Reforma Administrativa é inconstitucional e desmonta o serviço público, afirmam sindicalistas e petistas

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) voltou a debater a proposta de emenda à Constituição (PEC 32/2020) da Reforma Administrativa, encaminhada ao Congresso Nacional pelo governo de extrema direita Jair Bolsonaro, nessa segunda-feira (3). Parlamentares do PT e vários representantes de entidades do serviço público afirmaram que a proposta é inconstitucional e acaba com o serviço público brasileiro.

“Essa reforma ataca os princípios fundantes da própria Constituição brasileira. Ela entrega a Constituição como se fosse um prêmio para uma lógica de mercado que alguns teimam em dizer que tem uma racionalidade autônoma e que o mercado, a iniciativa privada, tem uma qualidade que o serviço público não tem”, criticou a deputada Erika Kokay (PT-DF).

A parlamentar destacou que a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), por exemplo, tem um lucro social de R$ 61 bilhões em cima de mais de 150 tecnologias que foram criadas, e é uma empresa pública. Erika também falou sobre o PIX que é um sistema público de transferências de dinheiro e pagamentos instantâneos que permite transações 24 horas por dia, inclusive em fins de semana e feriados. Erika Kokay ainda deu outros exemplos como as universidades públicas que têm excelência em produtividade e conduzem as pesquisas no Brasil. “Essa velha lógica retrógrada, ultrapassada, da década de 90, que nenhum país do mundo consegue seguir com exatidão, como quer seguir o senhor Guedes ‘privatiza tudo’ ou Guedes ‘entrega todo o País’, é uma lógica que não se sustenta frente aos fatos”. A deputada enfatizou que a “PEC é inconstitucional, mas ela também é imoral. Ela é antidemocrática, é antirrepublicana e ela é antidesenvolvimentista”.

Dep. Erika Kokay – foto Agência Câmara

Para a deputada Maria do Rosário (PT-RS) não será fácil para o relator da PEC, deputado Darci de Matos (PSD-SC), encontrar argumentos para a admissibilidade da proposta “que, em vários aspectos no artigo 37, no artigo 60 e em vários outros, acaba por ferir a Constituição”.

“Uma Constituição não pode ser retalhada, simplesmente, sob pena de não deixarmos nada como legado para as futuras gerações e prejudicarmos enormemente as gerações presentes. O melhor e mais importante legado de um Parlamento são suas leis e sua própria Constituição. A descaracterização da Constituição, transformando a dimensão privada em mais importante que a dimensão pública é algo chocante do meu ponto de vista contra o Constituinte originário. Nós não temos esse poder. Não somos constituintes originários e não fomos eleitos para retalhar o texto constitucional”, afirmou a deputada Maria do Rosário.

Dep. Maria do Rosário – foto: Agência Câmara

O deputado Patrus Ananias (PT-MG) assegurou que estará “permanentemente nessa luta, nessa comissão e onde quer que esta PEC esteja para sempre questionar de forma cada vez mais profunda a sua manifesta inconstitucionalidade”.

Dep. Patrus Ananias – Foto: Michel Jesus – AG/Câmara

Mais poder ao Presidente da República

Maria do Rosário também destaca que a PEC aumenta os poderes do atual presidente da Pública e dos futuros. “Dando poderes para que o titular da Presidência da República, que é temporário, é marcado pelo tempo eleitoral, pelo tempo dos mandatos, tome medidas permanentes contra o Estado brasileiro constituído pelo arcabouço constitucional e legislativo de um modo geral”.

Se o texto for aprovado do jeito que está, o chefe do poder Executivo poderá extinguir órgãos, universidades, órgãos da administração direta ou indireta, fundir ministérios e extinguir funções. “Mas que poder é este? E ainda tem a pecha de virem dizer que não afeta os atuais servidores. Afeta os atuais servidores, afeta o futuro da nação, mas afeta, principalmente, a população brasileira. Por isso, eu me posiciono contra essa reforma, por ser inconstitucional, em primeiro lugar, e seguirei debatendo o mérito em demais esferas, como debate, aqui, o tema da não constitucionalidade da matéria”, assegura a deputada gaúcha.

