Escola sem Partido expressa caráter autoritário na educação, critica Erika Kokay

A deputada federal Erika Lula Kokay (PT-DF), em artigo, critica com veemência a Lei da Mordaça, uma afronta à liberdade na Educação. Os fundamentalistas e retrógados querem aprovar o projeto que trata da chamada ‘Escola sem Partido’, que expressa “o caráter autoritário da direita e extrema-direita brasileira, pois propõe, no seu cerne, o controle dos processos pedagógicos e educacionais”, escreve a parlamentar do Distrito Federal.

Leia o artigo na íntegra:

 

Lei da Mordaça Não!

 

*Erika Kokay

É possível comemorar o adiamento da discussão da Lei da Mordaça para o segundo semestre deste ano, uma vitória arrancada pela ação da bancada oposicionista e especialmente com a mobilização da sociedade, por meio das representações dos professores.

Mas ninguém tome como algo consolidado.

O golpe de 2016 quer eternizar os seus terríveis efeitos. Para isso, de forma particularmente cruel, abatendo-se sobre os mais jovens. Pretende gerar uma sociedade incapaz de pensar, de refletir criticamente sobre a sua realidade e, assim, assumir as suas próprias opções de futuro.

Esse foi o sentido, recém-instalados os golpistas no governo, da reforma do ensino médio, com a definição de currículos acríticos, de mera instrumentalização da juventude. Essa intenção está presente na Emenda 95, ao impedir que, durante não menos de 20 anos, o Brasil deixe de ter investimentos públicos também em educação, o que já se reflete nos cortes absurdos sobre os orçamentos das universidades federais. A própria entrega do Pré-Sal traz em si a perda de recursos consideráveis para subsidiar o sistema educacional.

A Lei da Mordaça, apresentada à sociedade como “Escola sem Partido”, completa o leque de destruição do ainda tímido sistema educacional brasileiro.

Desnuda o caráter autoritário da direita e extrema-direita brasileira, pois propõe, no seu cerne, o controle dos processos pedagógicos e educacionais. Ao agredir a liberdade docente, chega ao cúmulo de reintroduzir a odiosa vigilância sobre os professores e as professoras que marcou o regime de exceção encerrado há mais de 30 anos. Vai além nessa violência.

Ao contrário de utilizarem a infiltração de agentes policiais em salas de aula, querem jogar os próprios estudantes contra os seus educadores, quebrando a indispensável relação de confiança e reciprocidade. Incentiva os educandos a denunciarem os seus mestres se neles identificarem “ideologias”. Vejam! Atribui-se a estudantes a tarefa de “vigiar e punir” aqueles e aquelas de quem se espera que ali estejam para estimularem a reflexão, ampliar o seu espírito crítico. A volta de uma sociedade submetida ao medo de que se exponha ideias e opiniões.

Na verdade, os defensores da Lei da Mordaça falam em proteger as escolas com relação a influências ideológicas – e, com isso, propõem uma guerra contra toda uma categoria de quem o Brasil espera a contribuição maior para a construção de seu futuro – e instauram um regime de opressão com fundamento nitidamente ideológico. Buscam erigir uma agenda de intolerâncias eivada na negação da diversidade humana e da pluralidade de ideias.

É a apologia de um sistema de mera transmissão de conteúdos, sem que a relação de sala de aula incorpore a crítica, a contextualização, a problematização. O contrário do que postula o mais simbólico educador brasileiro, Paulo Freire, que vê a educação como um processo de interação entre sujeitos, um modelo de pedagogia para a autonomia e a liberdade. Não podia ser diferente. Reverenciado em todo o mundo, Paulo Freire é demonizado pelos defensores do que chamam “Escola sem Partido”.

No fundo, querem hegemonizar a construção de concepções econômicas liberais, do individualismo, do consumismo, impondo um modelo comprometido com o fundamentalismo religioso, negando debates fundamentais de direitos humanos, de diversidade religiosa, de gênero e de diversidade sexual nas escolas.

Com isso, busca-se destruir conquistas importantes dos direitos humanos para a equidade de gênero, raça e orientação sexual, retirando-se do processo pedagógico o pensamento crítico, a problematização das desigualdades, das violências sofridas por negros, mulheres, jovens, pobres e LGBTs, e impedindo a discussão das inúmeras opressões vivenciadas na vida escolar e social.

A sociedade brasileira já se posicionou sobre o que a Lei da Mordaça pretende destruir. E essa definição evidencia o Programa como flagrantemente inconstitucional. Atenta contra o direito inalienável à liberdade, preconizado no art. 5º, inciso VI, da CF, que diz ser “inviolável a liberdade de consciência e de crença…”, além de se contrapor aos princípios do ensino, como o direito à “liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber”, conforme o art. 205, inciso II, da CF; assim como ao inciso III, que prevê “pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas…”; e ao inciso V, que propõe a “valorização dos profissionais do ensino”.

Da mesma forma, desrespeita o art. 205 da Constituição Federal, segundo o qual a educação tem como objetivo primeiro “o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania”.

Nada disso importa para os que querem impor a Lei da Mordaça. O que pretendem é aproveitar a oportunidade de terem conseguido articular um acerto entre bancadas igualmente comprometidas com o recuo da sociedade brasileira a séculos passados.

Por isso, é preciso os movimentos sociais manterem-se mobilizados para quando, no retorno do recesso parlamentar, esses segmentos reacionários tentarão aproveitar algum cochilo para fazerem prevalecer essa intenção.

 

*Deputada federal pelo Partido dos Trabalhadores do DF

 

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