O Brasil já ultrapassou 21,7 milhões de casos e 603 mil mortes por Covid-19. Por iniciativa do deputado Pedro Uczai (PT-SC), coordenador do Conselho Estratégico Social da Associação Nacional em Apoio e Defesa dos Direitos das Vítimas da Covid-19, e por outros 15 parlamentares de diversos partidos (PT, PDT, PCdoB, PSB, Psol, PSD, Podemos, PSDB e MDB), a Câmara dos Deputados debateu em comissão geral, nesta terça-feira (19), políticas públicas em apoio e defesa dos direitos das vítimas do novo coronavírus.
A sessão contou com a participação de diversas pessoas que tiveram a vida de seus familiares tiradas por causa do vírus, por não terem tido a oportunidade de serem vacinadas a tempo e da incapacidade do governo federal em conduzir políticas para o enfrentamento da pandemia. Também participaram associações, entidades e parlamentares.
A Associação Nacional Vida e Justiça, que é uma Associação Nacional em Apoio e Defesa dos Direitos das Vítimas da covid-19, está realizando a Semana Nacional da Vacinação desde domingo (17) até o dia 23. No dia 17 de outubro é celebrado o Dia Nacional da Vacinação que tem o objetivo de anualmente mobilizar a sociedade brasileira para a conscientização da importância da imunização contra doenças. “Em nome da ciência, da vacina, que preserva e protege a vida. Trata-se do primeiro dia da denúncia de que a vacina salva e o negacionismo mata”, disse o deputado Pedro Uczai.
O parlamentar lembrou que a Comissão acompanha os movimentos da finalização da CPI da Covid no Senado Federal. “Nós tivemos ontem a escuta, o depoimento, a fala, o grito, a indignação e a revolta das vítimas da Covid. Não é discurso, não é ensaio, mas são as vítimas que perderam o pai e a mãe, que perderam o filho, que perderam irmãos, que também foram vítimas da própria Covid. É o grito, é a fala, é a escuta, é a visibilidade das vítimas. Por isso, o primeiro grande objetivo também desta comissão geral é trazer a memória, a história e a vida de seres humanos que têm nome e sobrenome, que vivenciavam cotidianamente a sua vida e foram vitimadas pela Covid. Em seguida desta tragédia humana, nós iremos dizer também que houve genocídio humano”, apontou Pedro Uczai.
Punição aos envolvidos
“Nós estamos tratando, sim, não só de números — são mais de 600 mil mortes no Brasil —, mas da vida dessas famílias. São pais e mães que não terão mais os seus filhos nos seus lares. São filhos e filhas que não mais verão o retorno dos seus pais. Esta dor, que é um luto, não pode ficar no esquecimento. O luto não é para silenciar, o luto é para levantar a voz e dizer que essas mortes poderiam ter sido evitadas, que esse vírus poderia ser combatido. Neste momento nós precisamos dizer em alto e bom som que a pandemia mostrou a face cruel do governo Bolsonaro, porque ele negou a ciência, ele ironizou situações de calamidade e de dor de famílias”, afirmou o líder da Bancada do PT na Câmara, deputado Bohn Gass (RS).
Para o parlamentar foi possível perceber que entorno da pandemia havia, no Ministério da Saúde, “uma quadrilha se montando para ganhar dinheiro em cima da dor e do sofrimento das pessoas” e que, portanto, é preciso que haja punição dessas pessoas e principalmente da “autoridade máxima do País, que também precisa ser punido”, disse Bohn Gass.
“Como em outros genocídios no mundo, como na ditadura militar no Brasil, é preciso construir um amplo movimento de memória que comece do exercício do direito ao luto das pessoas que tiveram essa condição negada pelas regras importantes de prevenção de expansão da pandemia no Brasil, mas que trabalhe a memória familiar, comunitária, municipal, até nacional, para que a verdade histórica seja construída e para que as demandas de reparação e justiça sejam asseguradas”, afirmou Renato Simões, ex-deputado federal, representante da Associação Nacional em Apoio e Defesa dos Direitos das Vítimas da Covid-19 — Vida e Justiça.
Renato Simões destacou que é preciso responsabilizar todos aqueles que replicaram a política de morte, que não levaram a sério a pandemia que assolou e assola o mundo, as fake news e os remédios sem eficácia. “Há a responsabilização não só do presidente da República, mas de toda uma cadeia de responsáveis que passa por ministérios, secretarias, governos estaduais e municipais que replicaram essa mesma política”, defendeu.
