A Câmara aprovou na noite desta quarta-feira (13), por 392 votos a 71, o projeto de lei complementar (PLP 11/20), que determina que a cobrança do ICMS terá um valor fixo para combustíveis. O texto foi aprovado na forma do substitutivo do deputado Dr. Jaziel (PL-CE), que obriga estados e Distrito Federal a especificar a alíquota para cada produto por unidade de medida adotada, que pode ser litro, quilo ou volume, e não mais sobre o valor da mercadoria. Na prática, a proposta torna o ICMS invariável frente a variações do preço do combustível ou de mudanças do câmbio, com o objetivo de reduzir o preço dos combustíveis.
O PT votou a favor, mas alertou que a redução é temporária e que o problema dos preços dos combustíveis só será resolvido com a mudança na política de preços da Petrobras. Ao encaminhar o voto da Bancada do PT, o deputado Enio Verri (PR) afirmou que esse projeto de maneira nenhuma atende àquilo a que se propõe. “De maneira nenhuma ele vai resolver um problema que é da política de preços internacionais, cuja culpa é da Petrobras. Portanto, nós estamos transferindo responsabilidades e fazendo um debate pela metade”.
Enio Verri enfatizou que o povo brasileiro sofre muito com a incompetência deste governo, com o preço do gás, da gasolina, do diesel, e não é justo que a nossa população continue sofrendo tanto assim. “Mesmo que seja uma redução pequena e de curto tempo, nós achamos que temos que contribuir para que a população tenha, mesmo que momentaneamente, uma melhor qualidade de vida, pagando menos pelo gás e pelos combustíveis”, argumentou.
Pela estima do relator, que com as mudanças na legislação haverá uma redução do preço final praticado ao consumidor de, em média, 8% para a gasolina comum, 7% para o etanol hidratado e 3,7% para o diesel B.
Contra a dolarização
O líder do PT na Câmara, deputado Bohn Gass (RS) defendeu destaque da bancada do partido que obrigaria a Petrobras a calcular os preços de derivados do petróleo de acordo com os custos de produção apurados em moeda nacional, limitando a aplicação da variação cambial, do preço internacional do barril de petróleo, à parcela de derivados importados. Os reajustes seriam semestrais. “Está é a questão principal: nós estamos colocando esse preço altíssimo para a população brasileira. Se temos produção própria, se temos condição de ter um custo por barril de petróleo de 30 dólares, por que vamos colocar para o povo brasileiro o preço praticado no Golfo, de 70 a 80 dólares? Isso não é possível”, afirmou. Ele acrescentou que jogar para o ICMS dos estados era como a cloroquina, não resolve o problema. “Aqui, com o fim da paridade internacional, com o fim da dolarização, nós temos a vacina”, defendeu. O destaque, no entanto, foi rejeitado pelo plenário.
Bohn Gass destacou que desde que a presidenta Dilma foi tirada do governo, à época pelo Temer e seguido pelo Bolsonaro, o País passou a fazer uma política, de um lado, de desinvestimento – não se investiu mais nas empresas, não se investiu mais em mais refino aqui no Brasil, não se investiu mais em estruturação dos dutos – e de outra parte se submeteu à lógica do capital internacional, das grandes petrolíferas. “Essa é a parte criminosa do PPI, o preço de paridade internacional. Nosso povo brasileiro tem um custo de aproximadamente 30 dólares por barril de petróleo, e, por causa dessa lógica adotada do preço de paridade internacional, se o barril está 70 dólares, se o barril está 80 dólares, com a vinculação, o preço do barril, que poderia ser oferecido a 30 dólares, passa a ser calculado a 70, a 80 dólares”, criticou.
