A Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira o projeto de lei (PL 4968/19), da deputada Marília Arraes (PT-PE) e outros, que cria o Programa de Fornecimento de Absorventes Higiênicos nas escolas públicas de ensino médio e de anos finais do ensino fundamental. O programa vai beneficiar também mulheres em situação de rua ou em situação de vulnerabilidade social extrema; mulheres apreendidas e presidiárias, recolhidas em unidades do sistema penal, e; mulheres internadas em unidades para cumprimento de medida socioeducativa. O texto ainda precisa ser apreciado pelo Sendo, deve beneficiar mais de 5,6 milhões de mulheres.
“Estamos fazendo uma reparação histórica. Uma reparação de um Estado, de um sistema de leis que foi feito por homens e para homens e não pensou nessa política pública essencial para as meninas e mulheres do Brasil”, afirmou a deputada Marília Arraes. Ela relembrou que há muito tempo trava uma grande luta pela dignidade de meninas e mulheres terem o direito e o acesso a artigos de higiene menstrual — absorventes —, principalmente meninas de escola. Ela citou dados que mostram que um quarto dessas meninas perdem aulas porque não têm acesso a absorventes.
“Nesta Casa, nós vamos fazer a reparação dessa injustiça, dessa desigualdade de gênero, dessa falta de dignidade por que meninas e mulheres passam todos os dias. Nós vamos ver meninas das escolas que estão em situação de vulnerabilidade recebendo absorventes para poderem disputar com um pouco mais de igualdade com os meninos. Nós vamos ver mulheres encarceradas, meninas em cumprimento de medidas socioeducativas, mulheres em situação de rua recebendo absorventes e tendo mais dignidade por algo que é da sua natureza, é do seu corpo, é da nossa natureza”, completou.
A deputada Rejane Dias (PT-PI), que é autora de projeto que tramitou apensado à proposta da deputada Marília, destacou a necessidade de ajudar também as mulheres em situação de rua, objeto da sua proposta, que incorporado ao texto final da relatora, deputada Jaqueline Cassol (PP-RO). “Fico muito feliz de ver a minha proposta incorporada. Há mulheres que não têm dinheiro para comer e precisam comprar um absorvente. É algo que constrange a mulher, que a impede de sair de casa”, afirmou e acrescentou que o projeto aprovado deve beneficiar, com dignidade menstrual, cerca de 6 milhões de mulheres.
Equidade
E a deputada Maria do Rosário (PT-RS) afirmou que enfrentar a questão da pobreza menstrual é discutir elementos de equidade. “Não é um gasto, é um investimento em saúde e o reconhecimento de que a pobreza menstrual precisa ser discutida, que denomina não apenas a falta de acesso a produtos de higiene menstrual mas também exige de nós um olhar sobre a infraestrutura sanitária nas escolas e nas casas”. Ela parabenizou a deputada Marília, por trazer o olhar para as adolescentes, para as alunas do ensino médio, e a deputada Rejane, por se preocupar com as mulheres em situação de vulnerabilidade, além da relatora, que incluiu as mulheres apenadas.
“Estamos garantindo itens que são tão necessários e mesmo imprescindíveis à qualidade de vida, cuja ausência causa constrangimento e doenças físicas e psíquicas, e compromete o desenvolvimento de direitos reprodutivos”, afirmou Maria do Rosário.
E a deputada Erika Kokay (PT-DF) elogiou o texto aprovado, que amplia as beneficiárias, para que haja absorventes não apenas nas escolas. “Estamos assegurando o absorvente para meninas, para adolescentes, não apenas no sistema de ensino, mas também no sistema prisional, para mulheres em situação de rua ou em situação de vulnerabilidade social extrema. Esse projeto também assegura e contempla uma proposição feita pelo próprio PT de que se incluam na cesta básica os absorventes para meninas, para jovens, para que nós possamos assegurar essa dignidade menstrual”, afirmou.
Reconhecimento da ONU
A deputada Benedita da Silva (PT-RJ) enfatizou que o objetivo desse projeto é combater a pobreza menstrual, que afeta milhares e milhares de mulheres, comprometendo o seu desempenho escolar. Ela informou que a ONU, já reconhece esse direito desde 2014, e estima que uma em cada dez meninas perde aula quando menstrua. Outros estudos, segunda a deputada, também apontam que 70% das mulheres têm queda de produtividade no trabalho durante a sua menstruação e, no Brasil, estudos apontam que, em média, as estudantes perdem 45 dias de aula por não poderem frequentá-las durante o período menstrual. “Cerca de 213 mil meninas não têm acesso nenhum a banheiros com condições mínimas de uso em suas escolas e 26% das mulheres brasileiras não têm dinheiro para comprar absorventes”, completou.
