Em artigo, o deputado Nelson Pellegrino (PT-BA) trata da crise do sistema carcerário, que acumula dezenas de mortos em chacinas ocorridas em presídios de Manaus (AM) e Boa Vista (RR). Segundo o parlamentar, “o combate às facções criminosas passa pelo equacionamento das péssimas condições de nossos presídios”.
Confira a íntegra do artigo de Pellegrino, que foi Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara e secretário de Justiça e Cidadania do governo da Bahia.
Sistema prisional favorece facções criminosas
Nelson Pellegrino*
As 401 execuções em presídios brasileiros no ano passado e as que ocorreram recentemente no Amazonas e em Roraima são fruto da omissão dos estados no combate ao crime organizado dentro dos claustros prisionais. Esta omissão começou no Rio de Janeiro com o Comando Vermelho (CV) e em São Paulo com o Primeiro Comando da Capital (PCC), alastrando-se no país. Esse quadro traduz total falta de gestão e de uma hígida política de administração prisional. É clara a ausência de critérios para avaliar a situação de cada interno e uma correspectiva política individual de administração da pena, conforme preconizado na Lei de Execuções Penais: progressão, trabalho e estudo.
A legislação estabelece que os internos sejam tratados e separados segundo o grau de periculosidade, ofertando efetivamente uma nova chance aos que querem se recuperar e serem reinseridos na sociedade. Hoje, para estes, muitas vezes, a única opção para sobreviver no presídio é se filiar a uma facção criminosa.
O quadro de opressão, desassistência e violência dentro dos presídios brasileiros constitui ambiente fértil para implantação e proliferação destas organizações criminosas, sob o discurso da “irmandade” e da autoproteção. A massa carcerária vira objeto de manipulação dos líderes destas facções, que comandam o crime dentro e fora dos presídios, estabelecendo um círculo vicioso a partir do recrutamento dos ingressos, inserindo-os ou aprofundando-os no mundo do crime. Desta forma, ao invés de coibir, as penitenciárias acabam por fortalecer as organizações e funcionam como “escolas da criminalidade”.
O combate às facções criminosas passa pelo equacionamento das péssimas condições de nossos presídios, eliminando o terreno favorável que estas organizações encontram, bem como por ações firmes dentro e fora das unidades prisionais com inteligência policial e prisional, ações coordenadas entre as diversas esferas de polícia, órgãos, instituições e do poder público.
Quando estive à frente da Secretaria de Justiça da Bahia por 11 meses, conseguimos implantar algumas destas medidas e demos início a outras. Destaco a Central de Recebimento de Presos, para já na chegada identificar a situação separando os detentos pelo grau de periculosidade, ou dando uma segunda chance com a Central de Penas Alternativas. Criamos oportunidades de trabalho e estudo. Combatemos o crime organizado implantando a Inteligência Prisional, estabelecendo revistas periódicas nas celas com apreensão de armas, drogas e celulares. Chegamos a encaminhar para presídios federais 14 chefes de facções. Construímos novas unidades para combater o excesso de lotação e permitir condições de administrar a população carcerária. Criamos uma unidade especializada de agentes para combater rebeliões e apoiar as revistas nas celas e pátios. Iniciamos estudos para implantação de bloqueadores de celular e escâneres individuais.
Trabalhamos em estreita cooperação com a Secretaria de Segurança Pública; Ministério Público; Judiciário; instituições de defesa dos direitos sociais e humanos; organizações da sociedade civil; e com representantes das religiões Católica, Evangélica e de matriz Africana.
Estas são algumas políticas e medidas que podem e devem ser adotadas para o combate às facções criminosas dentro e fora dos sistemas prisionais do país. É questão de segurança para todos os brasileiros.
*Nelson Pellegrino é deputado federal (PT-BA). Tem um longo histórico de luta pelos direitos humanos. Foi secretário de Justiça, Cidadania e Direitos do Estado da Bahia e Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados.