A ciência e a tecnologia brasileira vivem um apagão, denunciam petistas

Ministro Marcos Pontes participa de audiência da Comissão de Educação. Foto: Will Shutter/Câmara dos Deputados

A Comissão de Educação da Câmara dos Deputados recebeu, nesta quarta-feira (13), o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações, Marcos Pontes, para que ele pudesse esclarecer a instabilidade nos sistemas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e tentasse explicar porque aceitou se reunir com a deputada neonazista da Alemanha, Beatrix von Storch, oficialmente em seu gabinete. Os parlamentares também fizeram questionamentos sobre os cortes no orçamento da pasta.

Na última quinta-feira, a pedido do Ministério da Economia, o Congresso Nacional cortou do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações R$ 690 milhões. Com a redução, a pasta perdeu 90% do seu orçamento, incluindo recursos que serviriam para o pagamento de bolsas de pesquisa, além de impactar nos projetos já em andamento.

Segundo Marcos Pontes, ele e o presidente Jair Bolsonaro foram pegos de surpresa. “Com relação ao PLN 16, realmente eu fui pego de surpresa. Ontem (12), conversei com o presidente e ele disse que também foi pego de surpresa. Eu pedi ajuda pra recuperar investimentos e ele disse que vai ajudar. Recurso pra ciência e tecnologia não é gasto. É investimento. A questão do PLN ter sido modificado de última hora me deixou muito chateado. Já conversei no governo pra que isso seja reposto e prometeram que isso vai ser restituído”.

Pontes disse que o corte atinge projetos estratégicos como o Centro Nacional de Vacinas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Centro de Energias Renováveis, o Centro de Tecnologia e Desenvolvimento de Pessoas com Doenças Raras e as bolsas da chamada universal do CNPq, lançada no início de setembro, prevendo R$ 250 milhões para pesquisas em todas as áreas.

“A gente sabe dos riscos da ciência e da tecnologia no Brasil mediante a decisão política de um governo de não olhar a educação, a ciência e a tecnologia como prioridades. Já está demonstrado claramente que os investimentos em ciência no Brasil – que estão aí na Capes, no CNPq, vinculados ao Ministério da Ciência e Tecnologia – têm sofrido cortes alarmantes, o que nos deixa, como Comissão de Educação, extremamente preocupados”, afirmou a deputada Professora Rosa Neide (PT-MT).

Deputada Professora Rosa Neide. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Para o deputado Rogério Correia (PT-MG) o ministério está no “mundo da lua” e segue “passando pano” para o governo Bolsonaro. Correia disse ainda que se depender do governo a Ciência, Tecnologia e Educação brasileiras vão para o espaço.

Deputado Rogério Correia – Foto: Cleia Viana – Câmara dos Deputados

Pane e pouco investimento

O ministro falou sobre a pane nos equipamentos do CNPq que deixou indisponíveis por 16 dias as consultas às plataformas Lattes e Carlos Chagas e aos editais do CNPq. Ele garantiu que não houve perda dos dados dos usuários e nem atraso no pagamento de bolsas. Segundo ele, as restrições de orçamento não contribuíram para o incidente, que ocorreu por falha material em duas controladoras, as quais serão substituídas por componentes novos, adquiridos antes do incidente.

“O que o senhor chama de “incidente”, eu prefiro chamar de apagão nas plataformas, foi a maior pane na história do CNPq”, apontou Rogério Correia. O parlamentar ainda questionou como que será mantido o CNPq, a ciência e a tecnologia sem recurso público. Já a deputada Rosa Neide observou que o País precisa ter prevenção, e que um sistema com o porte da Plataforma Lattes não pode ficar correndo risco de apagão. “O senhor disse que não houve perdas para os currículos nem para o pagamento de bolsas, mas é um risco muito grande, o País não pode estar à mercê de algumas migalhas para trocar equipamentos do porte que é e da necessidade que o País tem”, alertou.

De acordo com a deputada Professora Rosa Neide, o Brasil investe cerca de 1% do PIB em Ciência e Tecnologia, e os países desenvolvidos investem 2% a 3,5% do PIB, e esse percentual é crescente. No exterior, a maior parte deste investimento vem das empresas, enquanto que no Brasil o investimento empresarial é apenas metade daquele realizado pelo governo. O orçamento do CNPq caiu de R$ 1,4 bilhão em 2018 para R$ 872 milhões, uma redução de 38%. Só as bolsas de estudos para pesquisadores atuais já custam mais do que isso, cerca de R$ 900 milhões. O CNPq paga, atualmente, cerca de 80 mil bolsistas, em sua maioria jovens pesquisadores, que formam a base da pirâmide da Ciência e Tecnologia no Brasil.

