Ministro dos Direitos Humanos anuncia órgão para acompanhar recomendações da Comissão Nacional da Verdade

Ministro Silvio Almeida ao lado da presidenta da Comissão de Direitos Humanos, Luizianne Lins. Foto: Gustavo Bezerra

O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Sílvio Almeida, anunciou nesta quarta-feira (26), em audiência pública na Câmara dos Deputados, a criação de uma comissão para acompanhar a incorporação, pelo Estado brasileiro, das recomendações da Comissão Nacional da Verdade (CNV).

“Vamos criar uma comissão, por portaria, no ministério, para que haja o monitoramento das ações e para que nós possamos estabelecer estratégias de implementação das recomendações da Comissão Nacional da Verdade”, disse Almeida.

Criada por lei em 2012, a CNV investigou violações aos direitos humanos praticadas pela ditadura militar no Brasil (1964-1985). Além das conclusões, apresentadas em 2014, o relatório final do colegiado fez uma série de recomendações ao país, como a responsabilização civil, criminal e administrativa dos envolvidos, sem direito a anistia.

A conclusão do documento lista 434 mortos no período e outras 210 vítimas ainda desaparecidas. No total, 377 agentes do Estado são apontados como responsáveis pelas violações de direitos humanos.

A CNV indicou ainda que o governo deveria criar um órgão permanente para dar seguimento às ações e recomendações da comissão, o que nunca ocorreu. A atribuição acabou sendo assumida pelo Instituto Vladimir Herzog e pela Fundação Friedrich Ebert (FES) Brasil.

Luizianne Lins: “Ditadura foi um dos momentos mais nefastos da história” Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

A deputada Luizianne Lins (PT-CE), que propôs o debate, lembrou que a ditadura militar no Brasil foi “um dos momentos mais nefastos da história”. Ela destacou que, além das mortes e dos desaparecimentos, o regime amordaçou a imprensa, prendeu dezenas de jornalistas, censurou músicas, fez intervenção nos sindicatos, proibiu entidades estudantis de funcionar e fechou o Congresso Nacional. “Mas vivemos um novo momento histórico para a reconstrução da democracia”, disse.

Durante a reunião na Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial da Câmara, as entidades apresentaram dados do monitoramento realizado. Segundo o diretor executivo da Fundação Friedrich Ebert, Christopher Heuser, o relatório mostra que mais de 50% das recomendações ou estão atrasadas ou nunca foram seguidas pelo país. “ É importante não esquecer o que ocorreu, responsabilizar os culpados e nunca permitir que algo assim volte a acontecer”, disse.

Representando o Instituto Vladimir Herzog, Gabrielle Abreu e Rafael Schincariol detalharam as conclusões do monitoramento e afirmaram que das 29 recomendações gerais da CNV, apenas duas foram plenamente cumpridas: a revogação da Lei de Segurança Nacional e a introdução das audiências de custódia no ordenamento jurídico brasileiro. Como destaque negativo, eles apontaram a ausência de responsabilização dos agentes públicos que cometeram graves violações de direitos humanos durante a ditadura militar no Brasil.

“Essas recomendações ao Estado brasileiro visam a não repetição da ditadura e dos seus crimes, o aperfeiçoamento institucional e o fortalecimento da democracia”, destacou Schincariol.

 

Segundo eles, entre as demais recomendações gerais, 14 não foram implementadas, outras 6 realizadas parcialmente e houve ainda 7 retrocessos. Das 13 recomendações especificamente ligadas aos povos indígenas, todas estão em retrocesso. Já as sete recomendações relacionadas a comunidade LGBTQIA+ encontram-se parcialmente atendidas.

“Antes da entrega oficial do relatório à presidente da comissão e ao ministro, eu queria ratificar que o objetivo dessa audiência pública é pedir ao Legislativo e ao Executivo aqui representados a criação de um órgão de seguimento das recomendações da Comissão Nacional da Verdade”, ressaltou Gabrielle Abreu.

Ao atender o apelo pela criação de um órgão de acompanhamento das recomendações da CNV, Almeida reforçou que o país precisa trabalhar para institucionalizar a política de direitos humanos e lutar contra retrocessos. “Nós conseguimos criar uma comissão nacional de residência e, tempos depois, nos encontramos sob o julgo do fascismo que nós achávamos que haviam superado”, disse o ministro, em referência aos ataques antidemocráticos de 8 de janeiro.

Almeida comentou ainda os resultados do monitoramento apresentado. “O fato de que nós não tenhamos conseguido implementar as recomendações da Comissão Nacional da Verdade explica, e muito, o que foi o dia 8 de janeiro. E explica por que é necessário que as pessoas que perpetraram o 8 de janeiro sejam exemplarmente responsabilizadas e, mais do que isso, que nós possamos fazer a relação entre essas pessoas que atacaram a democracia no Brasil e o descumprimento sistemático, pelo Estado brasileiro, de recomendações da CNV e de organismos internacionais”, concluiu o ministro.

Por fim, Almeida defendeu que o Brasil deve admitir internacionalmente a existência de violações aos direitos em seu território e anunciou também a criação de outra comissão para o monitoramento e implementação das determinações da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Também participaram do debate a presidente da Comissão de Anistia, Eneá de Stuz e Almeida, o presidente do Conselho Nacional dos Direitos Humanos, André Leão, e Pedro Dallari, como representante da CNV.

Por Agência Câmara de Notícias

 

 

 

 

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