O ‘pente-fino’ nos benefícios concedidos pelo INSS proposto pela equipe econômica de Jair Bolsonaro (PSL), que constam na Medida Provisória 871/19, publicada no dia 18, nos moldes como foi feito pelo ilegítimo Michel Temer, indica que os direitos de milhares de beneficiários podem sofrer cortes arbitrários e será um tiro no pé do governo. Isso porque, após os cortes, aumentam consideravelmente as ações na Justiça movidas pelos segurados para reaver os benefícios e pensões de direitos cortados indevidamente.
O risco agora pode ser ainda maior, pois a proposta do ministro da Economia, Paulo Guedes, prevê a revisão de todos os benefícios concedidos. No processo anterior, somete o auxílio-doença e pensão por invalidez foram os alvos do governo.
Segundo o Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), o ‘pente-fino’ de Temer, que começou a ser executado em julho de 2016, colaborou para que houvesse uma explosão de ações na Justiça Federal, a ponto de faltar recursos para a realização de perícia médica no sistema Judiciário.
O modelo desastroso adotado por Temer para fazer a revisão dos benefícios – e que deve ser repetido agora por Bolsonaro – se baseou no pagamento de bônus em dinheiro aos peritos do INSS que identificassem ‘supostas fraudes’.
“Para dizer que estão economizando e justificar essa bonificação, os peritos começaram a cancelar uma série de benefícios, de forma injusta e ilegal. Isso gerou um contingenciamento enorme de ações na Justiça, verificado até pelo Tribunal de Contas da União (TCU)”, afirmou o advogado e diretor do IBDP, Diego Cherulli, em entrevista ao jornalista Tiago Pereira, da Rede Brasil Atual.
Segundo ele, os recursos contra a suspensão ilegal das pensões por invalidez respondem hoje pelo maior número de processos, em termos percentuais, na Justiça Federal, em Brasília, sendo que aproximadamente 80% dos beneficiários que entram com as ações ganham o processo.
E enquanto o perito deve receber R$ 57,50 por perícia extra realizada, conforme consta na Medida Provisória 871/19, cada processo judicial, segundo o TCU, custa aos cofres do Estado cerca de R$ 3.900, explica o diretor do IBDP.
Trabalhador prejudicado – O deputado federal Rubens Otoni (PT-GO) avaliou que a medida assinada por Bolsonaro prejudicará novamente os trabalhadores. “A MP sobre o INSS assinada por Bolsonaro confirma o que já dizíamos: se esse governo tiver que cortar não será nunca em quem tem mais. Nenhuma linha sobre os altos salários, ou militares. Mas quer cortar o benefício da viúva, do trabalhador rural, de quem já não tem quase nada,” criticou.
O líder da Oposição, deputado José Guimarães (PT-CE), condena a perseguição aos trabalhadores rurais, uma vez que a declaração fundamentada de sindicato que represente o trabalhador rural emitida por sindicatos não será mais aceita. “Não tem prova maior que ateste se o trabalhador rural tem o direito de se aposentar: a mão calejada da roça. Estão, com essa medida provisória, na verdade prejudicando os de baixo. Por que não trata das dívidas?”, indagou o deputado, ao se referir aos grandes devedores do INSS e sonegadores de impostos.
Segundo Cherruli, até mesmo benefícios que haviam sido concedidos na Justiça, que conta com peritos especialistas – diferente do INSS – foram cassados pelo pente-fino de Temer, e depois tiveram de ser repostos, causando danos aos cofres públicos e aos beneficiários.
“É mercadismo”, diz Cherruli, “porque agrada ao mercado por supostamente diminuir as despesas da Previdência Social. Mas, na verdade, não está. Está diminuindo falsamente. O pente-fino do Temer foi um mal exemplo”.
Para o diretor do IBDP, os peritos do INSS já ganham o suficiente para fazerem a devida fiscalização dos benefícios, e o bônus distorce a função e ameaça direitos conquistados.
“É preocupante o ‘pente-fino’ porque não se vê a fraude como exceção, mas como regra. Essa visão tem de mudar. O direito é a regra. As fraudes são exceções. Que se respeite o direito adquirido e as decisões judiciais”, conclui Cherulli.
O QUE DIZ A MP (Nota do Diap)
A MP muda regras para concessão de benefícios. O programa tem previsão de duração até 31 de dezembro de 2020 e poderá ser prorrogado até 31 de dezembro de 2022.
A pensão por morte agora exige prova documental de união estável e de dependência econômica. Para o recebimento desde a data da morte do segurado, filhos menores de 16 anos precisarão requerer o benefício em até 180 dias após o falecimento.
Por meio da MP promoveu-se mudanças no auxílio-reclusão, que estabelece carência de contribuição de pelo menos 24 meses para concessão do benefício. Somente presos do regime fechado terão o direito; aqueles em regime semiaberto não terão o benefício.
A aposentadoria rural também tem regras novas. Foi criado cadastro de segurados especiais para abastecer o Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS). A partir de 2020, o CNIS será a única forma de comprovar o tempo de contribuição para o trabalhador rural. A declaração fundamentada de sindicato que represente o trabalhador rural emitida por sindicatos não será mais aceita.
Antes de 2020, o trabalhador rural comprovará período de contribuição por meio de autodeclaração. Nos próximos 60 dias, bastará entregar a autodeclaração. A partir de março, a auto declaração terá de ser homologada por entidades do Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (Pronater).
Fraudes e irregularidades
A MP trouxe como novidade a possibilidade de suspensão cautelar do pagamento de benefícios em casos de suspeita de irregularidades com provas pré-constituída, até que o beneficiário apresente defesa. Atualmente, o benefício é pago até que o trabalhador seja localizado.
O combate às fraudes será feito no âmbito dos programas especiais para análise de benefícios com indícios de irregularidade e de revisão de benefícios por Incapacidade.
Serão revisados os benefícios por incapacidade mantidos sem perícia pelo INSS, por período superior a 6 meses, e que não possuam data de cessação estipulada ou indicação de reabilitação profissional.
Portal CUT