Os participantes que acompanharam a audiência pública realizada pela Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Câmara, nesta quarta-feira (25), para debater a portaria 1.129/17, do Ministério do Trabalho, que alterou as regras que tipificam o trabalho análogo à escravidão foram surpreendidos com o posicionamento do consultor jurídico do Ministério do Trabalho, o procurador Ricardo Leite.
“Essa conduta bárbara, criminosa, monstruosa do trabalho escravo ofende os ditames constitucionais mais fundamentais que tratam da dignidade da pessoa humana. Então, é algo que é do interesse público o enfrentamento fortíssimo dessa chaga que ainda toma o país em vários locais, urbano ou rural”, afirmou o representante do Ministério do Trabalho, cuja afirmação não corrobora as normas estabelecidas na portaria emitida pelo órgão que ele representa.
O debate na CDH foi proposto pelos deputados do PT, Patrus Ananias (MG), Luiz Couto (PB), e conduzido pelo presidente da comissão, deputado Paulão (PT-AL).
Afirmou ainda o consultor que a judicialização desse tema não é boa para as políticas públicas necessárias para se fazer o enfrentamento de tema tão sensível. Segundo ele, “a todos interessa combater essa barbárie – abominável -, e que merece toda força e peso institucional da União, e de todos que compõem a República Federativa do Brasil”. Disse ainda que essa questão provoca permanente sobressalto, insegurança e medo de que tudo venha abaixo e de que o que foi conquistado até hoje sofra retrocesso.
Ao se pronunciar, o Procurador do Trabalho e coordenador Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo do Ministério Público do Trabalho (MPT), Tiago Muniz Cavalcanti disse que sentiu falta, na fala do consultor, de explicações sobre a participação ou não da consultoria do Ministério do Trabalho na elaboração da portaria, e se houve um debate qualificado para a edição da medida por parte do governo.
“Essa portaria representa golpe fatal, a pá de cal que o governo dá no enfrentamento da escravidão contemporânea”, afirmou Tiago Muniz, que não obteve nenhuma resposta aos questionamentos feitos ao consultor do Ministério do Trabalho.
O presidente da CDH, deputado Paulão, lembrou ao representante do Ministério do Trabalho que ele não era obrigado a responder, mas que as respostas seriam bem-vindas e que contribuiriam para esclarecer as medidas tomadas.
Na sua fala, o deputado Paulão leu um documento que disse ser uma síntese do pensamento da CDH. “A portaria representa um retrocesso do atual governo em direitos humanos”, afirmou.
Para ele, a medida pretende “ao arrepio da Constituição Federal e dos tratados internacionais, reduzir o conceito de trabalho escravo já sedimentado no ordenamento jurídico”.
Para os autores do requerimento, deputados Luiz Couto e Patrus Ananias a medida adotada pelo governo ilegítimo de Michel Temer representa “um retrocesso social incompatível com os sistemas internacionais de proteção dos direitos humanos e com as políticas públicas já implementadas no Brasil de proteção dos trabalhadores”.
Participaram do debate a Procuradora da República no Distrito Federal e membro da Comissão Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo do MPF, Ana Carolina Alves Araújo Roman; a Defensora Pública da União e Vice-Presidente do Conselho Nacional de Direitos Humanos, Fabiana Severo e o presidente do Sindicato Nacional do Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), Carlos Fernando da Silva Filho.
Benildes Rodrigues
Foto: AlexFerreira/Câmara