A política econômica ultraliberal do atual governo, com erros agravados pela pandemia de Covid-19, tem levado a crise aos municípios a um grau máximo de turbulência. Tem havido sucessivas quedas de receita a partir de 2020 com a redução dos repasses federais, como os do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), a principal fonte de recursos.
Em 2019, na média, 64,85% das receitas municipais vieram de fontes externas a sua arrecadação; quanto menor o município, maior é o peso das transferências nas receitas. Em cada região do País, um peso específico. No período, a média de fontes externas na receita municipal no Nordeste foi de 79,11%, de 78,93% no Norte, 69,44% no Centro Oeste, 62,41% na região Sul e 56,62% no Sudeste.
A dependência das verbas externas tem dois componentes. O primeiro, de caráter estrutural, decorre da prática dos estados e da União de transferir responsabilidades para os municípios, que tem aumento das despesas e desequilíbrio crescente nas contas. À medida que a União transfere mais responsabilidades aos municípios é necessário que aumente o valor dos repasses. O segundo componente refere-se à redução de receitas em função da prolongada crise econômica provocada pelo modelo ultraliberal do atual governo e agravada pela pandemia.
Situação dramática- Estudos de entidades municipalistas constatam a redução de 7% nos repasses do Fundo no ano passado em relação a 2019, já calculados os efeitos da inflação. Nos quatro primeiros meses do ano, em relação ao mesmo período de 2020, no acumulado, somando-se os repasses da União ao ICMS dos estados, a queda no montante das transferências foi de R$ 16,3 bilhões. Essa queda foi parcialmente recuperada com a recomposição das receitas pelo governo federal, fechando o ano com uma queda de R$ 9 bilhões em relação ao previsto na Lei Orçamentária de 2020.
Uma situação dramática, pois a pandemia demandou dos municípios aumento nas despesas na área de saúde num momento de drástica redução da receita, com a diminuição da arrecadação e do recebimento dos repasses estaduais e federais. É nesse contexto que muitos municípios estão à beira do colapso financeiro.
Há saídas, mas ocorre que a ideia dominante do atual governo é cortar gastos e pagar a dívida pública. Os ideólogos neoliberais alegam que essa fórmula levaria ao equilíbrio da dívida pública, redução do risco Brasil e maior confiança dos investidores privados. Um modelo já testado outras vezes sem nenhuma eficácia.
Proteção à vida – Essa opção significa abandonar as micro, pequenas e médias empresas, aumentar a fome, reduzir salários dos servidores públicos, arrochar o salário da classe trabalhadora, deixar sem atendimento milhões de pessoas na fila do INSS ou do SUS, abandonar a agricultura familiar e abandonar a proteção ao meio ambiente. Nos municípios, cortar é deixar as estradas rurais sem manutenção, fechar postos de saúde e escolas, comprometer a qualidade de vida de milhões de brasileiros.
Para minimizar a situação de penúria dos municípios, é urgente aprovar no Congresso a PEC 391/2017, que acrescenta, no prazo de quatro anos, 1% ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM) na distribuição de recursos da União provenientes da arrecadação dos impostos sobre a renda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados.
Mesmo com aumento a conta gotas, o governo Bolsonaro tem -se mobilizado para barrar a votação da PEC, enquanto os municípios agonizam. É uma insanidade, pois o momento demanda um plano emergencial de socorro aos municípios.
Os cortes defendidos pelo governo levam a mais incertezas, queda de atividade econômica, redução do PIB e da arrecadação. Nas nações onde surgiram, as mirabolantes ideias do neoliberalismo nunca foram implementadas na intensidade com que as propagandeavam e as impunham aos países em desenvolvimento.
Com a atual pandemia, os países centrais – como os Estados Unidos — mostram claramente que a saída passa pelo gasto público de qualidade dentro de uma estratégia econômica e social de enfrentamento à desigualdade social e à crise ambiental.
Na crise mundial de 2008, o ex-presidente Lula agiu rápido, com uma política anticíclica que transformou o tsunami financeiro em marolinha. Em 2008 o PIB havia crescido 5,1%, com a crise em 2009 teve uma queda de 0,1% e, com as medidas adotadas, em 2010 o PIB cresceu 7,5%. Lula aumentou então o repasse ao Fundo de Participação dos Municípios para recompor a perda de arrecadação ocorrida.
Em 2014 foi aprovada a emenda constitucional 84, que destinou,além dos recursos já previstos na Constituição, 1% da arrecadação do Imposto de Renda e do IPI para o FPM. Com o aprofundamento da crise com o clima pré- impeachment da presidenta Dilma Rousseff, graças à emenda constitucional foi atenuado o impacto no FPM, que agora é ameaçado de novo.
Além da mudança da atual política econômica, é preciso socorrer urgentemente os 5.570 municípios brasileiros, com a aprovação imediata da PEC 391/2017.
Artigo publicado originalmente no Brasil 247
- Elvino Bohn Gass é deputado federal (PT-RS) e líder do partido na Câmara dos Deputados