Petistas criticam general Braga Netto, em audiência na Câmara, por ameaças ao Estado Democrático de Direito

Deputados questionaram o ministro Braga Netto sobre as constantes ameaças à democracia brasileira. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados

O ministro da Defesa, general Braga Netto, adotou um tom moderado para responder os questionamentos dos parlamentares da Bancada do PT na Câmara, e da Oposição, sobre as intimidações feitas à CPI da Covid, e as ameaças de não ter eleição em 2022, caso o voto impresso e auditável não fosse aprovado na Câmara. O ministro negou que tenha ameaçado a Câmara dos Deputados, conforme noticiou o jornal O Estado de S. Paulo, no dia 8 de agosto. O general foi criticado por parlamentares petistas, durante audiência, pelas ameaças à democracia e às eleições de 2022.

“Reitero que eu não enviei ameaça alguma, não me comunico com os presidentes dos Poderes por intermédio de interlocutores”, respondeu o general, às indagações dos deputados Rogério Correia (PT-MG), Paulão (PT-AL), Arlindo Chinaglia (PT-SP), Henrique Fontana (PT-RS) e Odair Cunha (PT-MG), autores dos requerimentos nas comissões de Fiscalização Financeira e Controle; Relações Exteriores e Defesa Nacional; Trabalho, Administração e Serviço Público. O ministro foi convidado a esclarecer as declarações e notas emitidas pelo Ministério da Defesa durante a audiência conjunta nessas comissões, nesta terça-feira (17).

O deputado Paulão quis saber o motivo que levou o ministro não ter processado as jornalistas que escreveram a matéria. “O senhor entrou com alguma ação judicial questionando as duas jornalistas? Até porque, no conteúdo dessa matéria, estamos discutindo o Estado Democrático de Direito, que é fundamental”, argumentou o deputado.

Como resposta, o general Braga Netto disse: “Para calúnia não tem prazo, se não me falha a memória, certo? Tem algum jurista aí? Pra calúnia não tem prazo. Tem? Quando é cinco anos? Seis anos. Seis meses. Tá. Mas de qualquer maneira está sendo estudado ainda, não sei se compensa esse debate, mas foi desmentido não por mim, e pelo presidente da Câmara dos Deputados”, afirmou o general ao deixar dúvida sobre processar ou não os autores da matéria.

“Parece que o senhor não questionou. Então, fica a sua palavra contra a dos jornalistas, que mantiveram a posição da declaração conforme fontes fidedignas, que definem a liberdade de expressão do bom jornalismo. Fica essa questão para refletir”, rebateu Paulão.

Independência entre os Poderes

O deputado alagoano chamou a atenção do general para aquilo que ele classifica como fundamental: O Estado Democrático Direito. “O art. 2º da Constituição diz que os Poderes são harmônicos e independentes entre si. Quais são esses Poderes? O Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Com todo respeito às Forças Armadas, elas não são um Poder. Os Poderes são esses que acabei de dizer, e as Forças Armadas não têm o papel moderador, como fica dizendo o presidente Jair Messias Bolsonaro”, criticou Paulão.

Nessa mesma linha, o deputado Arlindo Chinaglia questionou: “As Forças Armadas, na sua opinião, têm poder moderador? Se, porventura, a resposta for positiva, V.Exa. se apoia em qual artigo da Constituição, porque o art. 142 não dá esse poder às Forças Armadas?”, inqueriu Chinaglia.

“Veja, quanto à questão do poder moderador, o ministro Fux, atendendo a uma ação do PDT, deixou claro que não há poder moderador por parte das Forças Armadas. Mas nos preocupa o que o presidente Bolsonaro fala e reitera, e ele é o chefe supremo das Forças Armadas”, alertou Arlindo.

Intervenção militar

Arlindo Chinaglia observou ainda sobre os arroubos verbais do general Heleno. Segundo o deputado, esse militar tem uma “trajetória pública e notória, dado que inclusive é um general, que voltou a falar em intervenção militar dizendo que ela pode acontecer”. De acordo com Chinaglia, Heleno afirmou que “há uma certa concordância sobre esse papel do Judiciário que tem colocado as coisas em uma tensão maior. A intervenção poderia acontecer em momento mais grave”.

Na argumentação, Chinaglia apontou: “As suas frases isoladamente dizem, essas outras dizem mais”. “E creio que é legítimo para qualquer um, para qualquer cidadão e, portanto, para nós também, tentar conjugar e ver até que ponto as Forças Armadas estão sendo envolvidas indevidamente ou partilham dessa opinião do Presidente da República. É óbvio que, se o Presidente é o chefe supremo, em tese ele poderia até falar em nome das Forças Armadas. Mas não creio que seja o caso quando se falam frases”, ironizou.

Em respostas às preocupações dos parlamentares, Braga Netto assegurou que “as Forças Armadas cumprem o que está previsto na Constituição. O presidente já me assegurou que será cumprida a Constituição, e várias vezes ele me disse que jogará dentro das quatro linhas do poder”.

Durante o debate houve um tensionamento que gerou um bate-boca entre os parlamentares e o convidado. Segundo o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), em dado momento, o ministro Braga Netto se mostrou dúbio ao aventar a possibilidade da presença das Forças Armadas caso haja “falha” no alinhamento entre os Três Poderes.

