Os parlamentares da Bancada do PT na Câmara questionaram o ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre a falta de estimativa de impacto orçamentário com as propostas de Reforma Administrativa (PEC 32/20) apresentada pelo governo federal. Eles também defenderam a estabilidade no serviço público, deixaram claro que a PEC não combate privilégios, fragiliza os serviços públicos e é inconstitucional. O debate sobre o tema aconteceu durante audiência pública, nessa quarta-feira (7), na comissão especial da Câmara dos Deputados que analisa a matéria.
O deputado Rui Falcão (PT-SP), autor do requerimento, se queixou das diferentes projeções já apresentadas pelo governo quanto aos impactos financeiro, fiscal e orçamentário da reforma. “Sabemos que as normas da Constituição, nas Disposições Transitórias, preveem que a proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deve ser acompanhada de estimativa do impacto orçamentário”.
O parlamentar também falou sobre a “Portaria Teto Duplex” assinada pelo governo Bolsonaro, em que membros da cúpula do Executivo serão beneficiados com as mudanças. O presidente da República, por exemplo, vai ganhar aproximadamente R$ 41.600,00, ou seja, uma alta de 6%. E o General Mourão, o vice-presidente da República, que é general da reserva, terá aumento de quase 64%, segundo a imprensa, passando a um valor bruto de R$ 63.500,00, uma diferença de 62% a mais do que o teto constitucional. “A recente portaria vai gerar impacto estimado pelo próprio Governo em R$ 66 milhões ao ano”, destacou Rui Falcão. “Fica parecendo que você quer ter um serviço público mais eficiente de um lado, e do outro, mordomia para um pequeno segmento de apaniguados”, completou.
“O senhor diz que tem que economizar, que tem que fazer isso e aquilo, que vai ter uma economia de R$ 300 bilhões, depois diz de R$ 400 bilhões em 10 anos. Ora, a PEC não mexe no teto. Pelo menos, não veio nada na proposta. Pelo oposto, o Governo agora, recentemente, baixou um decreto, uma portaria, permitindo que houvesse duplo teto para ministros, inclusive. Que economia é essa? Ou está claro o lado do Governo, que privilegia alguns e prejudica outros, isto é, o servidor na ponta. Literalmente, é isso o que está sendo feito”, criticou o deputado Alencar Santana (PT-SP).
Em resposta aos deputados, Guedes previu uma economia de R$ 300 bilhões com a menor contratação futura de servidores, segundo cálculos do Ipea.
Privilégios
O governo federal diz que a proposta de Reforma Administrativa vem para combater os privilégios e os grandes salários. Mas os parlamentares apontam que o texto não atinge a “camada de cima”, não atinge o alto escalão, não atinge os membros do governo e muito menos os militares.
“Esses são os setores que mais ganham do serviço público, e eles não estão na PEC: magistrados, procuradores, promotores, deputados, defensores, o Advogado-Geral da União… Não estão. Também não estão na PEC os militares”, reclamou o deputado Rogério Correia (PT-MG).
Segundo levantamento do próprio Ministério da Economia, em 2020 a União desembolsou R$ 19,3 bilhões para dependentes de militares. “Ministro, o senhor não colocou os militares na PEC, que são os que têm, aí sim, o que Vossa Excelência chama de gasto maior. O andar de cima, o extrato superior do funcionalismo público não está na reforma, ministro. Eu estou mentindo?”, questionou Rogério Correia.
A deputada Erika Kokay (PT-DF) defende que a PEC seja retirada de pauta, porque ela é construída “através dos fios da própria mentira”. “Ali fala que é uma PEC para acabar com os privilégios, mas ela não aborda os segmentos que estão no extrateto, aliás em nenhum momento a PEC aborda a questão do extrateto. [A PEC] vai atingir servidores e servidores que em média ganham por volta de 3, 4 salários mínimos. Vai atingir servidores que majoritariamente estão na saúde e na educação. Saúde, educação e segurança são políticas públicas que dialogam com a população brasileira todos os dias”, argumentou.
Estabilidade
Os parlamentares defenderam a manutenção da estabilidade no funcionalismo e lembraram que esse instrumento foi fundamental nos recentes casos de servidores da Polícia Federal e do Ministério da Saúde que denunciaram suspeitas de corrupção e de outras irregularidades no governo.
O deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) disse que o ministro não conhece a íntegra do texto e que o que ele propõe é regulamentar a Constituição Federal de 1988. “Vocês têm a Constituição de 88 como uma Constituição comunista, mas, na verdade, a regulamentação do desempenho não pode significar o fim da estabilidade, porque várias questões, mais paroquiais que o ministro da Economia traz, têm legislação específica para fazer, como uma obra específica, uma frente de trabalho, e todas essas questões a nossa Constituição permite”.
Para o deputado mineiro não dá para colocar em risco o serviço público. “Nós poderíamos trilhar outros caminhos para buscar cada vez mais o fortalecimento do serviço público. É lógico que ninguém aqui defende privilégios”, observou Reginaldo Lopes. Ele ainda reafirmou que a PEC é inconstitucional. “Nós estamos aqui para dizer que, de fato, eu compreendo que esta emenda é inconstitucional, porque ela fere, de fato, um princípio importante, que é o da estabilidade do serviço público”.
“O senhor defende uma PEC que destrói a estabilidade. O Brasil já tem uma proposta de avaliação de desempenho através da Emenda Constitucional nº 19. Mas os senhores aqui propõem um míssil para matar uma formiga. Eu pergunto: a estabilidade não é importante para o combate à corrupção?” Não é fundamental manter-se a estabilidade para o combate à corrupção e ter mais cuidado em relação à avaliação dos servidores? Porque a proposta relativiza a estabilidade, flexibiliza a estabilidade. E já há outros mecanismos propostos de avaliação de desempenho no nosso País”, questionou o deputado Paulo Teixeira (PT-SP).
O ministro da Economia concordou que a estabilidade dá segurança na atuação do servidor público, mas defendeu padrões específicos de avaliação para cada carreira e que a estabilidade só deve ser adquirida após 2,3, 5 anos de serviço público, entre outras propostas.
Direitos adquiridos
Paulo Guedes sempre diz que a PEC não irá impactar nos atuais servidores. Mas para todos os deputados que são contrários à proposta, a reforma implica, sim, em perda de direitos adquiridos e vai prejudicar os servidores atuais.
“Se a reforma é boa, por que ela será feita somente aos futuros servidores, como os senhores dizem? Por quê? Que bondade é essa que eu não vou fazer para o servidor atual? Eu nunca vi alguém dizer ‘eu vou dar aumento e vou dar só para quem vai ser ainda contratado, mas para o atual, não’. Explica-me essa matemática. Qual a razão? Se é boa e é para todos, como disseram que seria a Reforma da Previdência, por que atinge somente o andar de baixo?”, indagou o deputado Alencar Santana.
Para ele, o governo mente ao dizer que a PEC não vai afetar os servidores atuais. “Porque simplifica o processo de demissão e os servidores poderão ser demitidos. Ao comprometer o Regime de Previdência Próprio dos servidores, poderão os servidores lá adiante terem que pagar mais, desembolsar mais para poder sustentar o regime, porque o Governo vai tirar trabalhadores do Regime de Previdência Próprio”, alertou Alencar Santana.
O parlamentar paulista ainda disse que Guedes não conhece a máquina pública e que para modernizar não precisaria da reforma. “O senhor não conheceu o Estado brasileiro atual nesta crise, porque quem salvou o povo foi justamente o servidor público da área da saúde, que se arriscou e perdeu vida. Foi também o profissional de segurança, que continuou trabalhando. Quem agora socorre a classe média, que não consegue pagar a educação privada, é justamente a escola pública, que vai atender não importa quem seja”.
Para o deputado Reginaldo Lopes, Guedes gosta de atacar direitos. “O problema é que a receita do ministro Paulo Guedes, desde quando ele assumiu, é atacar direitos. Vamos ser bem sinceros. É precarização das leis trabalhistas, é precarização das leis previdenciárias, é terceirização, é uma repetição de soluções que não têm nenhuma métrica. Diga-se de passagem, o ministro erra muito. Para enfrentar a Covid, ele falou necessariamente em R$ 5 bilhões”.
Privatizações
O deputado Alencar Santana ainda questionou o ministro sobre a privatização da Eletrobras e da tentativa de privatizar os Correios. “Uma pergunta bem objetiva. Qual é o amigo ou quais são os amigos do ministro da Economia que querem comprar a Eletrobras, que querem comprar os Correios? Quem são essas pessoas que estão interessadas na compra da Eletrobras dessa maneira e, agora, o Correio, vendendo por completo? Estão dizendo que é 100%, destruindo uma empresa de mais de 300 anos”, criticou o parlamentar.
Lorena Vale com Agência Câmara de Notícias