Sob protesto do PT e da Oposição, Câmara aprova urgência para PL que dá autonomia ao Banco Central

Com o voto contrário da Bancada do PT, a Câmara aprovou nesta terça-feira (9) a urgência para o projeto de lei (PLP 19/2019), que trata da autonomia do Banco Central. Em questão de Ordem, o líder da Bancada do PT, deputado Enio Verri (PR) pediu a nulidade na tramitação do projeto pela existência de vício incontornável de iniciativa da proposição, tendo como consequência o reconhecimento da inconstitucionalidade da matéria e a necessidade de que ela seja devolvida ao autor, senador Plínio Valério (PSDB-AM). A prerrogativa da matéria, afirmou o líder, é de competência privativa do presidente da República por se tratar da organização administrativa do Poder Executivo.

“A autonomia pretendida no PLP retira a autoridade do governo eleito sobre o instrumento central de definição da política econômica, inclusive interferindo na coordenação dos instrumentos disponíveis para a implantação dessa política e reduzindo a sua eficácia ao diluir a responsabilidade sobre seus resultados”, afirmou Enio Verri, na sua questão de Ordem, que foi rejeitada pelo presidente da Casa, deputado Arthur Lira (PP-AL).

O projeto que define os objetivos do Banco Central foi discutido também na sessão desta terça-feira, mas a votação do mérito da matéria ficou para esta quarta-feira (10). O texto dispõe sobre sua autonomia e sobre a nomeação e a exoneração do seu presidente e de seus diretores – de vigência não coincidente com o mandato de presidente da República; define nova forma de mandato para o presidente e diretores, alterando a competência da presidência da República em relação a tal órgão, que, inclusive, tem status ministerial.

Também modifica a estrutura da administração pública federal e revoga, por decorrência, dispositivos legais, todos eles pertinentes às atribuições do Banco Central na estrutura da administração, sua pertinência tributiva às decisões presidenciais e ministeriais, às quais têm subordinação hierárquica e funcional. “E todas foram normas legais convertidas de projetos de lei de iniciativa presidencial”, destacou Enio Verri.

Erro de prioridade

O líder da Minoria, deputado José Guimarães (PT-CE), criticou a pressa para a votação do projeto. “Essa ligeireza com que o governo quer votar esse projeto deveria ser a mesma com a qual o governo deveria agir no enfrentamento à Covid-19. A prioridade deveria ser para o auxílio emergencial, deveria ser para o Orçamento da União, que nem sequer tem orçamento para 2021”, afirmou.

Sobre o mérito do projeto que dá autonomia ao BC, Guimarães destacou duas questões fundamentais. A primeira delas é que o texto retira a autonomia do atual governo e de qualquer outro que seja eleito pelo povo brasileiro, “porque retira o poder originário das urnas”. E a outra é a diretoria descasada. “Portanto, são 2 anos para um governo e 2 anos para outro. Esses diretores e esse presidente podem fazer o que bem entenderem”.

Guimarães indagou ainda como um governo eleito, que tem seu programa, que tem sua política monetária e fiscal pode ficar à mercê do mercado, do sistema financeiro. “É isso o que estão propondo nesse texto, porque essa autonomia não é boa para o atual governo nem para nenhum outro. Ela só serve para entregar a política fiscal, a política monetária brasileira à banca do mercado. Portanto essa é uma proposta descabida, desnecessária e lesiva ao interesse nacional”, criticou.

Proposta absurda

O deputado Carlos Zarattini (PT-SP) classificou como absurda a proposta que dá autonomia ao Banco Central. “O que nós estamos votando aqui é exatamente um projeto que tira o poder do presidente da República, que foi legitimamente eleito para executar a política monetária, política fiscal, política cambial, e estamos transferindo esse poder para uma pessoa geralmente vinda do tal mercado financeiro. O PT vota não a esse projeto absurdo!”, afirmou.

