomando 2016 como ano de referência, justamente o primeiro ano de vigência da EC 86, que reduziu o orçamento da saúde com relação ao ano de 2015. “A Emenda Constitucional 86, para nós, foi um grande equívoco do Congresso Nacional, porque, só com a mudança da fórmula de cálculo da Emenda 29 para a Emenda 86, perdemos cerca de R$ 16 bilhões. Congelar ações e serviços públicos em saúde com base no primeiro ano de vigência da emenda 86, que já inicia menos 16 bilhões de reais, é um equívoco que precisa ser corrigido pelo Congresso”.
Ele também destacou que congelar os investimentos em saúde vai potencializar os problemas de custeio, atingindo também os equipamentos que já estão prontos, mas que ainda não estão funcionando por falta de recursos. “Na semana passada, o ministro Ricardo Barros apresentou aos secretários municipais e estaduais de saúde que existem R$ 3,2 bilhões em portarias aprovadas, publicadas, serviços habilitados e não pagos pelo ministério da saúde – 2010, 2012, 2014. Parte dessas unidades está sendo bancada pelos municípios, pelos estados, sem falar aquelas que estão prontas e sem funcionar por falta de recursos. Temos aí quase 100 UPAs no país prontas, estruturas equipadas e sem funcionamento”.
Educação – Alessio Costa, da Undime, argumentou que a PEC 241 vem ameaçar a maior contribuição que o Parlamento brasileiro deu historicamente à educação do País, que foi vincular na Constituição de 1988 recursos para essa área. Segundo ele, uma medida que vem ameaçar essa conquista precisa ser muito bem refletida pelos deputados, sobretudo no que se refere aos “impactos nocivos que essa simples mudança por si provocaria na desestabilização do financiamento do nosso País”.
O representante da educação lembrou ainda que ainda está em início de implementação a Lei 1305, que instituiu o Plano Nacional de Educação (PNE), que é um plano com metas previstas para 10 anos. “Ele tem por objetivo duas coisas bem distintas que se complementam. Uma delas ainda é ampliar o acesso. Ou seja, o Brasil ainda vive o atraso de ter crianças fora da escola, diferentemente de outros países do mundo que são desenvolvidos. Então, como falar em menos recursos se eu ainda tenho crianças fora da escola? Eu não posso fechar os olhos para essas crianças! Estamos sendo incapazes e incompetentes na definição de políticas que assegure que todas as crianças estejam na escola”, afirmou.
O segundo ponto destacado dentro do PNE – explicou Alessio Costa – é que não basta oferecer qualquer educação, tem que ser uma educação de qualidade. “E não se pode falar de educação de qualidade sem investimento, seria falácia. Não existe no mundo inteiro educação de qualidade que tenha um menor investimento. Ao contrário. Se você quer qualidade, tem que investir. Investir em melhoria do uso do recurso, mas tem que investir significativamente no volume de recurso proporcional à melhoria da qualidade que se deseja”, exemplificou.
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