A Câmara dos Deputados aprovou na noite desta quarta-feira (25) o projeto de lei complementar (PLP 211/21), que limita a alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS – um tributo estadual) sobre combustíveis, energia, gás natural, comunicações e transportes coletivos. Pelo texto aprovado, que tem apensado o PLP 18/22, esses itens passam a ser classificados como essenciais e indispensáveis, o que proíbe os estados de cobrarem taxa superior à alíquota geral de ICMS, que varia entre 17% e 18%. Atualmente, esses bens e serviços são classificados como supérfluos – e o ICMS incidente em alguns estados supera os 30%.
O líder do PT, deputado Reginaldo Lopes (MG), informou que a Bancada do Partido dos Trabalhadores votava sim ao projeto porque era importante considerar que esses bens são essenciais. “É evidente que devemos considerar os bens essenciais, como o transporte público, pois 70 milhões de brasileiros ganham um salário mínimo e, às vezes, pegam dois a três transportes, deve considerar a energia acertada, deve considerar as telecomunicações num país digital do século XXI, o que também é correto, e deve considerar ainda os derivados de combustíveis, pois é uma cadeia longa. Pode-se dizer que 85% de tudo o que chega à mesa do povo brasileiro é transportado pelas rodovias e utiliza os derivados de combustíveis”, argumentou.
Na avaliação do líder, o que o PT não consegue compreender até agora é a “demagogia, a covardia, a mentira e a hipocrisia”. Ele enfatizou que 3 anos e 5 meses depois, o governo quer tentar dar uma resposta improvisada, uma resposta que não tem compromisso nenhum com o País. “Era mais Brasil e menos Brasília. Agora, tudo é Brasília. O Orçamento está concentrado em Brasília. Agora, a destruição dos entes federados por Brasília. Então, é o governo da mentira, é um governo que não tem planejamento, que não vai resolver a situação. Mas o nosso partido, mais uma vez, não vai faltar ao povo brasileiro. Nós vamos reconhecer essas atividades como serviços essenciais”, afirmou.
O que está errado, segundo Reginaldo Lopes, é a Câmara não ter coragem de enfrentar o real problema: a dolarização dos preços. “Esta Casa não quer mudar a política de preços da Petrobras, que o governo Bolsonaro é o controlador majoritário. Mas o governo terceiriza, Bolsonaro mente, virou refém das próprias mentiras e quer, através deste projeto, tirar a responsabilidade do seu governo sobre o descontrole da política macroeconômica. A inflação está corroendo os salários dos trabalhadores. Este é o primeiro presidente que vai entregar um salário mínimo menor que o de quando ele entrou. O povo não tem comida na geladeira, não compra botijão de gás”, denunciou.
Compromisso com os brasileiros
O líder da Oposição no Congresso, deputado Afonso Florence (PT-BA), também encaminhou o voto favorável, mas com críticas à proposta. “Vamos votar a favor pelo compromisso que o Partido dos Trabalhadores tem como o povo brasileiro. “Por isso, apesar dos erros fundamentais, é um avanço o esforço de reduzir o preço dos combustíveis, mas é preciso deixar bem claro que a responsabilidade pelo preço alto de combustíveis é de Bolsonaro, não do ICMS”, afirmou.
“Inserir energia, telecomunicações e combustíveis como políticas prioritárias é fundamental. Entretanto, na modelagem deste projeto, se houver redução na bomba, quem vai pagar é a dona de casa, o trabalhador, a pessoa que precisa de segurança pública, a professora, o policial militar, o policial civil, porque os estados terão menos recursos, não poderão fazer a política pública e não poderão sequer dar aumento salarial linear, mesmo que pequeno”, alertou Florence. Ele ainda defendeu o fim da política de Paridade de Preços Internacionais (PPI), de dolarizar a economia.
Benesses com o dinheiro alheio
O líder da Minoria, deputado Alencar Santana Braga (PT-SP) destacou que o preço da gasolina, no governo Bolsonaro, de janeiro de 2019 a abril de 2022, subiu 69,8%. “Aliás, não só o preço dos combustíveis, mas também o preço da energia e dos alimentos aumentou: do arroz, do feijão, do tomate. Até se quiser fazer churrasco de alface, não vai dar, porque pé de alface está custando R$ 5. Esse é o resultado do governo Bolsonaro. E a Oposição denunciou”, afirmou.
Alencar Santana enfatizou que a Minoria votaria a favor, fazendo as críticas necessárias. “Afirmamos claramente o que está errado, e que há uma agressão aos governos estaduais, aos municípios que simplesmente vão ter uma receita cortada de imediato. O governo Bolsonaro vai fazer benesses com o dinheiro alheio, tirando dos estados e dos municípios, comprometendo a prestação dos serviços. Quem vai sofrer é o povo”, protestou.
Tributação de lucros e dividendos
Afonso Florence defendeu emenda do PT para imputar a responsabilidade de cobrir essa redução de arrecadação com a tributação de lucros e dividendos da pessoa física, dos acionistas majoritários. “A compensação da queda de arrecadação tem que ser feita com a tributação de lucros e dividendos do setor, da Petrobras, do tubarão, do capitalista, do acionista lá na bolsa de Nova York. Essa é a diferença do projeto democrático popular para o projeto de Bolsonaro”, argumentou. A emenda, no entanto, foi rejeitada.