E o deputado Afonso Florence (PT-BA) afirmou que o PLP 19/19 é muito ruim para o Brasil, para a economia brasileira, e principalmente para os mais pobres. “Nós estamos vendo o que está acontecendo com o preço da gasolina, do botijão de gás. Agora, autonomia do Banco Central significa autonomia em relação ao governo, e o povo, que vota em presidente da República, não vai poder cobrar do presidente a política monetária. E o Banco Central vai estar rendido, de joelhos, para o chamado mercado, para os banqueiros”.

Segundo Florence, nós vamos ver uma escalada da política monetária, que vai implicar aumento de juros, da cesta básica, e a quarentena proposta, que é só de 6 meses, que vai ser do Banco Central, vai para o banco privado. “E, como diz o economista Paulo Nogueira Batista Júnior, a turma da bufunfa vai sair ganhando por isso”, criticou.

Importância do Banco Central

O deputado Merlong Solano (PT-PI), ao criticar o modelo de funcionamento do Banco Central proposto no PLP 19, afirmou que, com essa autonomia o governo está abrindo mão da sua capacidade de gerir grande parte da economia brasileira, entregando para diretores do BC, que o presidente nomeia, mas que não pode demitir. “O governo Bolsonaro está abrindo mão, não sei se por incapacidade de gerir a economia, de uma grande parte da economia brasileira, que é fundamental para a vida de todos nós”, afirmou.

Merlong explicou que é o BC que define a taxa básica de juros. “Ele é importante para regular o nível de preços, a estabilidade dos preços, mas também para elevar ou diminuir o tamanho da dívida pública. Quando o Banco Central regula a política de crédito junto com a quantidade de dinheiro em circulação, ele é fundamental para o nível de investimentos na economia, ajudando a economia a investir mais e a gerar mais empregos ou menos. Portanto, o BC tem a ver também com a questão do emprego e do desemprego”.

Ele lembrou ainda que quando o BC regula a taxa de câmbio, ele é fundamental para o desempenho do nosso comércio internacional – exportações e importações. “Também quando ele regula e fiscaliza os serviços dos bancos e do sistema financeiro, ele é fundamental para o cidadão que paga caro pelos serviços prestados pelos bancos brasileiros. São questões de extrema relevância, ao lado também da administração das reservas internacionais do Brasil”, afirmou.

Mercado Financeiro

O deputado Henrique Fontana (PT-RS) alertou que o que está em jogo nesse projeto é o interesse do mercado financeiro. “O que está em jogo é o seguinte: de um lado há o interesse do mercado financeiro, que busca taxas de juros cada vez mais altas, cobranças de taxas bancárias cada vez mais altas; e de outro lado está o interesse público do País, da economia, do crescimento econômico, do setor produtivo, que precisa, através de um Banco Central de fato independente do interesse do mercado financeiro, regular em favor das atividades produtivas”.

Fontana enfatizou ainda que, “se nós deixarmos o sistema financeiro livre para dominar as decisões de taxas de juros, etc., nós teremos uma economia cada vez mais asfixiada. O que está em jogo aqui, na verdade, é o que querem aqueles que votam ‘sim’: uma autonomia do sistema financeiro para controlar o Banco Central, que deveria, sim, defender o interesse público”.

Contra a vontade do povo

A deputada Erika Kokay (PT-DF) considerou lamentável a aprovação da urgência para o projeto da autonomia do BC. “É lamentável porque essa não é a urgência do povo brasileiro, é a urgência do mercado. O discurso de que essa ação vai elevar o nível de investimento privado é o mesmo discurso que nós tivemos na Reforma da Previdência, no teto dos gastos, na Reforma Trabalhista, e não se efetivou. Aliás, nós tivemos uma fuga de capital no Brasil recorde na nossa história”, afirmou.

Erika Kokay lembrou que quando se decide uma eleição, se decide também o projeto econômico que se quer. “O banco que representa a política creditícia fiscal, cambial vai estar apartado da vontade do povo, e nem se poderá cobrar do governante, porque ele culpabilizar o Banco Central por eventuais fracassos da sua própria política. É inadmissível que nós tenhamos a vontade popular sendo rasgada nessa sessão”, protestou.

Vânia Rodrigues

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