A consequência disso, segundo Bohn Gass, é o preço alto dos combustíveis. “A responsabilidade de mudar esta lógica e vincular o preço internacional faz com que o povo pague caro e a Petrobras passe a ter lucro. Estão deixando de colocar uma política que faça o equilíbrio para que o povo não pague tão caro, para sobrar para os acionistas. Nós estamos numa situação em que o povo brasileiro paga caro por todos os combustíveis: gasolina, R$ 7; diesel, em alguns lugares, já passando de R$ 5 ou perto disso; botijão de gás, R$ 110 ou, em alguns lugares, R$ 120; sem falar do aumento que temos da conta de luz, e no preço da comida para a população”, criticou.
Bohn Gass enfatizou que essa política “nefasta” do Bolsonaro é a responsável de termos a elevação dos preços. “Nós queremos afirmar aqui que o Brasil precisa de uma política que valorize o combustível do poço ao posto, a verticalização, sem as privatizações, adotando uma política correta que não seja a de cobrar a conta do povo para sobrar para os endinheirados rentistas”, defendeu.
Transição
A Bancada do PT também defendeu um período de transição para a mudança na legislação. Enio Verri explicou que, do jeito como está proposto, o novo cálculo passa a valer assim que for aprovado no Senado e publicado. “A nossa proposta é que a alteração passe a valer a partir de 2022, com as alíquotas calculadas com base na média de preços dos dois últimos exercícios e com vigência de doze meses. Assim, não atingiremos tão diretamente os estados”, argumentou. O destaque, no entanto, foi rejeitado.
Também não foi aprovada a emenda do PT que proibiria o início ou prosseguimento de processos de desestatização, desinvestimentos ou a conclusão da venda de qualquer unidade de produção de combustíveis da Petrobras.
Fraude
Durante os discursos parlamentares contra e a favor do projeto, o deputado Enio Verri afirmou que esse PL “é uma fraude”, uma proposta para desviar a atenção daquilo que é mais importante, a política de preços da Petrobras, atrelada ao dólar. “É um projeto que transfere para os estados uma culpa que não é deles. Só que isso não resolve nada, porque a proposta que está sendo apresentada reduziu em torno de 8% o preço do combustível, e só neste fim de semana o combustível já subiu 7%! Não vale nada mudar o preço em uma semana, se na outra semana o dólar sobe, e com isso, volta o preço anterior. Quem ganha são só os investidores capitalistas”, denunciou.
Enio Verri relembrou que faz no mínimo 12 meses que o percentual do ICMS não sobe. “A verdade é que não é o ICMS que faz com que o preço do combustível fique mais caro, e, sim, a política de preço de paridade internacional. Na atual gestão — de Bolsonaro e Paulo Guedes (ministro da Economia) —, o preço do petróleo aqui no Brasil sobe de acordo com a variação do dólar e com a variação do preço do combustível no resto do mundo. Consequentemente, o que nós temos é uma Petrobras dando lucro e mais lucro para os seus acionistas, grandes capitalistas, Com isso, a companhia ganha muito, seus acionistas privados ganham muito, e a população não consegue, devido ao desemprego e seus parcos salários, pagar um botijão de gás, que passa de R$ 100, ou abastecer o seu carro, cujo combustível está além de R$ 6”, criticou.
Na verdade, segundo Enio Verri, o governo Bolsonaro apresenta aqui na Câmara um projeto que tenta disfarçar “a sua mais completa responsabilidade”. O aumento do combustível não é responsabilidade do estado, e, sim, da política adotada pela Petrobras”, reforçou.
Ilusão e mentira
O deputado Henrique Fontana (PT-RS) afirmou que era preciso garantir combustíveis, gás de cozinha, diesel e gasolina mais baratos para o povo brasileiro. “Mas não podemos vender a ele ilusões e mentiras. E Bolsonaro é especialista em venda de ilusões e mentiras. O jogo dele não é governar. O jogo dele é vender narrativas ilusórias para a população. E as narrativas ilusórias não funcionam! Ele dizia que não precisava vacinar, dizia que tinha que abrir o comércio direto e que não tinha que se usar máscara. Nada disso funcionou, nós chegamos a 600 mil mortos e a economia está um desastre! Isso aqui também não vai funcionar, porque não mexe na causa do aumento dos preços dos combustíveis”, denunciou.