O deputado João Daniel (PT-SE) repudiou os cortes feitos pelo governo nos recursos do orçamento do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações, em torno de mais de 90% do valor. “Nosso repúdio aos cortes no Ministério de Ciência e Tecnologia, das bolsas dos cientistas pesquisadores feitos pelo governo Bolsonaro. Nem o ministro [Marcos Pontes] ele avisou. É um governo que não tem nenhum respeito à pesquisa e à ciência!”, declarou o parlamentar petista.

Deputado João Daniel. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Apagão e negacionismo da ciência

A deputada Erika Kokay (PT-DF) destacou que todos os países que têm vivenciado sua grandeza e ocupado seus espaços com potencialidade, o fizeram a partir do desenvolvimento da ciência e da tecnologia. Ela lamentou o apagão que a ciência brasileira experimenta. “Nós estamos em uma situação extremamente grave; temos o Ministério da Ciência e Tecnologia com o seu orçamento absolutamente solapado. Nós temos por volta de 88% de corte, talvez um pouco mais, o que significa um apagão no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações”.

Para a parlamentar, o corte dos recursos da ciência e tecnologia faz parte da forma como o governo despreza o povo brasileiro e dissemina a política de morte. “Nós estamos vivenciando um negacionismo estrutural, não apenas o negacionismo da ciência, porque o negacionismo da ciência mata, como também as mentiras matam. Nós estamos em um governo caracterizado pela necropolítica, um governo onde há terraplanistas, um governo que despreza a ciência como despreza a própria realidade e busca, nesse negacionismo estrutural, construir uma narrativa para substituir os próprios fatos (…) é assustador o quadro que estamos vivendo”.

Deputada Erika Kokay – Foto: Gustavo Sales-Câmara dos Deputados

Radiofármacos

A deputada Maria do Rosário (PT-RS) questionou o ministro sobre a produção de radiofármacos que são utilizados em tratamentos contra o câncer e destacou que os hospitais já estão importando, mas com grande dificuldade. “Nós não podemos ver esse corte dos recursos no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares e a ausência ou a finalização de uma produção tão importante como radiofármacos, que está sobre a responsabilidade do Ministério da Ciência e Tecnologia ser destruída como neste momento”.

Segundo Marcos Pontes, o PLN 16/21 garante R$ 63 milhões para produção de radiofármacos, mas disse que os recursos precisam ser liberados rapidamente para garantir que não haja interrupção na produção.

Maria do Rosário Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Nazismo

Sobre ter recebido a deputada neonazista da Alemanha Beatrix von Storch, o ministro disse que recebeu um pedido da assessoria da deputada Bia Kicis (PSL-DF) de que a parlamentar alemã gostaria de tirar uma foto com o ministro “astronauta” porque ela teria um familiar também astronauta. Segundo ele, apenas depois soube pela imprensa sobre a ligação da parlamentar alemã com o neonazismo. “Ainda bem que eu não sabia de nada disso antes de recebê-la, senão eu ia ficar numa situação difícil, num conflito interno porque mesmo sendo contra qualquer coisa a ver com nazismo, eu seria obrigado a receber qualquer pessoa, uma representante oficial de um governo amigo. Por obrigação do cargo eu teria obrigação de receber”, explicou.

“Eu gostaria de lembrar que, para mim, esse negócio da parlamentar nazista no Brasil é a cara deste governo. E o senhor já colocou que houve um engano quando a moça foi lhe visitar. Então está respondido e aceita a sua explicação, mesmo sabendo que o Brasil se expôs muito com esse modelo de pessoas que vem ao País com a projeção política que não é a política da democracia e da convivência cidadã e respeitosa e fraterna que a gente quer na humanidade”, criticou Rosa Neide.

O deputado Rogério Correia questionou se o ministro foi “vítima” de um truque, porque disseram que ela era parente de um astronauta. “Há que se ter cuidado com isso, porque tem um ditado alemão que diz que se um nazista se senta à mesa com 10 pessoas e ninguém se levanta, então há 11 nazistas. Ainda bem que o senhor disse que se levantou em relação a isso, porque, realmente, no governo de Jair Bolsonaro, a defesa de tratamento precoce, motociatas antidemocráticas que o presidente faz, nos deixa sempre preocupados sobre qual ideologia, de fato, está sendo construída no Brasil por este governo”.

Lorena Vale

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