Simões cita ainda os meios de comunicação de massa que veicularam fake news que levaram milhares de pessoas a óbito pelo uso de remédios não recomendados e por empresas que lucraram fortemente com a venda desses medicamentos e de outros insumos desnecessários para o enfrentamento da pandemia, “enquanto faltava aquilo que, de fato, era o mais importante: vacina e prevenção de acordo com as orientações da Organização Mundial da Saúde e de outras instituições científicas nacionais”.
Propostas
A comissão geral também discutiu políticas públicas para fortalecer o Sistema Único de Saúde (SUS), o Estado Brasileiro para atender os milhões de brasileiros que ficaram com sequelas, além das famílias vítimas da Covid-19. Pedro Uczai destacou que já foram apresentados 10 projetos de lei, além de propostas de emendas à Constituição, articulados com o Instituto da Justiça Fiscal e a Associação Nacional em Apoio e Defesa dos Direitos das Vítimas da Covid-19 — Vida e Justiça. Foi proposto ainda homenagem a primeira brasileira que perdeu a vida para o vírus, no dia 12 de março, tornando essa data o Dia Nacional em Memória às Vítimas da Covid.
Um dos projetos de lei trata do financiamento para o enfrentamento às sequelas da Covid. Esse projeto propõe que os super-ricos do Brasil paguem a conta. “Os bilionários estão ficando mais ricos em plena pandemia, no mundo e aqui no Brasil. Por isso, estamos propondo que, em cima das altas rendas dos que ganham acima de R$ 60 mil por mês, sejam cobrados 10% do que exceder esse valor. Isso dá 208 mil brasileiros somente, mas possibilitará arrecadar R$ 28 bilhões para atender as vítimas da Covid-19”, explicou Pedro Uczai.
O deputado do PT catarinense destacou que as grandes fortunas, o setor financeiro e o setor mineral, que não pagam impostos, com uma pequena cobrança a mais dos impostos, poderão colocar mais R$ 35 bilhões nos cofres públicos para enfrentar a pandemia. “Taxar as altas rendas, as grandes fortunas, o setor financeiro, os que tem acima de R$ 10 milhões de bens e direitos, cobrando 1% de até R$ 40 milhões, 2% de R$ 40 a R$ 80 milhões e 3% acima de R$ 80 milhões e, depois de 5 anos, baixar para 0,5%, 1% e 1,5%, isso dará mais R$ 40 bilhões. Nós estamos falando aqui de 60 mil brasileiros somente, que poderão financiar as vítimas da Covid. Estes são alguns dos projetos que se propôs aqui”, frisou.
Garantir direitos
Segundo Lucia Souto, coordenadora da Associação Vida e Justiça, a associação e a Justiça Fiscal apresentaram seis projetos de lei e duas propostas de emendas à Constituição para garantir os direitos das vítimas e dos afetados pela Covid-19.
“Há uma responsabilidade no tratamento da Covid por parte do Estado. Portanto, cabe ao Estado garantir o apoio digno a essas pessoas”, afirmou o deputado Alencar Santana (PT-SP), que também apresentou um PL de apoio as vítimas da Covid. “Também apresentei o PL 2.914/21, para que essas pessoas recebam um salário mínimo — o sequelado, por quanto tempo perdurar a sequela, e também os órfãos até a maioridade. É obrigação do poder público estender a mão, dar apoio e cuidar dos seus, principalmente, num momento de necessidade tão grave como este”, argumentou.
Proteção social
O deputado e ex-ministro da saúde Alexandre Padilha (PT-SP) ressaltou a importância de a Câmara dos Deputados votar o mais rápido possível os projetos que têm a ver com a temática abordada na comissão geral. “Além da memória, é importante aprovarmos projetos que são políticas públicas de reorganização do SUS, do SUAS, da proteção social no País para acolher as vítimas da Covid, os órfãos e seus familiares”.
E o deputado Zeca Dirceu (PT-PR) defendeu a criação uma política nacional que viabilize as condições para que os estados, os municípios, dentro da ação do SUS, tenham mais equipamentos, “tenham mais profissionais de saúde, tenham a contratação de um número maior de serviços para atender às pessoas que ficaram com sequelas”.
