O líder do PT na Câmara, deputado Enio Verri (PR), criticou duramente nesta segunda-feira (20) a medida provisória (MP 954/20), assinada pelo presidente Bolsonaro, que libera o compartilhamento de dados de clientes por empresas de telecomunicações ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “A MP 954 tem a cara do governo Bolsonaro, um governo antidemocrático, que não respeita os direitos constitucionais, não respeita a democracia e muito menos os direitos individuais”, protestou.
A MP foi publicada no Diário Oficial na noite de sexta-feira (17) e permite que o IBGE tenha acesso à relação de nomes, números de telefones e dos endereços, sejam de pessoas físicas ou jurídicas. A medida provisória levanta a discussão sobre a quebra de privacidade dos dados pessoais dos brasileiros. “Somos contra essa medida e não acredito que a Câmara vote um absurdo como esse”, afirmou Enio Verri.
Na avaliação do líder do PT, com essa proposta, o cidadão e a cidadã perdem todas as suas informações pessoais. “Perde o direito sobre o sigilo da sua comunicação e, principalmente, abre as portas, não só para a venda dessas informações para o mercado – o que já seria um absurdo – mas também de abrir mão das suas informações ao que se refere a sua segurança pessoal e de sua família”, denunciou.
Para a deputada Natália Bonavides (PT-RN), a medida é desproporcional e inconstitucional. “O que justifica tamanha violação da privacidade? Por que não há garantia de não identificação das pessoas?”, questionou Bonavides. Ela explica que a MP foi editada dias depois de Bolsonaro ter vetado acordo para utilização de meta dos dados anônimos de geolocalização para monitorar o isolamento, pois arriscaria a privacidade.
MP do “gabinete do ódio”
A deputada Natália, que participa da CPMI das Fake News, indagou também qual seria o real interesse por esses dados não-anônimos. “Justamente no momento em que o ‘gabinete do ódio’ – que funciona na Presidência da República – continua espalhando todo tipo de mentira sobre o coronavírus e sobre autoridades públicas, não temos como não desconfiar de que essa é a MP do ‘gabinete do ódio’, do ‘Carluxo’ [Carlos Bolsonaro, filho do presidente]”, observou. “É uma medida provisória que pretende garantir que a organização criminosa comandada pelo ‘gabinete do ódio’ tenha acesso aos contatos de todos os brasileiros”, completou.
Na MP 954/20 não fica claro para qual pesquisa serão utilizados os dados, pois apenas informa que é “para fins de suporte à produção estatística oficial durante a situação de emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (Covid-19), de que trata a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020”, a lei federal com orientações gerais sobre a quarentena na pandemia.
OAB vai ao STF
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ingressou no Supremo Tribunal Federal (STF), nesta segunda-feira (20), com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 6287) e com pedido de medida liminar para suspender imediatamente a eficácia da integralidade da Medida Provisória 954/20.
A OAB alega que a medida viola os artigos 1º, inciso III e 5º, incisos X e XII da Constituição Federal, os quais asseguram, respectivamente, a dignidade da pessoa humana; a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas; o sigilo dos dados e a autodeterminação informativa.
Segundo a ação, a MP determina a violação dos dados sigilosos, inclusive o telefônico, de todos os brasileiros; não apresenta com precisão qual a finalidade de utilização dos dados, quais e que tipo de pesquisas serão realizadas, com que frequência ou para qual objetivo; não apresenta as razões de urgência e relevância da medida; não apresenta a necessidade da pesquisa e, portanto, a justificativa do compartilhamento de dados; não apresenta o mecanismo de segurança para minimizar o risco de acesso e o uso indevido dos dados; não informa porque esses dados são indispensáveis à realização da aludida pesquisa estatística.
“A Medida Provisória padece de inconstitucionalidade material, tendo em vista a violação direta aos princípios da dignidade da pessoa humana, da intimidade, da privacidade e do sigilo dos dados pessoais”, diz trecho do documento.
O documento é assinado por Felipe Santa Cruz, presidente nacional da OAB; Marcos Vinicius Furtado, presidente da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais e por Karoline Martins, da OAB/DF.
Lorena Vale