O presidente da Frente Parlamentar em Apoio aos Povos Indígenas, deputado Ságuas Moraes (PT-MT), repudiou nesta sexta-feira (21) a decisão adotada pelo presidente Michel Temer – publicada no Diário Oficial da União (DOU) desta quinta-feira (20) – que pode paralisar a demarcação de centenas de terras indígenas em todo o País. A ação do governo, que é um afago aos desejos da bancada ruralista no Congresso, também foi duramente criticada pelo Procuradoria Geral da República (PGR), que, em nota à imprensa, destacou que os índios “nada podem esperar da administração federal”.
Segundo a decisão de Temer, baseada em parecer da Advocacia Geral da União (AGU), os povos indígenas só poderão ter direito à terra se “a área pretendida estivesse ocupada pelos indígenas na data da promulgação da Constituição Federal”, ou seja, outubro de 1988. Conhecido como ‘marco temporal’, esse entendimento jurídico é criticado por várias entidades que defendem os direitos dos povos indígenas. Segundo elas, a aplicação da norma dificulta novas demarcações.
“A decisão do governo utiliza o mesmo instrumento do marco temporal que a bancada ruralista defende ao tentar aprovar a PEC 215. Essa ação nega os direitos dos povos indígenas, que tradicionalmente ocuparam terras durante dezenas ou centenas de anos, mas que foram expulsos de suas terras e que não as ocupavam na data da promulgação da Constituição”, destacou Ságuas. A PEC 215, a qual Ságuas se refere, transfere do Poder Executivo para o Legislativo a palavra final sobre a demarcação de territórios indígenas.
Como exemplo da dificuldade para novas demarcações com a ação do governo Temer, Ságuas citou o caso do povo Guarani-Kaiowá, no Mato Grosso do Sul, que há décadas reivindica o direito à terra naquele estado. “O próprio governo federal deu título de posse de terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas há 50 anos, e os indígenas expulsos até hoje reclamam o direito à terra. Esse novo entendimento jurídico vai gerar mais conflitos no campo”, vaticinou.
Segundo reportagem do jornal Folha de S. Paulo, publicada na última quinta-feira (20), o parecer da AGU assinado por Temer ocorre no momento em que o presidente busca apoio da bancada ruralista para escapar da denúncia de corrupção feita pela PGR.
O jornal revela ainda, que a medida anunciada pelo governo foi antecipada dias antes pelo deputado Luis Carlos Heinze (PP-RS), membro da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). O jornal afirmou que o parlamentar distribuiu um vídeo na página da entidade em uma rede social no qual explicou que o “parecer vinculante” (da AGU) estava sendo discutido diretamente pelos deputados ruralistas com a Casa Civil da Presidência da República (Eliseu Padilha) e com a advogada-geral da União, Grace Mendonça.
PGR – Ainda de acordo com a Folha, o subprocurador-geral da República, Luciano Mariz Maia, responsável pela coordenação da Câmara da PGR voltada à defesa dos direitos indígenas, disse que os índios não devem esperar “nada” da administração federal, mas sim do Judiciário. Ele informou que, em agosto, o STF deve julgar três ações que tratam do mesmo tema.
Em tom crítico, a nota da PGR disse ainda que o parecer adotado pelo governo “traz as digitais do presidente da República e, portanto, faz dele o responsável direto da política indigenista da sua administração”.
Heber Carvalho
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