A deputada Professora Rosa Neide (PT-MT) destacou que há projetos relevantes no Congresso Nacional e que precisam avançar rápido, principalmente em relação aos órfãos e órfãs. “Quem vai cuidar de quem perdeu pai e mãe, de pessoas com deficiência que perderam o seu cuidador, o seu protetor? Portanto, o Parlamento tem que dar essa resposta para a sociedade”.
Na mesma linha, para o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), para além dos profissionais, é necessário reparar os danos às famílias e às vítimas que estão sequeladas por conta do vírus.
Saúde Mental
O deputado Vicentinho (PT-SP) pediu para que fosse incluído nos debates o PL 3139/2021, de sua autoria, que aborda a atenção especial à saúde mental das pessoas em consequência do pós-Covid. Esse projeto lida com médicos, enfermeiros, técnicos, auxiliares, agentes comunitários de saúde, aposentados, que tiveram que ficar presos com as suas consequências, crianças, que também enfrentaram uma novidade. “É um projeto que dá toda uma atenção especial, cria uma condição exclusiva para essas pessoas, com um tratamento de doenças mentais”, argumentou.
“Crime contra o povo brasileiro”
Para o deputado Henrique Fontana (PT-RS), que também é médico, a pandemia deixou no Brasil sequelas muito maiores do que deveria ter deixado. Enquanto no mundo inteiro a média de mortalidade por milhão de habitantes foi de 550 pessoas, no Brasil ela foi de 2.818 pessoas. “Foi diferente no Brasil. O descuido, o boicote à ciência, o atraso na vacinação, a postura inadequada do presidente da República e de seu governo contribuíram para que milhares de pessoas morressem pela pandemia, sem necessidade. Quando se olha a incidência e o número de casos, percebe-se que a média mundial foi em torno de 30 mil casos por milhão de habitantes. No Brasil, essa média chegou a 101 mil casos por milhão de habitantes”.
Fontana destacou que a decisão do governo Bolsonaro em adotar medidas que buscavam a chamada “imunidade de rebanho” levou o Brasil a este desastre. “Isso foi um crime contra o povo brasileiro, contra a economia brasileira e contra a ciência”.
O deputado Leo de Brito (PT-AC) disse que tudo o que está acontecendo no Brasil “é inacreditável” e que quando olhamos os anos de 2020 e 2021 é algo impensável. “Pessoas sendo utilizadas como cobaias em hospitais. Um presidente que simplesmente virou as costas para o seu povo. Hoje nós temos órfãos, filhos que perderam seus pais, pessoas que perderam amigos, histórias de vidas, pessoas que podiam estar hoje aqui conosco vacinadas, tentando levar uma vida normal, mas, infelizmente, o que nós estamos vendo são pessoas que neste momento estão com uma dor na alma, porque perderam seus entes queridos e que precisam de políticas públicas. E, mesmo aquelas que conseguiram escapar precisam de políticas públicas concretas”.
Povos indígenas
O deputado José Ricardo (PT-AM) falou sobre as mortes do povo indígena. “Quanto aos indígenas também vítimas da Covid-19, há uma denúncia da Coiab que diz que 932 indígenas faleceram e mais de 38 mil casos foram registrados. Há um descaso muito grande no atendimento à população indígena. Inclusive, está sendo denunciado na CPI um documento da Frente Amazônica de Mobilização em Defesa dos Direitos Indígenas que faz o relato de várias dessas situações de descaso do governo do estado e do governo federal em relação aos indígenas na Região Amazônica e que foram vítimas da Covid. O certo é que tem que haver um programa público de apoio às pessoas que ficaram com sequelas, que conseguiram se recuperar. É preciso dar a elas apoio físico e psicológico. Isso é papel do poder público”.
“Esta comissão geral resgata elementos que me parecem fundamentais, a memória, para que não esqueçamos, para que não naturalizemos, para que não consideremos que é normal que tenhamos tantas perdas (…) outro ponto é a reparação. A reparação significa que tenhamos uma política em que os que mais podem neste País possam arcar com um grande e amplo processo de reabilitação das pessoas que carregam as sequelas da Covid-19. Que nós possamos fazer justiça”, destacou a deputada Erika Kokay (PT-DF).
Lorena Vale