Para o deputado Rui Falcão (PT-SP) esse item do texto, como tantos outros, é “inconstitucional e invade claramente o princípio constitucional da separação dos poderes e da harmonia entre os poderes. É uma exacerbação dos poderes do Executivo em relação ao Judiciário e, principalmente, em relação ao poder Legislativo”. Mas o parlamentar acredita que os deputados e as deputadas “não convalidaram essa supressão das suas competências, das suas prerrogativas legislativas”.

Rui Falcão ainda deixou claro que a Bancada do PT na Câmara quer derrotar logo essa “reforma maligna” na CCJ pela sua “inconstitucionalidade, injuridicidade e ataque ao serviço público nacional”.

Dep. Rui Falcão – Foto – Agência Câmara

Suspensão da proposta

O deputado Alencar Santana (PT-SP) defendeu que o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), deveria suspender o andamento da Reforma Administrativa. “Não é hora, enquanto milhares de pessoas são mortas, temos necessidade, ainda, do isolamento, pois a Câmara não está ainda em seu funcionamento normal. Tratar da Reforma agora é uma traição aos servidores públicos”.

Para o parlamentar, a reforma submete os servidores à vontade do comandante da vez. “Aprovar essa reforma e termos ali servidores, mais adiante, submetidos à vontade do governante de plantão e ao interesse privado é a gente acabar, de fato, com o sentido de Estado, com o sentido de poder público, previstos na Constituição Federal. Por isso que nós não podemos aceitar, não podemos admitir que essa reforma seja aprovada. Não à Reforma Administrativa”.

Dep. Alencar Santana – foto: Agência Câmara

“PEC da rachadinha”

O coordenador de Formação e Organização Sindical da Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal e Ministério Público da União, Thiago Duarte Gonçalves, ressaltou que o texto ataca direitos de servidores atuais, como por exemplo, reduz as férias de professores, afeta os auxílios alimentação e transporte dos servidores, possibilita a extinção de cargos pelo presidente e afeta a paridade dos aposentados. Por outro lado, a PEC não ataca pontos como a revogação da emenda 95 (teto dos gastos) que asfixia a administração pública e não admite que seja fornecido mais serviços públicos de qualidade para a população; não ataca salários extrateto e não ataca o fim do nepotismo.

Para ele, a PEC é inconstitucional e é conhecida pelos servidores como a “PEC da rachadinha”. “É uma PEC que, do ponto de vista constitucional, ataca, a título meramente exemplificativo, os princípios da impessoalidade e da moralidade ao relativizar ou mesmo deixar como exceção o concurso público e a estabilidade. A gente sabe quais são os objetivos estratégicos de quem fez isso: é substituir as pessoas que respeitam a lei, respeitam a Constituição, e colocar as indicações. Entre os servidores, a PEC é conhecida, infelizmente, como PEC da rachadinha”.

Gonçalves ainda defendeu que esse não é o momento mais adequado para discutir uma reforma de Estado e que a CCJ deve rejeitar a PEC.

PEC do desequilíbrio

Para o vice-presidente do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho (Sinait), Carlos Fernando da Silva Filho, a PEC traz desequilíbrio afastando o Estado do cumprimento de suas obrigações constitucionais. “Ela dá ao Estado um papel subsidiário no seu exercício e no seu dever de cumprir a entrega dos direitos constitucionalmente garantidos a todos os cidadãos. Isso significa que é uma opção de projeto de nação que se apresenta, sem qualquer sombra de dúvidas, nesse texto diminuindo sua capacidade de resposta e de atendimento aos que mais necessitam”.

Ele destaca que o momento em que o País vive é trágico, com mais de 14 milhões de desempregados e com uma população subocupada que supera 70 milhões. “Nós temos uma condição de desamparo jamais visto na história desse país, que estão por ocasião da pandemia, num grau de sofrimento extremado. Isso é triste, é lamentável”.

O vice-presidente do Sinait afirmou que os auditores fiscais do trabalho contam com a “sobriedade de todos os representantes desse Parlamento, dessa comissão para que não admitam a PEC 32 por todas as suas inconstitucionalidades e por representar um equívoco político, um equívoco no seu mérito e um equívoco de propósitos. Não podemos repetir os erros da Reforma Trabalhista, os erros da Reforma da Previdência, os erros da Emenda Constitucional 95 e os equívocos que se repetem quando se referem aos serviços e administração pública”.

Carlos Fernando da Silva Filho ainda lamentou todas as decisões equivocadas recentemente tomadas pelos representantes governamentais.

Lorena Vale

 

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