O Supremo Tribunal Federal (STF) julga nesta quarta-feira (4) um pedido de habeas corpus (HC) preventivo feito pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tem o objetivo de evitar sua prisão após a confirmação da sentença condenatória pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). A decisão será mais uma etapa da luta da defesa do ex-presidente para derrubar a condenação e manter os direitos políticos de Lula para as eleições presidenciais deste ano.
Em entrevista exclusiva ao “Brasil de Fato”, Cristiano Zanin Martins, advogado de defesa do ex-presidente, expõe os principais argumentos do pedido, rejeita a acusação de que sua atuação caracterizaria “pressão” sobre os ministros do STF e afirma que poderá haver novas ações da defesa após o julgamento do HC.
“Nós ainda estamos analisando o acórdão que foi proferido pelo TRF4 no julgamento dos embargos de declaração na semana passada. E a partir dessa análise, vamos definir se iremos apresentar um novo recurso ao próprio TRF4 ou se iremos apresentar recursos aos tribunais superiores, no caso ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e/ou ao Supremo Tribunal Federal. Evidentemente que nós identificamos diversas nulidades no processo”, disse Zanin.
Leia a íntegra da entrevista:
Brasil de Fato: Quais os argumentos apresentados pela defesa do ex-presidente Lula no pedido do habeas corpus que será julgado pelo STF?
Cristiano Zanin: O habeas corpus está baseado no artigo 5º, inciso 57 da Constituição, que estabelece de forma muito clara que a presunção de inocência somente pode ser afastada na hipótese de uma decisão condenatória transitada em julgado, ou seja, é preciso que uma pessoa tenha sido condenada e não haja mais nenhum recurso que ela possa utilizar para afastar essa condenação. Então a Constituição é muito clara nesse sentido, não permite outra interpretação. E é isso que nós pedimos ao Supremo nesse habeas corpus: que seja aplicado esse dispositivo constitucional, essa regra constitucional, de modo a assegurar ao ex-presidente Lula a presunção de inocência até que haja uma decisão final. Nós temos uma expectativa de que essa condenação imposta primeiramente pela justiça federal de Curitiba e depois reafirmada pelo TRF (Tribunal Regional Federal) da 4ª Região venha a ser reformada porque ela é incompatível com a legislação. E por isso, buscamos que o ex-presidente possa apresentar esses recursos e aguardar o julgamento dos recursos aos tribunais superiores sem que haja antecipação do cumprimento da pena. A antecipação do cumprimento da pena não é compatível com a presunção da inocência.
Embora o julgamento dessa quarta-feira seja especificamente em relação ao habeas corpus do ex-presidente Lula, isso tem uma relação direta com o entendimento do STF sobre o cumprimento da pena após condenação em segunda instância?
O Supremo, em 2016, acabou firmando um entendimento no sentido de que seria possível a antecipação do cumprimento da pena após decisão condenatória proferida em segunda instância. O que nós estamos demonstrando nesse HC é que essa posição, embora tomada pelo Supremo, ela não é compatível com o artigo 5º, inciso 57 da Constituição, e por isso, estamos pedindo que haja uma revisão desse posicionamento. É importante destacar que após aquela decisão de 2016, vários ministros do Supremo Tribunal Federal têm decidido de forma diversa, aplicando a Constituição, assegurando a presunção de inocência até a existência de decisão transitada em julgado. Então, claramente existe uma divergência entre os ministros sobre essa questão e nós estamos pedindo que, diante dessa divergência, que o Supremo fixe a tese jurídica que será aplicada ao caso do ex-presidente Lula e também a outros casos. O fato do julgamento estar sendo realizado pelo plenário do Supremo é uma indicação de que o tribunal deverá firmar uma tese jurídica a respeito do assunto, ainda que o julgamento seja do habeas corpus do ex-presidente Lula.
Alguns meios de comunicação publicaram a informação de que a defesa do ex-presidente estaria exercendo pressão sobre os ministros do Supremo. Isso procede?
Isso é absolutamente descabido. Nós, da defesa, fizemos apenas o trabalho que se espera do advogado. Nós preparamos o habeas corpus, levamos até o tribunal, despachamos memoriais com os julgadores, e apresentamos ontem um parecer de um dos maiores constitucionalistas do país, o professor José Afonso da Silva, que reforça o pedido feito ao Supremo. Então tivemos uma atuação absolutamente legítima, que observa a lei e todos os preceitos éticos.
Para além do pedido de habeas corpus, qual os procedimentos da defesa posteriores a esse julgamento?
Nós ainda estamos analisando o acórdão que foi proferido pelo TRF4 no julgamento dos embargos de declaração na semana passada. E a partir dessa análise, vamos definir se iremos apresentar um novo recurso ao próprio TRF4, o que seria cabível se identificarmos omissões na decisão; ou se iremos apresentar recursos aos tribunais superiores, no caso ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e/ou ao Supremo Tribunal Federal. Evidentemente que nós identificamos diversas nulidades no processo, diversas violações às garantias fundamentais, sobretudo uma condenação que, ao nosso ver, não tem qualquer base na legislação penal. Todos esses temas serão tratados nos recursos que serão apresentados e nós temos uma expectativa real de que a condenação seja revertida nos tribunais superiores.
O ex-presidente Lula tem afirmado que, caso seja confirmado como candidato presidencial pela convenção do Partido dos Trabalhadores, será postulado. Do ponto de vista jurídico, isso é viável? Como a defesa tem trabalhado para garantir o direito de Lula de se candidatar?
A despeito da condenação pelo TRF4, é preciso lembrar que, em primeiro lugar, não existe uma condenação definitiva nem mesmo perante o TRF4 porque, em tese, ainda é possível a interposição de recursos até mesmo perante aquela corte. Em segundo lugar, no processo penal não há qualquer definição em torno da possibilidade ou não de uma candidatura. Essa discussão, caso seja efetivamente confirmada a candidatura do ex-presidente Lula, terá que se dar perante a Justiça Eleitoral, e com observância do devido processo legal. Então é um tema que foge ao objeto ou da discussão que está sendo travada no âmbito dessa ação penal.
Por Brasil de Fato
Foto: Paulo Pinto/Agência PT