Com o voto contrário do PT, a Câmara aprovou nesta quinta-feira (9) o acordo de cooperação em questões relacionadas à defesa assinado por Brasil e Israel, previsto no projeto de decreto legislativo (PDL 228/21). “Este projeto fere o art. 4º da Constituição Federal, que dispõe que os princípios da política externa brasileira têm que ser pautados nos direitos humanos, na igualdade entre os Estados, na defesa da paz e na solução pacífica dos conflitos, entre outros aspectos”, afirmou a deputada Erika Kokay (PT-DF), ao encaminhar o voto da bancada.
“O PT não colocará a sua digital nessa transferência de tecnologia que foi construída em grande medida para oprimir e extinguir o povo palestino. Nós não queremos incorporar e ter parceria com esta tecnologia que mata. Nós não queremos colocar a nossa digital nesta proposição. Nós não queremos este acordo, que é um acordo de morte. Nós estamos aqui para dizer que o povo palestino merece respeito pela sua luta, pela sua coragem”, afirmou.
Na avaliação da deputada, “se quer fazer um acordo de defesa com um País que desrespeita as resoluções da ONU; que invade um território que não lhe pertence; que assassina o povo palestino; que faz com que o povo palestino tenha centenas de crianças aprisionadas e que faz também com que o povo palestino seja repudiado no seu próprio chão”. Portanto, reforçou, “não há como apoiar esse acordo na área de defesa com o Estado de Israel, que descumpre resoluções da ONU”.
Erika Kokay explicou que várias vezes a Organização das Nações Unidas, nas suas resoluções, afirmou que o Direito Internacional Humanitário deve ser aplicado aos territórios ocupados. “Israel tem sido contumaz em deter armas direcionadas inclusive a crianças. O que aconteceu em Sabra e Chatila? Foi um massacre, um massacre, que se fez de forma sorrateira, de forma covarde, no silêncio e na calada da noite, para não alertar os palestinos e as palestinas, que, ainda que lhe roubem a terra, têm sentimento de nação”, lamentou.
A deputada destacou ainda que, inúmeras vezes, Israel tentou acabar com o povo palestino, calar o povo palestino. “E o povo palestino, no mundo inteiro, inclusive aqui no Brasil, tem feito o grito de protesto contra essa política da morte”. Ela ainda rebateu os argumentos de alguns parlamentares que de que isso é coisa de Deus. “É coisa de Deus tirar o direito à água de um povo?! É coisa de Deus desrespeitar os limites acordados internacionalmente que pregam a própria paz?! É coisa de Deus assassinar crianças?! É coisa de Deus prender crianças?! São centenas de crianças palestinas que estão presas”, desabafou.
“Portanto, aqui, se vai querer que o Brasil faça um acordo com o genocídio e com a morte; que o Brasil esteja, em um projeto decreto legislativo, fazendo tratados de defesa com Israel contra o povo palestino?”, indagou a deputada, pedindo que os parlamentares, que sabem o que acontece com o povo palestino, “possa se posicionar em defesa — e eu repito — da Constituição Brasileira, que fala que as relações internacionais têm que ser pautadas nos direitos humanos, na igualdade entre os Estados e na defesa da paz”.
História
A deputada Erika Kokay ainda citou a aprovação, pela ONU, do Plano de Partilha da Palestina, em 1947, que dividia as terras: 55% para os judeus e 45% para os muçulmanos. “Hoje, nós temos 92% do território ocupado por Israel, 92%, causando o confinamento de 3 milhões de palestinos e palestinas, que permanecem no local e se transformam em refugiados dentro da sua própria terra. Dentro da sua própria terra!”, lamentou.
Ela destacou ainda a Resolução nº 2.334 da ONU, de 2016, que declarou que as colônias israelenses eram uma violação flagrante do direito internacional e não tinham validade legal.
Lembrou que em 2017, a Comissão Econômica e Social da ONU para a Ásia Ocidental publicou um relatório chamado Práticas de Israel para o povo palestino e a questão do Apartheid. “O documento mostrou que todos os palestinos, independentemente de onde vivem, sofrem impactos da política de apartheid do Estado de Israel”.
A deputada frisou também que a atual anexação da Cisjordânia por Israel, que foi iniciada em 2020, reitera o desrespeito ao direito internacional. O Tribunal Penal Internacional decidiu, em março deste ano, iniciar investigação formal sobre possíveis crimes cometidos no conflito na Cisjordânia e na Faixa de Gaza.
“Estes são os dados. É a tentativa de aplacar, de oprimir, de extinguir e de exterminar um povo que está em curso em Israel, e esta Casa vai validar essa relação? Vai validar, num acordo de defesa, a posição daquele que tem as armas apontadas para o povo palestino, para as crianças, para as mulheres, daquele que desrespeita todos os tratados internacionais? Ou a Casa desconhece o sofrimento do povo palestino? Desconhece o sofrimento e a coragem também do povo palestino de resistir?”, desabafou.
O acordo
Assinado pelos dois países em 2019, em Jerusalém, o acordo prevê o intercâmbio de tecnologias, treinamento, pesquisa e desenvolvimento, apoio logístico e mobilização. Prevê ainda visitas mútuas de delegações, intercâmbios de pessoal e a facilitação do comércio bilateral de serviços e material de defesa.
O projeto segue para apreciação do Senado.
Vânia Rodrigues