Sem aumento real do salário mínimo, PT vota contra LDO-2023 que mantém orçamento secreto e corta recursos da educação e da saúde

Sessão do Congresso Nacional. Foto: Wesley Amaral/Câmara dos Deputados

Deputado Afonso Florence. Fotos: Wesley Amaral/Câmara dos Deputados

Um acordo entre Oposição e governo para impedir a execução impositiva das emendas de relator (RP9) – conhecidas como emendas secretas –, permitiu a aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO-2023) na sessão do Congresso desta terça-feira (12). O líder da Oposição no Congresso, deputado Afonso Florence (PT-BA), considerou vitorioso o acordo, uma vez que as emendas secretas para o ano que vem, têm volume previsto de quase R$ 19 bilhões. O texto aprovado segue para sanção presidencial.

O deputado Afonso Florence anunciou que a Bancada do PT votava contra a LDO-2023 porque ela visa retirar recursos da educação, da saúde e da ciência e tecnologia, além de renovar as emendas secretas para o ano de 2023. “Discordamos desse orçamento secreto que é nefasto, que não é transparente e que não há equidade na distribuição desses recursos entre os parlamentares”, afirmou.

O projeto de LDO aprovado (PLN 5/2022) prevê déficit nas contas públicas de até R$ 65,9 bilhões e salário mínimo de R$ 1.294 para o ano que vem. Pelo texto, a expectativa de crescimento é de 2,5% do produto interno bruto (PIB), mesmo percentual esperado para 2024 e 2025. Quanto à inflação, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficaria em 3,3%, e a taxa Selic (taxa básica de juros definida pelo Banco Central) em 10% no ano que vem.

Orçamento é uma escolha política

Deputado Enio Verri. Foto: Wesley Amaral/Câmara dos Deputados

O deputado Enio Verri (PT-PR), coordenador da Bancada do PT na Comissão Mista de Orçamento, encaminhou o voto contrário da bancada. “Nós entendemos que essa LDO não representa aquilo que o PT pensa e quer construir para o Brasil no ano que vem. Nós entendemos que há muito ainda que ser mudado no que se refere ao valor do salário mínimo, no que se refere à transparência e, em especial, no que se refere ao orçamento secreto, que nós somos absolutamente contrários. Por isso, o partido orienta não”.

O deputado explicou que o orçamento é uma escolha política. “Quando se escolhe, que não teremos aumento real do salário mínimo, é uma escolha política! Quando se escolhe que nós vamos manter o pagamento dos bancos, que dominam a metade do orçamento do País, é uma escolha política, é uma escolha ideológica, é uma escolha que tem lado, o lado do grande capital, em detrimento dos mais pobres, que sofrem nos dias de hoje”, destacou.

Enio Verri reforçou que o PT é contra a RP 9. “Nós já temos, como parlamentares, um orçamento impositivo no que se refere às nossas emendas individuais e emendas de bancada. Isso permite que nós, que vivemos a realidade nos nossos estados e nos nossos municípios, consigamos transferir recursos do Orçamento da União para esses municípios. É transparente. Todo mundo sabe quanto é – está na foto -, todo mundo sabe quanto cada um distribuiu, e todos sabem quanto cada parlamentar recebe”, explicou.

O deputado denunciou que, quando se cria o RP 9, primeiro “é o Bolsonaro comprando a sua sobrevida, porque senão ele seria cassado”. Segundo “é dar um cheque em branco” para setores do Parlamento. “Imagine: já é um governo fragilizado, que transfere para o Legislativo aquilo que ele é incapaz de fazer, por sua incompetência de dirigir este País, e, mesmo assim, esse valor que ele transfere para cá não nos dá o direito nem de escolher para quem vai nem de fiscalizar esse recurso. Isso é o RP 9. É uma vergonha!”, protestou.

Salário mínimo

Líder do PT na Câmara, Reginaldo Lopes. Foto: Wesley Amaral/Câmara dos Deputados

O líder do PT na Câmara, deputado Reginaldo Lopes (MG), defendeu emenda do partido para recuperar a política de ganho real do salário mínimo – inflação do período mais o crescimento do PIB. “O que nós pedimos com esse destaque é sensibilidade e empatia dos parlamentares pelo nosso povo e pela nossa gente. A inflação vai passar de 10%; o governo está propondo um reajuste menor do que a inflação, de 6%”, pediu o deputado. Ele explicou que por essa proposta o salário mínimo seria corrigido em15%. “Ou seja, não apenas os R$ 82 – R$1.294 a partir de 1º de janeiro de 2023 -, mas, sim, R$ 1.394 de salário mínimo. É um ganho de quase R$ 100 para o trabalhador brasileiro”, defendeu. A emenda, no entanto, foi rejeitada pelo plenário.