“Freios e contrapesos é a Constituição que resolve. Não o senhor. O senhor tem que ficar no seu quadradinho. No seu quadradinho”, disse Paulo Teixeira ao general Braga Netto. “O senhor não terá o direito de intervir. Os poderes se controlarão”.

“Ele [Braga Netto] disse na última frase que respeita a Constituição e a Constituição prevê freios e contrapesos. Freios e contrapesos na relação entre os três eles, aí ele fala, e se falhar? Aí eu respondi, se falhar a Constituição tem os seus mecanismos de freios e contrapesos e, portanto, se falhar não cabe intervenção militar. É isso que eu quis dizer a ele”, explicou Paulo Teixeira.

Contragolpe

O deputado Rogério Correia demonstrou preocupação com mensagens enviadas via WhatsApp pelo presidente da República sobre “provável e necessário contragolpe, e chama para ato”.

“Esse contragolpe está combinado com as Forças Armadas, que o presidente enviou para ministros, para generais, para as Forças Armadas, falando de contragolpe? Que contragolpe é esse a que o presidente se refere? Isso tem eco nas Forças Armadas?”, indagou Correia que ficou sem resposta concreta sobre o tema.

Intranquilidade

O parlamentar disse ainda que há um clima de intranquilidade rondando o País. Ele contou que esse clima tem sustentação, por exemplo, no líder do Governo Bolsonaro na Câmara. Segundo Correia, ao ser perguntado sobre a decisão do voto impresso e sobre os atritos com o TSE, Barros respondeu: “Vão pagar o preço”.

Indignado com a declaração, Rogério Correia afirmou que o líder do Governo se referia ao TSE. “Que preço é esse que o governo, através do seu líder, está querendo dizer ao povo brasileiro que nós teremos que pagar? E completam a pergunta os jornalistas: Existe o risco de Bolsonaro não reconhecer o resultado das eleições em 2022? E o líder do Governo responde: “Não sei. Vamos ver até o ano que vem. Tem muita coisa para acontecer até lá”. Que tranquilidade nós podemos ter, ministro, com uma resposta dessa do líder do Governo?”, preocupou-se Rogério Correia.

De acordo com Correia, a verbalização de ameaças ao regime democrático continuou com declarações do general Heleno. “Mas isso não parou agora. O general Heleno, agora, ontem, vai à Rádio Jovem Pan, e diz, em nova ameaça de golpe: “O art. 142 pode ser usado”. Diz que não é agora, mas pode ser usado a qualquer momento pelas Forças Armadas. Então, veja bem, o clima não pode ser visto como de tranquilidade. O governo não nos passa essa tranquilidade”, argumentou.

O deputado Leo de Brito disse que sobre o poder moderador, o STF já se posicionou. “Diga-se de passagem, o ministro Heleno demonstra desconhecimento, porque quem é responsável pelo controle do Poder Judiciário é o Conselho Nacional de Justiça, não os militares, e quem é responsável por pedir impeachment de ministros é o Senado Federal”, esclareceu.
“Então, isso não tem nada a ver com as Forças Armadas. É importante que V.Exa. se posicione a esse respeito”, continuou.

O deputado Henrique Fontana disse que está entre aqueles que se sentem intranquilos diante do cenário protagonizado pelo presidente e seus asseclas. O clima de incerteza, segundo Fontana, se faz presente desde que Bolsonaro assumiu a Presidência da República. “Desde que Jair Bolsonaro assumiu, vivemos um período de ataques intensos, cada vez mais frequentes, um período de ameaça às instituições e à democracia do nosso País”.

Fontana defendeu que as Forças Armadas reafirmem “falas claras, não ambíguas de que qualquer ameaça do presidente Bolsonaro – ele as faz com frequência – não encontrarão respaldo nas Forças Armadas”.

Na sua fala, o deputado Leo de Brito também cobrou firmeza de posição por parte do ministro da Defesa. “Então, ministro, nós queremos firmeza. Não dá para convocarmos mais uma vez aqui um ministro. Não dá para termos a política do ‘Ronaldinho Gaúcho’, que olha para um lado e toca a bola para o outro”, alegou.

Cizânia

Leo de Brito disse que concordava com as palavras do ministro Braga Neto que afirmou não ser ocasião para cizânias. “O problema é o paradoxo que nós estamos vivendo, porque não há quem faça mais cizânia, quem crie mais crise neste País do que o Sr. Presidente Jair Bolsonaro, tanto é que o ministro Fernando Azevedo e Silva pediu para sair, e V.Exa. assumiu”, observou.

Bravateiro

O deputado Odair Cunha informou ao ministro da Defesa que ele só se encontrava em audiência em três comissões temáticas da Câmara, porque “o senhor serve a um presidente da República bravateiro”.

“Ele produz bravata o tempo inteiro e a última, é que pediria o impeachment de dois ministros do Supremo Tribunal Federal, ignorando os mais de 120 pedidos de impeachment nesta casa legislativa”, afirmou Odair Cunha ao se referir aos pedidos de impedimento contra Jair Bolsonaro que se encontram na Mesa Diretora e aguardam despacho do presidente da Casa, deputado Arthur Lira (PP-AL).

Os deputados Padre João (PT-MG) e Jorge Solla (PT-BA) também participaram do debate.

Benildes Rodrigues

 

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