Ministro defende mediação para conflitos indígenas e alerta para inconstitucionalidades de PECs

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O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, em audiência pública nesta quarta-feira (9) na Comissão de Agricultura da Câmara, foi enfático ao afirmar que as duas principais matérias que tramitam atualmente no Parlamento brasileiro acerca da demarcação de terras indígenas não dão conta de solucionar os conflitos entre índios e posseiros. Como solução mais rápida e eficaz para as disputas, o ministro apontou a mediação como instrumento viável.

Cardozo demostrou que padece de vício de constitucionalidade a proposta de emenda à Constituição (PEC 215/00) que transfere a demarcação de terras indígenas do Executivo para o Legislativo. Disse ainda que a PEC 71, aprovada na noite de terça-feira (8), pelo Senado, provocará uma “judicialização perversa” da questão, em vez de ensejar um desfecho pacífico e definitivo às demarcações.

Para o ministro, caso a PEC 215 seja aprovada, sua inconstitucionalidade será muito provavelmente reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Sem tocar no mérito da matéria, Cardozo explicou que a Constituição é clara ao estabelecer o princípio da separação de poderes, que é cláusula pétrea e não pode ser mudada por emenda constitucional.

“Uma das características centrais do princípio da separação de poderes é preservar as funções típicas dos poderes, salvo exceções que o próprio texto original previu”, detalhou. A PEC em questão – explicou o ministro – promove a troca de atribuições após a vigência da Constituição de 1988. “Eliminar a atribuição de um Poder e passar para outro é claramente uma ofensa explícita ao texto constitucional”, disse.

Por se tratar de um procedimento técnico, a demarcação de terras indígenas é uma função administrativa, explicou Cardozo. Sobre essa questão, mostrou que o relatório da PEC 215, ao alterar esse procedimento, transforma a demarcação em ato aprovado por lei. “O relatório passa, a meu juízo, uma função administrativa típica para ser exercida como algo que não é próprio da atividade legislativa”, ponderou. “Li o relatório e acredito que a questão da constitucionalidade não está superada”, completou.

Acerca da PEC 71, o ministro ponderou que “o espírito da proposta não é ruim”, mas “a redação e as alternativas que estão postas nela não ficaram boas”. A PEC 71 determina à União indenizar pessoas em áreas declaradas indígenas não apenas pelo valor das benfeitorias, como prevê atualmente a Constituição, mas também pelo valor da terra. A regra valeria para áreas adquiridas de boa-fé a partir de títulos expedidos pelo poder público.

Uma das ponderações feitas pelo ministro é que o texto aprovado no Senado diz que, no caso das indenizações, a União responderá nos termos da lei civil, que coloca como princípio a responsabilidade subjetiva, apenas qualificável em casos de culpa ou dolo. “Isso é diferente da responsabilidade objetiva, própria do Estado e consagrada na Constituição, que diz que o Estado responderá por dano, independentemente de culpa ou dolo (…) Isso ensejará uma discussão jurídica brutal”. A PEC será apreciada agora na Câmara.

Ao tratar das matérias em pauta, o deputado Nilto Tatto (PT-SP) criticou o foco da discussão sobre as terras indígenas no Legislativo, que sempre privilegia a ideologia da propriedade em detrimento da ideologia da vida. Ele propôs que, para que haja avanço nessa questão, a PEC 215 não seja “colocada na mesa” para debate. “Reconhecemos que o Estado errou no passado ao titular para colonos terras que tinham propriedade, que eram de indígenas. Nesses casos, a PEC 71 avança para que possamos buscar uma saída. Ao mesmo tempo, a PEC 215 é um tiro no pé, na medida em que quer trazer para o Congresso Nacional um procedimento que é do Executivo”.

O deputado João Daniel (PT-SE) disse que o “País tem uma marca de sangue” por causa da morte de indígenas e que a demarcação pelo Estado brasileiro é a única forma de solucionar a disputa por terras. “É muito importante que a presidenta Dilma Rousseff e que o ministro da Justiça deem total atenção a todos as mortes ocorridas em conflitos”.
Também participaram da audiência os deputados petistas Bohn Gass (RS), Fernando Marroni (RS), Leo de Brito (AC), Marcon (RS), Padre João (MG), Vicente Cândido (SP), Zeca do PT (MS) e Zé Carlos (MA).

PT na Câmara

Foto: Gustavo Bezerra
Mais fotos: www.flickr.com/photos/ptnacamara

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