Com isso, valor do salário mínimo ficou em R$ 1.294, sem aumento real. O valor foi corrigido apenas pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) de 6,7% projetado para 2022.

Os deputados Rogério Correia (PT-MG), João Daniel (PT-SE) e Leo de Brito (PT-AC) também se manifestaram contra essa LDO e repudiaram a manutenção das emendas secretas.

Ciência e Tecnologia

Os parlamentares aprovaram emenda do líder do PT no Senado, senador Paulo Rocha (PT-PA), que acrescenta artigo ao capítulo sobre as diretrizes para elaboração e execução dos orçamentos da União. De acordo com o dispositivo, o montante anual das operações com recursos reembolsáveis não poderá ultrapassar 15% (quinze por cento) das dotações consignadas ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).

Encargos Sociais

Foi aprovada também emenda do deputado Reginaldo Lopes sobre despesas com pessoal e encargos sociais. De acordo com a emenda, as despesas de pessoal da administração tributária serão custeadas com recursos do Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização (Fundaf), sem prejuízo da destinação de outras fontes de custeio.

Meta fiscal

Para o ano que vem, o total das receitas primárias será de R$ 2,2 trilhões. Em 2024 o governo terá arrecadado R$ 2,36 trilhões, e R$ 2,52 trilhões em 2025. Segundo os consultores, o resultado primário com déficit de R$ 65,91 bilhões previsto para 2023 equivalerá a 0,63% do PIB, menor que os R$ 66,9 bilhões (0,69% do PIB) projetados para 2022. Quanto às estatais federais, o prejuízo será de R$ 3 bilhões, desconsiderando os grupos Petrobras e Eletrobras.

Já a projeção para o resultado primário dos estados, do Distrito Federal e dos municípios é de um déficit de R$ 100 milhões. A estimativa para esses entes federados é apenas um indicador, não uma meta, porque o Executivo federal não tem ingerência sobre o orçamento deles.

Teto de gastos

O limite de gastos da União para 2023 é de R$ 1,79 trilhão, um aumento de R$ 108 bilhões em relação a 2022. Nesse cálculo foram considerados uma estimativa de 6,55% para o IPCA acumulado no período de janeiro a dezembro de 2022 e o ajuste decorrente da diferença entre o IPCA previsto no Orçamento 2022 (10,18%) e o índice apurado após o encerramento de 2021 (10,06%).

Saúde

O valor mínimo a ser aplicado em ações e serviços públicos de saúde (ASPS) pela União é obtido pela correção do montante mínimo de 2022 (R$ 139,8 bilhões) pelo IPCA de janeiro a dezembro de 2022, ainda a ser apurado. Mas, considerando a estimativa de 6,5% para o índice de inflação prevista na LDO 2022, o piso para 2023 será de aproximadamente R$ 148,9 bilhões, calcula a Consultoria de Orçamento do Congresso.

Além desse valor, deverão ser incluídas no Orçamento as despesas com ASPS custeadas com recursos de royalties e da participação especial na exploração de petróleo e gás natural. Permanece a não obrigatoriedade de o Orçamento de 2023 prever a totalidade dos recursos necessários para atendimento do mínimo constitucional em saúde.

Orçamento impositivo

A Constituição permite que deputados e senadores apresentem emendas impositivas destinando recursos para a saúde. As emendas impositivas são um instrumento em que o deputado, senador, comissão ou a bancada estadual indicam ações, projetos e obras que o governo é obrigado a executar.

O montante destinado a essas emendas será equivalente aos valores desse item em 2017, no caso das emendas individuais, e em 2021, no caso das emendas de bancada estadual, corrigidos pelo IPCA acumulado de janeiro a dezembro de 2022.

No Orçamento deste ano, para alcançar os R$ 135,4 bilhões obrigatórios para gastos em saúde, o Executivo considerou que R$ 8,1 bilhões viriam das emendas impositivas, sem contar as emendas do relator-geral.

Educação

O piso constitucional para o investimento na educação foi de R$ 62,6 bilhões em 2022 e deverá ser corrigido pelo IPCA para 2023. Segundo Marcos do Val, de 2016 a 2021 o investimento em educação caiu de 6,5% para 5,3% das despesas totais do Executivo federal, ou 22,1%. Foram R$ 74 bilhões contingenciados e remanejados para pagamento de outras despesas no período, afirma o relator.

