Os primeiros meses de vigência do governo Bolsonaro colocam o país diante de uma perspectiva sombria que fatalmente conduzirá ao empobrecimento do povo. Está em curso a implementação de um projeto neoliberal radicalizado que passa por três caminhos: a entrega do patrimônio nacional, a perda de direitos dos trabalhadores e o retrocesso nas conquistas dos diversos segmentos da sociedade, que afetam justamente as áreas mais sensíveis e penalizam os mais desprotegidos.
É o caso da ação mais forte do governo neste período inicial, a proposta de Reforma da Previdência, cujo caráter se revela essencialmente antipovo. Dos 1,3 trilhão de reais que a proposta pretende “economizar”, mais de 80% serão retirados dos contribuintes que ganham até dois salários mínimos. Em síntese, os brasileiros terão que trabalhar mais e ganharão menos, desmentindo a propaganda oficial que fala em “fim dos privilégios”. Se esta fosse a intenção, o governo deveria trabalhar pela taxação de lucros e dividendos, que trariam um aporte significativo de recursos para equilibrar as contas.
Bolsonaro montou um ministério a sua imagem e semelhança, que reproduz em variados graus o despreparo, a intolerância e falta de seriedade para enfrentar os grandes problemas do País. Perpassa, de forma geral, em todas as instâncias de governo, uma postura contrária à pesquisa, à cultura e ao conhecimento, com sérios prejuízos ao avanço científico e tecnológico do País, além do desmonte de programas sociais em praticamente todas as áreas.
Antes mesmo da posse, a pregação ideológica do presidente afastou Cuba do programa Mais Médicos, o que, na prática, significou sua extinção. Milhares de vagas não foram preenchidas, principalmente nas localidades mais afastadas, onde não existem outras alternativas de atendimento médico. Na área da Educação, o governo tem sido um gerador de conflitos com professores, pais e alunos, e demonstra seu caráter excludente ao pregar que a universidade deve ser só para uma elite.
Na área da segurança, carro-chefe da campanha de Bolsonaro, não se verificam medidas concretas de combate à criminalidade. Sua única ação, a liberação das armas de fogo, segundo os especialistas, fatalmente produzirá um aumento da violência. Além disso, a constrangedora vinculação de Bolsonaro e sua família com as milícias não encontra, de parte do presidente, nenhuma explicação firme ou mesmo razoável para a série de “coincidências” que embasam as denúncias. Da mesma forma, o ministro Sérgio Moro, que se apresentava como paladino da moralidade pública, se enfraquece escondido sob o manto da omissão.
Toda a respeitabilidade internacional acumulada pelo Brasil durante os governos Lula e Dilma sofre um rápido processo de erosão em função de uma política externa anacrônica, que rompe com as tradições democráticas do Itamaraty nas últimas décadas. Para esse desgaste, corroboram as atitudes e declarações públicas do presidente da República e sua equipe que constantemente espantam o mundo civilizado.
Além da deterioração da imagem do País, já são perceptíveis os prejuízos econômicos deste tipo de postura. Mesmo entre os grandes exportadores do agronegócio, que votaram de forma significativa em Bolsonaro, já se reclamam posição governamental contra a China e o mundo árabe, que começam a fechar mercados para a produção nacional.
Por fim, é preocupante a partidarização de setores das Forças Armadas, que abrem mão de seu papel constitucional de defesa da Pátria para aderir a um projeto de poder que tem se caracterizado pela vergonhosa subserviência às grandes potências, especialmente aos Estados Unidos. Várias ações do governo atendem explicitamente aos interesses norte-americanos, como a venda da Embraer, a desnacionalização da base de Alcântara e a entrega do Pré-Sal. É fundamental que estes setores militares que ocupam cargos de primeiro escalão reflitam sobre a sua participação em políticas que comprometem seriamente a soberania nacional.
A queda da aprovação do governo nas pesquisas e o crescimento das mobilizações contra a Reforma da Previdência, pela autonomia das escolas, pela justiça no caso Marielle, pela liberdade para Lula mostram que a sociedade já percebe a verdadeira face de um governo que se mostra cada vez mais contrário aos interesses da maioria do povo.
*Henrique Fontana é deputado federal (PT-RS), Artigo publicado originalmente na Carta Capital
Foto: Gustavo Bezerra