Para resolver o problema, Fontana disse que é preciso mudar a política de preços da Petrobras, é preciso mudar o presidente da República. “Enquanto tivermos um governo entreguista, os preços vão seguir subindo, e não é só da gasolina, mas também do arroz, do feijão, da carne”, afirmou, acrescentando que é preciso parar de vender ilusões para a sociedade brasileira.
Remendo novo em roupa velha
O deputado Odair Cunha (PT-MG) enfatizou era a favor da redução de impostos sobre o consumo. “Toda medida que vier no sentido de diminuir imposto sobre consumo, nós seremos favoráveis a ela, pois entendemos que o imposto sobre o consumo é um imposto injusto, que causa desigualdade social, mas é preciso dizer que esta proposta é ineficaz para a solução da variação de preços de combustíveis. Nós precisamos ter clareza disso. Ela vai diminuir, sim, momentaneamente, o preço do combustível se os donos de postos de gasolina não se apropriarem deste valor”, alertou.
O deputado disse ainda que era preciso ter clareza de que o problema da variação de preço, do aumento substantivo do preço do combustível, do diesel, da gasolina, do etanol tem a ver com a política de paridade internacional praticada pela Petrobras. “Este é o problema. Nós estamos aqui tangenciando o problema. Estamos aqui colocando remendo novo em roupa velha. Este projeto, momentaneamente, reduz, sim, o imposto sobre o consumo. Por isso, nós somos favoráveis. Mas esta é uma solução ineficaz para resolver definitivamente o problema de preço. Para resolver a solução é fora, Bolsonaro! Ele é incompetente, não tem condições de governar o Brasil”.
Projeto Cloroquina
A proposta também foi criticada pelo deputado Merlong Solano (PT-PI). “Este é o projeto cloroquina: não ataca a raiz dos problemas e ainda pode trazer efeitos colaterais. Ele reforça uma mentira que vem sendo contada pelo presidente da República diariamente, há muitos meses, segundo a qual o ICMS estadual sobre os combustíveis é o grande responsável pelo aumento do preço da gasolina, do diesel e do botijão de gás no nosso País. Essa é uma mentira que podemos comprovar muito facilmente”, afirmou, relembrando que em 2014, a média nacional do ICMS sobre a gasolina era de 27% e, em 2021, ela continua 27%.
Melong observou ainda que essa proposta impacta o nosso pacto federativo negativamente. Ele defendeu a criação de um fundo de estabilização dos preços para mitigar os reajustes em função da desvalorização da moeda.
Novo cálculo
Atualmente, o ICMS incidente sobre os combustíveis é devido por substituição tributária para frente, sendo a sua base de cálculo estimada a partir dos preços médios ponderados ao consumidor final, apurados quinzenalmente pelos governos estaduais.
No substitutivo aprovado, que ainda precisa ser apreciado pelo Senado, as operações com combustíveis sujeitas ao regime de substituição tributária terão as alíquotas do imposto específicas por unidade de medida adotada, definidas pelos estados e pelo Distrito Federal para cada produto.
As alíquotas específicas serão fixadas anualmente e vigorarão por 12 meses a partir da data de sua publicação. A arrecadação não poderá exceder, em reais por litro, o valor da média dos preços a consumidor final usualmente praticados no mercado considerado ao longo dos dois exercícios imediatamente anteriores.
Como exemplo, os preços médios de setembro da gasolina comum, do etanol hidratado e do óleo diesel corresponderam, respectivamente, a R$ 6,078, R$ 4,698 e R$ 4,728, segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP). Na forma do substitutivo, a alíquota seria calculada com base na média dos preços praticados de janeiro de 2019 a dezembro de 2020. Nesse período, os preços de revenda variaram de R$ 4,268 a R$ 4,483, no caso da gasolina comum; de R$ 2,812 a R$ 3,179, no caso do etanol hidratado; e de R$ 3,437 a R$ 3,606, no caso do óleo diesel.
Vânia Rodrigues