Benedita contou ainda que ela, quando vereadora na cidade do Rio de Janeiro, em 1983, apresentou um projeto sobre cabides em banheiro, do qual as pessoas riram naquele momento. “Eles não captaram o alcance daquele projeto, que era para que nós tivéssemos, nos banheiros, cabides para colocarmos bolsa, pasta, casaco, alguma coisa, para não colocarmos no chão do banheiro. Hoje, minha alegria é ver que, nacionalmente, nossos banheiros têm esse cabide. Nós sabemos quão importante é termos esses cabides, relatou, reforçando o seu apoio ao projeto da dignidade menstrual. “Este é um projeto sério e importante, porque nós temos que fazer com que as nossas meninas e as nossas adolescentes comecem desde já a serem protegidas na área da saúde”.
O deputado Vicentinho (PT-SP) também deu um depoimento pessoal, do tempo de militância no movimento sindical. “Eu sempre ouvia queixas das mulheres sobre pressões das chefias que achavam que as mulheres passavam muito tempo no banheiro. Por isso, esse projeto merece ser festejado. Seria bom se a Câmara sempre votasse projetos garantindo direitos e oportunidades onde quer que as mulheres estejam: na escola, na prisão, nas ruas, nas comunidades”, enfatizou..
Pobreza menstrual
A deputada Professora Rosa Neide (PT-MT) citou a honra que foi ela ter sido relatora do projeto na Comissão dos Direitos da Mulher, onde fiz os encaminhamentos para ouvir pessoas que já têm um trabalho na questão da pobreza menstrual, “um trabalho efetivo de apoiar mulheres, e também as necessidades que são encontradas em todo o País”. Ela informou que ouviu a ONU Mulheres, diretoras de escola, entidades com a Livre para Menstruar, que levanta dados em todo o País.
“Se uma mulher não tiver um absorvente higiênico para utilizar, ela é impedida inclusive de fazer todas as atividades que são inerentes à atividade diária de uma mulher. As adolescentes, as jovens, muitas vezes, deixam de ir à escola. E sabemos qual é o prejuízo das adolescentes que faltam às aulas, faltam às provas por não ter um absorvente. E na condição econômica em que está o País, com certeza, as famílias — entre comprar absorvente e comprar pão — compram pão”, citou Rosa Neide, em defesa da aprovação do projeto.
Texto aprovado
O texto aprovado, que segue para apreciação do Senado, institui o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual para assegurar a oferta gratuita de absorventes higiênicos femininos e outros cuidados básicos de saúde menstrual. O objetivo é combater a precariedade menstrual, identificada como a falta de acesso ou a falta de recursos que possibilitem a aquisição de produtos de higiene e outros itens necessários ao período da menstruação feminina; oferecer garantia de cuidados básicos de saúde e desenvolver meios para a inclusão das mulheres em ações e programas de proteção à saúde menstrual.
Beneficiárias do programa
O programa vai beneficiar estudantes de baixa renda, matriculadas em escolas da rede pública de ensino; mulheres em situação de rua ou em situação de vulnerabilidade social extrema; mulheres apreendidas e presidiárias, recolhidas em unidades do sistema penal, e; mulheres internadas em unidades para cumprimento de medida socioeducativa.
Os critérios de quantidade, forma da oferta gratuita de absorventes e outros itens necessários à implementação do programa serão definidas em regulamento e a lei será implementado de forma integrada entre todos os entes federados, em especial pelas áreas de saúde, assistência social, educação e segurança pública.
Pelo texto aprovado, caberá ao Poder Público a adoção das ações e medidas necessárias para assegurar a oferta gratuita de absorventes higiênicos femininos às beneficiárias do programa. Os absorventes higiênicos femininos feitos com materiais sustentáveis terão preferência de aquisição pelos órgãos e entidades responsáveis pelo certame licitatório, caso apresente igualdade de condições e como critério de desempate.
Despesas
As despesas com a execução das ações previstas nesta lei correrão à conta das dotações orçamentárias disponibilizadas pela União ao Sistema Único de Saúde para Atenção Primária à Saúde, observados os limites de movimentação, empenho e pagamento da programação orçamentária e financeira.
Cesta básica
O absorvente higiênico passa a fazer parte das cestas básicas como kit de higiene. E a lei entrará em vigor 120 (cento de vinte) dias contados da data de sua da publicação.
Vânia Rodrigues