Sociedade civil e parlamentares debatem avanços nas políticas para população em situação de rua

Foto: Rovena Rosa -Agência Brasil

A Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados (CLP) promoveu, nesta sexta (20), audiência pública virtual para debater o decreto 7.053/2009, que instituiu a Política Nacional para a População em Situação de Rua. Para os autores da proposta que viabilizou o encontro – deputada Erika Kokay (PT-DF) e os deputados Glauber Braga (PSOL-RJ) e João Daniel (PT-SE) – apesar da iniciativa ser um avanço, merece sempre ser debatida por se tratar apenas de um “marco normativo formal”.

“Decretos são instrumentos frágeis e efêmeros, que podem ser alterados pelo desejo do chefe do Executivo em exercício. Precisamos de uma política que atenda os vários recortes dessa população”, afirmou Erika Kokay.

Deputada Erika Kokay foi uma das autoras do requerimento da audiência pública. Foto: Gustavo Sales/Câmara dos Deputados

De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em estudo publicado em março de 2020, o número total de pessoas em situação de rua no Brasil é de aproximadamente 221.869.

Para o deputado Glauber Braga, a Política Nacional para a População em Situação de Rua precisa sempre ser atualizada para atender as necessidades desse segmento da sociedade. “É imprescindível desenvolver um modelo atualizado, que fomente a atuação do Estado e da sociedade civil para uma política pública inovadora e eficaz, com foco em habitação, trabalho, renda e emancipação”, observou.

Já a representante da Pastoral Nacional do Povo de Rua, Cristina Bove, reconheceu que o decreto foi um avanço, mas que sozinho não tem impedido o preconceito e a violência contra este segmento da sociedade.

“O decreto foi o primeiro marco que tivemos, um avanço. Mas o ódio e violência continuam. Ontem, em Salvador, uma mulher em situação de rua foi queimada enquanto dormia e morreu. Isso acontece porque essas pessoas são criminalizadas, e elas apenas lutam pelo direito à vida. Enquanto o Estado viola direitos, aprofunda a desigualdade”, diz Cristina Bove, da Pastoral de Rua.

Invisíveis no Censo do IBGE

O defensor público federal Renan Sotto Mayor de Oliveira defendeu a inclusão dessa população no próximo Censo do IBGE, para que o Estado tenha mais informações para implementar políticas públicas. “A pandemia deixou essa população mais vulnerável. Precisamos de orçamento para políticas voltadas para ela. Não é uma questão de assistência, é uma situação complexa e o cerne é moradia. Estar em situação de rua já é uma violação de direito. As pessoas não dormem, fecham o olho. Viver na rua não é opção”, explicou.

Para pesquisadores e formuladores de políticas públicas, alguns dados brasileiros estão desatualizados em mais de uma década. O último Censo foi em 2010. A pesquisa estava prevista para 2020, mas foi cancelada pelo governo que alegou falta de recursos. Prevista para acontecer neste ano, foi novamente adiada pelo mesmo motivo.

Outro segmento da sociedade que convive com problemas semelhantes aos moradores de rua, pediu mais atenção do Estado. A representante da Central Única das Trabalhadoras e Trabalhadores Sexuais, Carmem do Rocio, pediu durante o debate que a profissão seja legalizada através de mudança na legislação brasileira.

“Gostaríamos muito de ser legíveis e não ter nossos direitos violados. Queremos direito ao nosso trabalho. Assim como a população em situação de rua, queremos o fim do estigma. Somos mães, avós, filhas. Não queremos mais ser objetos, mas sujeitos de direito. São milhares de mulheres que exercem essa profissão e são presas por “vadiagem”. O IBGE também não nos considera na pesquisa”, reclamou.

Jornada e mobilização

Defensor público em Sergipe, Sérgio Morais informou que instituições estão articuladas para propor o Estatuto da Pessoa em Situação de Rua. Segundo ele, essa seria uma lei nacional para promover esse grupo em vários aspectos.

“Promoveria um grande resgate humano, o decreto já está defasado em relação à população em situação de rua, não tratada da insegurança alimentar e comorbidades silenciosas. Também pensamos na criação de um Programa Nacional de Proteção à Pessoa em Situação de Rua, com princípios humanistas. Precisamos também definir quem é essa população, através das várias ocupações e situações de moradia. O reconhecimento se daria por uma autodeclaração. Isso diminuiria a burocracia”, afirmou.

A representante do Movimento Nacional da População em Situação de Rua, Darcy Costa, também defendeu a criação do Estatuto como instrumento para garantir direitos. “É importante que a lei esteja do nosso lado. Vários estados e municípios aprovaram leis, mas os executivos negam recursos e as leis não são regulamentadas. Uma delas é a da renda básica, a renda cidadã. Hoje temos a manutenção da miséria porque não existe uma política de Estado efetiva”, ressaltou.

O representante do Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua, Marco Antônio da Silva Souza, enumerou uma série de instituições da sociedade civil de todo país que estão unidas para defender os direitos da população de rua, através da Jornada pelos Direitos da Rua.

“Nesse grupo as prioridades são vacina no braço, comida no prato e moradia já, também para adolescentes. Lembramos a importância do Censo para que sejamos contados. O Brasil sabe quantos gatos e cachorros existem, mas não sabe quantas são as pessoas em situação de rua”, observou.

Deputado João Daniel também é autor de requerimento que garantiu o debate – Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

O deputado João Daniel ressaltou que “a saída sempre será pela mobilização da população para rompermos esse sistema de concentração de riqueza, que faz amentar a desestruturação social, com a falta de trabalho e renda”.

20 anos da CLP

A deputada Luiza Erundina (PSOL-SP) destacou que a audiência pública desta sexta foi um marco nos 20 anos da CLP, que serão celebrados na próxima semana. “Essa parceria entre a sociedade civil e poder legislativo vem num momento muito importante, quando querem destruir a democracia. As instituições que participam mostram a força do poder popular.  A CLP é o único espaço para receber as sugestões e experiências da sociedade civil. Isso é democracia direta, participativa e, dessa forma, buscar saídas e ações concretas”, contextualizou a deputada.

Também participaram do encontro representantes do Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis.

A íntegra da audiência pública, em áudio e vídeo, está disponível na página da CLP no site da Câmara dos Deputados.

 

Assessoria da CLP

 

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