E os líderes do PT e da Minoria também defenderam emenda do PT que propunha que na bomba de combustível o desconto seja efetivo, do tamanho do desconto tributário do ICMS. “Se o ICMS de determinado estado reduziu 10%, é 10% que o valor da gasolina tem que reduzir na bomba; se reduziu 13%, como em alguns estados — de 30% para 17% —, que reduza 13% o preço na bomba. “Essa é a prova dos nove para a redução do preço dos combustíveis. Quem votar contra é porque quer apenas enganar o povo, não quer reduzir o preço dos combustíveis”, argumentou Reginaldo Lopes. A emenda, entretanto, foi rejeitada.
E os deputados Florence e Alencar Santana defenderam emenda do PT que tinha como objetivo aumentar o imposto de exportação dos subprodutos do petróleo e do próprio petróleo brasileiro. “A estimativa, segundo os números disponibilizados, é de que 75% da produção e do consumo nacional é de petróleo e refino nacional, e uma parte expressiva é de exportação. Se nós tributarmos a exportação, poderemos compensar as perdas federativas, poderemos compensar as perdas estaduais e municipais”, afirmou Florence. “Nós estamos aqui denunciando a política de preços e apresentando alternativa. Se querem justiça social aprovem essa emenda, aprovem a tributação sobre a exportação de petróleo bruto”, pediu Alencar. Entretando, plenário rejeitou a emenda.
Redução da arrecadação dos estados
O deputado Enio Verri (PT-PR) reforçou que o projeto não atende à essência do problema. “O problema do preço do combustível está na política de paridade internacional, numa opção de política de preços do combustível adotada por Bolsonaro e por Paulo Guedes (ministro de Economia)”, acusou. Ele afirmou ainda que não é reduzindo a arrecadação dos estados, consequentemente reduzindo a transferência para a saúde e para a educação, que advém do ICMS, e não é mantendo o lucro dos acionistas privados da Petrobras que vai-se garantir uma redução do preço do combustível a médio e longo prazo e muito menos ajudar a melhorar a vida do povo.
“Pode até reduzir o preço por alguns dias, quem sabe até por uma ou duas semanas, mas o PPI, a paridade, vai fazer com que esta redução seja consumida pela alteração de preço. E todos perderão”, alertou Enio Verri. Ele acrescentou que nessa proposta não está se discutindo a reforma tributária “que sonhávamos discutir. Nós estamos discutindo aqui, de fato — e é importante ficar explícito —, uma transferência de responsabilidade para os estados, Bolsonaro terceiriza uma responsabilidade que é dele. Ele tem que resolver. Ele que mude a política de preços e não jogue para o Estado”, afirmou.
Invasão de competência
O deputado Merlong Solano (PT-PI) manifestou preocupação com a votação do PLP 211 que, na sua avaliação invade a competência dos estados em matéria de legislação sobre o ICMS “e provoca um prejuízo da ordem de R$ 70 bilhões para estados e municípios do Brasil”. Ele explicou que são cerca de R$ 53 bilhões para os estados e R$ 17 bilhões para os municípios. “No caso do estado do Piauí, o prejuízo estimado é de R$1,3 bilhão, sendo R$ 975 milhões do estado e R$ 325 milhões dos municípios. A nossa capital, em particular, tem um prejuízo de R$ 145 milhões. Tudo isso é feito em nome de uma queda de cerca de R$ 0,60 centavos por litro de gasolina, que só se manterá até novembro deste ano”, protestou.
Merlong enfatizou ainda que o preço da energia também não vai baixar, porque não há mais investimento no setor. “Os leilões de energia eólica e de energia solar estão parados. A privatização da Eletrobras inclui o fim da política de cotas, pelo qual a estatal vende uma certa quantidade de energia por um preço mais baixo e ajuda a segurar o preço das produtoras e distribuidoras privadas de energia elétrica no Brasil”, argumentou.
Também se manifestaram contra a política de dolarização dos preços dos combustíveis as deputadas Erika Kokay (PT-DF), Maria do Rosário (PT-RS) e os deputados Arlindo Chinaglia (PT-SP), Airton Faleiro (PT-PA), Bohn Gass (PT-RS), Carlos Zarattini (PT-SP), Henrique Fontana (PT-RS), Joseildo Ramos (PT-BA), Rubens Pereira Júnior (PT-MA) e Zé Neto (PT-BA).
Texto aprovado
O projeto aprovado, que ainda precisa ser apreciado pelo Senado, estabelece um regime de compensação, pela União, aos entes que precisarem refinanciar dívidas e aderir ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), em razão da perda de arrecadação por causa da redução do ICMS. Os estados nessa situação terão as perdas de arrecadação compensadas integralmente pela União por meio de dedução nas parcelas do pagamento de suas dívidas refinanciadas.
O texto também autoriza a União a compensar estados que tiverem perda de arrecadação, mas não aderiram ao RRF, por meio de dedução do valor das parcelas dos contratos de dívida dos entes. Neste caso, a perda com a arrecadação de 2022 deve ser maior que 5% em relação ao arrecadado com este tributo em 2021.
As compensações ficarão limitadas às perdas de arrecadação com ICMS até 31 de dezembro de 2022 ou enquanto houver saldo de dívida contratual do Estado ou Distrito Federal administradas pela Secretaria do Tesouro Nacional, o que ocorrer primeiro.
As deduções visando a compensação por perdas com a arrecadação de ICMS deixarão de vigorar caso as alíquotas retornem aos patamares vigentes anteriormente à publicação da lei.
Vânia Rodrigues