Outubro Rosa: médica denuncia relação entre agrotóxicos e câncer de mama

As campanhas de prevenção ao câncer de mama, que formam o chamado “Outubro Rosa”, acontecem em todo o mundo desde a virada do mês. Para pesquisadores da área da saúde, no entanto, elas deveriam abranger mais do que o estímulo à realização da mamografia, envolvendo também a denúncia das causas de câncer de mama. Entre elas, a relação entre o consumo e exposição aos agrotóxicos.

Segundo a médica Ada Cristina Pontes Aguiar, professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Cariri (UFCA), o papel dos agrotóxicos como agentes causadores de câncer é bastante reconhecido na literatura científica.

“Existe um reconhecimento na literatura científica de que os agrotóxicos são agentes causadores de câncer, causando tanto mutações nos genes e cromossomos, quanto intensificando o processo de multiplicação das células e formação de tumores. Então, podem até não ser o agente causador inicial, porque o câncer é uma doença multifatorial, depende de alimentação genética. Mas os agrotóxicos podem atuar também como mediadores e facilitadores desse processo”, disse.

Uma série de pesquisas científicas nacionais e internacionais já relacionaram os agrotóxicos à indução ou proliferação de diferentes tipos de câncer. O estudo mais recente, que trata especificamente do câncer de mama, foi desenvolvido no Rio Grande do Sul e publicado na Revista Brasileira de Pesquisa em Saúde no primeiro semestre deste ano.

Com base em 16 dos principais estudos clínicos a respeito do tema, o artigo apresenta evidências do aumento da incidência do câncer de mama em mulheres que tiveram contato com agrotóxicos agrícolas organoclorados e organofosforados, e indica a necessidade da criação de políticas de fiscalização e cuidados para a saúde dos agricultores.

Segundo a médica, no entanto, a indústria de agrotóxicos tenta invisibilizar os agravos consequentes da exposição dos agrotóxicos, principalmente os crônicos, uma vez que é difícil comprovar a relação entre os produtos e as doenças que se manifestam depois de um período de tempo após a exposição. Além disso, ela destacou que a maior parte dos estudos são elaborados pelas próprias empresas que fabricam os agrotóxicos.

“[Os estudos] são feitos em laboratórios com ratos, avaliados em condições ideais de temperatura e pressão. Esses resultados são extrapolados para os seres humanos. Daí, decorre uma série de problemas, porque os organismos humanos são muito mais complexos do que desses animais e porque também se avalia o ingrediente ativo dos agrotóxicos de forma isolada, um por um, mas a realidade brasileira mostra que a grande maioria da população está exposta a uma calda tóxica, a uma mistura de vários ingredientes ativos. Por se tornar uma problemática muito complexa e desafiadora, a indústria diz que como não tem como se comprovar, não podemos afirmar que há relação. Mas o contrário deveria ser verdadeiro, se não podemos afirmar, deveríamos partir do pressuposto de que causa, e que deveria ser evitada a exposição a produtos extremamente tóxicos como os agrotóxicos”, afirmou.

A médica destacou ainda que considera a política de campanhas do Outubro Rosa “reducionista”, por se concentrar principalmente na divulgação da necessidade de realização do exame da mamografia, em vez de se ampliar para métodos de prevenção e denúncias de agentes causadores.

“Isso deveria ser feito de forma muito mais ampliada, e não simplesmente estimulando de forma desenfreada mulheres a realizarem mamografias, muitas vezes sem indicação adequada. Sem dúvida, é muito estratégico e importante que a gente alerte as mulheres aos riscos de exposição ambiental e ocupacional a produtos nocivos à saúde como agrotóxicos, porque eles estão relacionados a problemas diversos também”, apontou.

O Instituto Nacional do Câncer (INCA) já se posicionou inúmeras vezes por uma maior fiscalização da venda e uso de agrotóxicos. Em maio deste ano, durante o processo de discussão do Projeto de Lei 6.299/02 (PL do Veneno), que visa flexiblizar o Marco Legal dos Agrotóxicos, o Instituto se posicionou em defesa da atual legislação. O PL segue em trâmite e aguarda para ser votado na Câmara dos Deputados.

“Para o INCA, tal modificação colocará em risco trabalhadores da agricultura, residentes em áreas rurais ou consumidores de água ou alimentos contaminados, pois levará à possível liberação de agrotóxicos responsáveis por causar doenças crônicas extremamente graves e que revelam características mutagênicas e carcinogênicas”, afirmou o Instituto, em nota.

 

Brasil de Fato

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