Com a aprovação do Novo Fundo do Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), por meio da Emenda Constitucional 108, de 2020, a complementação devida pela União a estados e municípios, que antes era de 10% das receitas totais do fundo, passou para 12% em 2021, 15% em 2022 e deverá ser de 17% em 2023.

Para 2022, o Orçamento da União previu mais de R$ 30,1 bilhões para a complementação do Fundeb. Em 2023, considerando-se a projeção de crescimento real do PIB, estima-se que esse investimento atinja R$ 35 bilhões, dos quais R$ 33,4 bilhões serão gastos para equalizar as condições de financiamento das redes de ensino. Pela primeira vez serão distribuídos recursos segundo indicadores de melhoria da aprendizagem. Para isso está previsto R$ 1,6 bilhão.

Assistência social

Quanto aos sistemas de assistência social, estão reservados R$ 80,2 bilhões para o pagamento do Benefício de Prestação Continuada (BPC), que desde 1996 vem substituindo a Renda Mensal Vitalícia (RMV).

As despesas com o BPC crescem ano a ano, em função do aumento do salário mínimo e do número de beneficiários. Em 2023 serão mais de 4,9 milhões de pessoas beneficiadas. Esse número deve aumentar porque, segundo o governo, há um estoque de mais de 710 mil requerimentos.

Previdência

A arrecadação do regime geral de previdência social (RGPS, do setor privado) é estimada para 2023 em R$ 484,1 bilhões (equivalentes a 5,61% do PIB). Já a projeção da despesa com o pagamento dessas aposentadorias para 2023 é de R$ 846,4 bilhões (8,08% do PIB). Nesse cenário, o governo terá que cobrir um déficit de mais de R$ 259,1 bilhões (2,47% do PIB).

Por outro lado, a despesa com as aposentadorias dos servidores públicos — o chamado Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) — é difícil de ser estimada porque cada órgão público a paga com recursos de seu próprio orçamento.

Fundo de Amparo ao Trabalhador

Já as receitas e despesas do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que financia o seguro-desemprego, o abono salarial e os programas de desenvolvimento econômico do BNDES, estão previstas em R$ 114,12 bilhões e R$ 69,5 bilhões, respectivamente, bem menores que nos anos anteriores.

Segurança pública

A LDO 2023 autoriza a reestruturação e a recomposição salarial da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal e da Polícia Penitenciária, além das polícias Civil e Militar e dos bombeiros militares do Distrito Federal. Para que isso ocorra, as medidas devem ser incluídas pelo Poder Executivo no projeto da lei orçamentária de 2023, que deve ser enviado ao Legislativo até 31 de agosto.

Fica autorizado ainda o provimento de cargos e funções relativos a concursos vigentes das carreiras, até o limite previsto pelo Orçamento do próximo ano. O texto proíbe reajuste do auxílio-alimentação ou refeição e da assistência pré-escolar em percentual superior à variação acumulada do IPCA desde a última revisão de cada benefício.

Contingenciamento

A LDO traz também uma seção específica que prevê proteção a algumas despesas de contingenciamento. Assim, não podem ser bloqueados gastos nas áreas de educação; assistência a estudantes; ciência, tecnologia e inovação; inclusão digital; esporte; promoção e defesa dos direitos da criança, do adolescente, da mulher e do idoso; regularização e fiscalização de terras indígenas; acolhimento humanitário de migrantes e controle de fronteiras; segurança pública; projetos das Forças Armadas; Seguro Rural; defesa agropecuária; saúde animal; rodovias, ferrovias e infraestrutura do transporte aquaviário e aeroviário; saneamento básico; desenvolvimento regional; monitoramento das mudanças climáticas; gestão de riscos e desastres; e combate à pandemia de covid-19.

Execução provisória

A proposta amplia as situações em que o Executivo pode efetuar gastos no caso de o Orçamento da União para 2023 não ser aprovado, sancionado e publicado até 31 de dezembro de 2022. Foram incluídas as despesas relativas a situações de emergência ou calamidades públicas; ao acolhimento de imigrantes em situação de vulnerabilidade; ao controle de fronteiras; e aos encontros de contas. Além dessas possibilidades, o projeto permite que sejam pagas despesas com projetos em andamento cuja paralisação possa causar prejuízos à administração.

 

Vânia Rodrigues, com Agência Senado

 

 

 

 

 

 

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