CLP analisa os riscos para a população em situação de rua durante a pandemia

Foto: Jorge Araujo/Fotos Publicas

A situação da população que vive nas ruas foi tema de audiência pública virtual da Comissão de Legislação Participativa (CLP) da Câmara nesta segunda-feira (7). A iniciativa do debate foi das deputadas petista Erika Kokay (DF) e Maria do Rosário (RS) e do deputado Glauber Braga (PSOL-RJ). De acordo com levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em todo o Brasil, 222 mil pessoas vivem em situação de rua. Esse resultado aponta um aumento de 140% no número de pessoas nestas condições entre 2012 e março de 2020. Por causa da pandemia de Covid-19, os números devem crescer ainda mais.

Dep. Erika Kokay – Foto: Will Shutter/AG.Câmara

Dep. Maria do Rosário – Foto: Agência Câmara

 

 

 

 

 

 

Para sobreviver, a população em situação de rua dependente da circulação diária pela cidade. Devido às restrições provocadas pela pandemia isso ficou limitado. O acesso à alimentação, água potável, higiene e algum tipo de renda foram prejudicados. Além disso, os lugares de acolhimento para esse grupo, formam aglomeração, o que dificulta as medidas de distanciamento social e de higiene.

“É urgente atender as demandas de atenção prioritária dessa população, além da invisibilidade histórica que enfrenta. A pandemia agravou problemas anteriores e mostrou a insuficiência dos modelos de acolhimento e abrigo existentes, da falta de acesso à saúde e a um mínimo de dignidade para viver”, defendeu o presidente da CLP, deputado Waldenor Pereira (PT-BA).

Erika Kokay, que presidente da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos da População em Situação de Rua, lembra que “essas pessoas sofrem violações sistemáticas de direitos que precisam ser enfrentadas com políticas eficientes, a começar pela moradia, porque a casa constrói dignidade. Uma população que cresce todos os dias e sobre a qual temos pouquíssimas informações”.

Invisíveis

Um dos maiores problemas é a falta de dados, principalmente sobre o impacto da pandemia nessa população. A ficha epidemiológica para notificação de casos de Covid-19, por exemplo, não tem a identificação de pessoas em situação de rua.

“Não sabemos quantos foram internados ou morreram de Covid-19. Quando começaram a vacinar a população em situação de rua criticaram. o Ministério Público criticou, disse que era um privilégio! Não conseguimos acessar o auxílio emergencial porque não temos celular. Hoje, o auxílio é uma merreca. Os crimes de violência aumentaram na pandemia, colocam fogo na gente, arrastam a gente. No Brasil, não sabem quantas pessoas vivem em situação de rua, mas sabem quanto gado tem o País”, denuncia Vanilson Torres, do Movimento Nacional da População em Situação de Rua, que viveu 27 anos pelas ruas de Natal (RN).

Marcelo Pedra Machado, do grupo de pesquisa População em Situação de Rua – Políticas Públicas, Serviços e Processos de Trabalho, da Fiocruz Brasília também alerta que é necessário ter mais informações em âmbito nacional, cruzar dados e integrar o Sistema Único de Saúde para tirar da invisibilidade a população de rua. Ele destaca os Consultórios na Rua, uma iniciativa do SUS em 2012.

“Era para cuidar de pessoas historicamente excluídas dos serviços de saúde, e que volta à tona neste momento. Estamos falando de um grupo populacional que representa um isolamento que é consequência da desigualdade socioeconômica brasileira. As populações em situação de vulnerabilidade devem ser prioridade nas ações da saúde pública. O acolhimento às populações em situação de vulnerabilidade exige a articulação entre os diversos atores do Estado e de iniciativas da sociedade civil. Não podemos perder o que já temos”.

Casa para quem não tem

Veridiana Machado, do Movimento Nacional de População em Situação de Rua (RS), sugere transformar imóveis abandonados em moradia para quem não tem. “Em 2015, a capital gaúcha tinha 48 mil imóveis abandonados e 6 mil são públicos. As pessoas dormem nas calçadas e as pombas dentro do prédio. Temos ainda a remoção de famílias inteiras das áreas que elas vivem. Precisamos também melhorar, e muito, a rede de proteção social e de saúde, atenção psicossocial, como o Consultório da Rua. Além disso, temos também as especificidades como os LGBTs e mulheres negras que vivem nas ruas”.

Para Antônio Almeida, da Associação Nacional de Defensores Públicos, “a pandemia deveria ter provocado políticas habitacionais e de saúde que chegassem à população de rua. Mas nada disso aconteceu. A saúde de quem vive nas ruas já é muito frágil e nada é feito. O ideal seria um atendimento integral com a questão habitacional junto. Sugerimos a mobilização de todas as casas legislativas para a construção de políticas habitacionais consistentes com todos os setores envolvidos”.

Tatiana Dias silva, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), explica que dados do Cadastro Único (CadÚnico) de 2019 também foram usados pela pesquisa feita pelo Instituto. No total, 81,5% da população em situação de rua está em municípios com mais de 100 mil habitantes, principalmente das regiões Sudeste (56,2%), Nordeste (17,2%) e Sul (15,1%).

“Nossa pesquisa envolveu, além da população de rua, trabalhadores da saúde e serviço social em 13 capitais. Algumas ações emergenciais foram reportadas como abrigamento, acesso à higiene, distribuição e oferta de alimentação. Mesmo assim, o estudo alerta para o aumento da população em situação de rua durante a pandemia, por conta da desocupação crescente e mais intensa devido aos problemas econômicos”, explicou Tatiana.

Kellseny Pinho e Alan Pessoa, da Clínica de Direitos Humanos Luiz Gama trazem relatos coletados pela instituição em 2020. “Nos abrigos, há falta de estrutura dos prédios, as camas são próximas umas das outras, os ambientes são insalubres e sem ventilação, o que favorece a propagação de doenças. Com tantos problemas que enfrentamos nas ruas, muitas vezes, pode ser melhor ficar nas ruas do que ir para muitos serviços oferecidos pela prefeitura”, explica Kellseny.

“Entre as sugestões que apresentamos estão a contratação de quartos de hotéis como previsto na lei; organização de espaços para colocação de barracas com estrutura de banheiros, saúde e alimentação; a suspensão imediata do recolhimento de barracas, cobertores e objetos pessoais e a instalação de banheiros e chuveiros públicos permanentes na cidade”, expõe Alan.

 

Assessoria da CLP

 

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