Especialistas e gestores da cultura, e parlamentares petistas defenderam nesta segunda-feira (10) a regulamentação do Sistema Nacional de Cultura – criado em 2012 durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva – e a transferência direta de mais recursos para o setor no País. Durante audiência pública na Comissão de Cultura da Câmara, foi consenso entre os participantes a defesa pela aprovação do substitutivo ao projeto de lei que regulamenta o Sistema Nacional de Cultura (PL 9474/18), de autoria do deputado Chico D’Angelo (PDT-RJ), e relatado pela deputada Benedita da Silva (PT-RJ), que presidiu grande parte da reunião.
Ao abrir a reunião, a parlamentar petista ressaltou que regulamentar o Sistema Nacional de Cultura (SNC) é um dos maiores desafios da gestão pública para o setor no País. “É preciso assegurar a continuidade das políticas públicas com um nível cada vez mais elevado de estruturação organizacional e com recursos financeiros e humanos, e com a devida representação social das áreas que compõem a cultura brasileira”, afirmou.
Ao concordar com Benedita, a analista técnica de Cultura e representante da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) Ana Clarissa Fernandes disse ainda que a regulamentação do SNC será importante também para acelerar o debate sobre a garantia de transferência permanente de recursos para a cultura, principalmente aos municípios. Segundo ela, a Lei Aldir Blanc, de autoria da deputada Benedita da Silva – e que disponibilizou recursos emergências para o setor cultural – foi uma demonstração do melhor caminho para se financiar a cultura no País.
“Em todo o bolo tributário do País apenas 20% ficam com os municípios, enquanto 26% ficam com estado e 54% com a União. Em contrapartida, segundo dados de 2019 – e que não mudaram muito no ano seguinte -, demonstraram que entre os gastos totais com cultura, cerca de 57% foram feitos pelos municípios, 24% pelos estados e apenas 19% pela União. Não é justo que os municípios tenham que assumir esses investimentos, se não dispõem de acesso a recursos”, observou.
Na mesma linha de raciocínio, o ex-secretário de Articulação Institucional (SAI) do Ministério da Cultura Bernardo Mata Machado ressaltou que a regulamentação do Sistema Nacional de Cultura vai exigir mais recursos para o setor. “Diferente do SUS, que já nasceu com fonte de financiamento definido, e da Educação, que tem o Fundeb, o SNC tem apenas o Fundo Nacional de Cultura, que é muito frágil”, comparou.
Diante desse quadro, Mata Machado defendeu que a regulamentação do sistema proponha o modelo de financiamento baseado na Lei Aldir Blanc, porém com uma fonte de financiamento bem definida e consistente. “Hoje se fala em transferência fundo a fundo, mas vamos transferir o que, se o Fundo Nacional de Cultura é insuficiente?”, ressaltou.
Como exemplo da importância da transferência direta de recursos para o setor cultural, a secretária de Cultura e Economia Criativa do Rio de Janeiro e representante do Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes Estaduais de Cultura, Danielli Barros, ressaltou que a Lei Aldir Blanc foi responsável pelo maior volume já disponibilizado para a cultura no estado do Rio.
“Por conta da Lei Aldir Blanc foi possível transferir, em pouco mais de três meses, R$ 105 milhões para o setor cultural do Rio de Janeiro, que beneficiou 1095 artistas e fazedores de cultura, e apoiou a mais de mil projetos beneficiando 67 municípios. Foi o maior volume de recursos que a Cultura no Estado já operacionalizou”, declarou.
Representatividade e Diversidade
Além da sustentabilidade financeira, a urbanista e especialista em Políticas Públicas e Pesquisadora e Editora do Observatório da Diversidade Cultural, Ana Paula do Val, ressaltou ainda a necessidade de se regulamentar o Sistema Nacional de Cultura reforçando no texto da lei a participação da sociedade no controle dessa atividade.
“Temos que pensar nos atuais atores do setor como agentes ativos do controle das políticas culturais, com forte atuação dos Conselhos de Cultura, das Conferências e dos Planos de Cultura em todos os níveis”, defendeu. Segundo ela, o sistema também tem que garantir a representação da diversidade cultural do País nessas instâncias, do ponto de vista de gênero, raça, etnia e olhando ainda a questão da territorialidade.
Representante do governo federal, o secretário Nacional de Economia Criativa e Diversidade Cultural do Ministério do Turismo, Aldo Valentim, também reconheceu a importância da regulamentação do SNC. O secretário destacou que pela falta desse sistema, que abrange atualmente todos os Estados, mas apenas 2768 dos quase 5600 municípios em todo o País, “houve dificuldade em repassar os recursos destinados pela Lei Aldir Blanc” aos agentes culturais.
Lei Aldir Blanc 2
A deputada Erika Kokay (PT-DF) também defendeu a regulamentação do Sistema Nacional de Cultura. No entanto, ela cobrou do presidente Bolsonaro a sanção da Lei Aldir Blanc 2 (PL 795/21). A proposta foi aprovada pelo Congresso no dia 21 de abril e ainda aguarda o aval da Presidência da República para entrar em vigor.
O texto permite que os recursos destinados a estados e municípios em 2020 para gastos em cultura sejam executados ao longo de 2021. A verba reservada pela proposta original foi de R$ 3 bilhões, mas existe um saldo remanescente de R$ 774 milhões, segundo levantamento da Secretaria Especial de Cultura.
“É preciso a sanção da Lei Aldir Blanc 2, cujos recursos já estão garantidos, e por vários motivos não chegaram a sua finalidade. Estamos oferecendo condições para que esses recursos cheguem aos fazedores de cultura”, afirmou.
Em resposta à cobrança, o secretário Nacional de Economia Criativa e Diversidade Cultural do Ministério do Turismo disse que o secretário de Cultura, Mário Frias, está tentando junto ao ministro da Economia, Paulo Guedes, a liberação dos recursos para atender a prorrogação da Lei Aldir Blanc.
A audiência pública também teve a participação do subsecretário Substituto de Desenvolvimento das Micro e Pequenas Empresas, Empreendedorismo e Artesanato do Ministério da Economia, Fábio Santos Pereira Silva; da representante da Coordenação de Economia Criativa do Sebrae, Jane Costa; e do ator e Especialista em Gestão de Políticas Culturais pela Universidade de Girona, ex-secretário de Cultura de Bragança Paulista Ivan Montanari.
Héber Carvalho