Durante audiência pública sobre o impacto das falas discriminatórias do ministro da Educação, Milton Ribeiro, realizado pela Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Câmara, presidida pela deputada Rejane Dias (PT-PI), debatedores e parlamentares foram unanimes em apontar preconceito, discriminação e segregação nas recentes declarações do ministro ao se referir às pessoas com deficiência.
“As palavras de um ministro de Estado não são meras opiniões sem efeito, sem repercussão social concreta na vida da população”, observaram as deputadas Erika Kokay (PT-DF) e Maria do Rosário (PT-RS), proponentes do debate.
No requerimento apresentado, as deputadas lembraram que, em entrevista ao programa “Sem Censura” da TV Brasil, realizada em agosto passado, o ministro Milton Ribeiro declarou que “a criança com deficiência é colocada dentro de uma sala de alunos sem deficiência. Ela não aprendia, ela ‘atrapalhava’ – entre aspas, essa palavra eu falo com muito cuidado – ela atrapalhava o aprendizado dos outros, porque a professora não tinha equipe, não tinha conhecimento para dar a ela atenção especial”. O ministro também declarou que a “universidade deveria, na verdade, ser para poucos”.
Também em entrevista ao programa Direto ao Ponto, da Rádio Jovem Pan, Ribeiro afirmou: “O que nós queremos? Nós não queremos o inclusivismo. Criticam essa minha terminologia, mas é essa mesmo que eu continuo a usar. É claro que existe uma deficiência como a síndrome de Down, que existem alguns graus, que a criança colocada ali no meio, socializa. Mas 12% não têm condições de conviver ali [na sala de aula].”
Segundo as propositoras, as falas proferidas por um ministro de Estado “ganham o peso e relevância de sua autoridade”. Para elas, quando isso se dá publicamente em veículo de imprensa, em emissora pública, para toda a população brasileira ouvir, “têm projeção nacional”. A audiência pública foi coordenada pela deputada Erika Kokay.
Protesto
Durante o debate, a deputada Maria do Rosário afirmou que a audiência foi uma forma de protesto por parte dos deputados contra a fala do ministro que, segundo ela, faz parte de um conjunto de ações de desmonte da educação de pessoas com deficiência.
“Não está escrito na Constituição que a educação é para alguns, está escrito que todas as pessoas, todos os brasileiros e brasileiras têm direito à educação e é um dever do Estado. E caberia exclusivamente ao ministro, independentemente das suas posições e convicções pessoais, cumprir a Constituição, ou sair do cargo que ocupa admitindo a impossibilidade de cumpri-la”, disse a deputada.
Intolerância e ignorância técnica
Ao analisar os pronunciamentos do ministro da Educação, o idealizador do Instituto Rodrigo Mendes e representante da Rede IN – Rede Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, Rodrigo Hübner Mendes, afirmou que as declarações de Milton Ribeiro “escancara uma gigantesca intolerância que não se restringe às crianças com deficiência”. Para ele, “é uma intolerância que vai para todas as direções.
O representante da Rede IN creditou a postura do ministro à “ignorância técnica” do Ministério que, segundo ele, “tem tomado posições com base na crença de toda natureza, menos, eu diria, na ciência e evidências”. Hubner acredita que “essa sim deveria ser a base para quem toma decisões para a futuro da educação no País”.
O idealizador do Instituto Rodrigo Mendes lamenta e espera “que o MEC busque mais informações e possa cumprir com sua responsabilidade”.
Desconexão com a Constituição
Para Hugo Porto, representante da Associação Nacional do Ministério Público de Defesa dos Direitos dos Idosos e Pessoas com Deficiência (Ampid) também apontou “fragilidade técnica” da assessoria do MEC.
“A fala do ministro causa extremada preocupação porque apresenta desconexão com os ditames constitucionais – frágil assessoria técnica do ministro que não teve cuidado de aprofundar sobre o tema para poder falar à Nação”, criticou.
O representante da Ampid avaliou também que as declarações de Milton Ribeiro “não contribui, pelo contrário, deseduca a sociedade e coloca o povo brasileiro em constrangimento internacional”.
“Mais grave porque é uma fala discriminatória, que desconhece a importância da diversidade num processo de construção do ser, e que se afasta indiscutivelmente dos processos pedagógicos e isso não pode vir da Casa da Educação brasileira, pelo menos da Casa formal, nosso Ministério”, avaliou Hugo Porto. “A inclusão é dever do Estado Brasileiro”, acrescentou.
Declaração alinhada
Ao se posicionar, Andreia Colares, orientadora Educacional IFSul e Pós-doutoranda em Educação – UPF – Doutora em Educação – PUCRS, destacou o conflito com a legislação presente nos pronunciamentos do ministro da Educação.
“A fala do ministro é conflitante com a legislação, mas ela, infelizmente, é alinhada com a decisão desse governo. Qual é essa decisão? A de restringir a participação das pessoas com deficiência na sociedade”, alertou.
Benildes Rodrigues