- Por Alexandre Padilha
Em 2011, quando Ministro da Saúde, lançamos o programa Rede Cegonha para assistência obstétrica à mulher no pré-natal, parto, puerpério e ao seu bebê até dois anos de idade. A implantação dessa importante política pública auxiliou na redução da mortalidade materna, neonatal e infantil, o incentivo ao parto humanizado e intensificou a atenção integral à saúde da mulher, oferecendo mais autonomia.
O acompanhamento da Rede Cegonha começa no planejamento reprodutivo, passa pela confirmação da gravidez, pré-natal, parto, pós-parto, até o segundo ano de vida da criança. O programa investiu na qualificação do cuidado à gestante e ao desenvolvimento de seus bebês nos serviços da atenção primária em saúde com o acompanhamento das equipes do programa Estratégia da Saúde, em equipamentos especializados na ampliação e qualificação dos leitos de UTI adulto e UTI neonatal, leitos de gestação de alto risco, novas maternidades e Centros de Parto Normal.
De 2011 a 2016, a Rede Cegonha estava presente em municípios de todos os estados do país, prestando assistência a milhares de mulheres e crianças. É considerada pelo Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) e Conselhos Regionais de Enfermagem a mais bem-sucedida política pública de assistência ao pré-natal, parto e puerpério no Brasil.
Apesar disso, assim como é de costume com toda política pública que dá direitos aos cidadãos, o governo Bolsonaro apresentou portaria que desmonta a Rede Cegonha e institui a Rede de Atenção Materna e Infantil (Rami), sem discutir e muito menos pactuar a nova estratégia de atendimento com estados e municípios.
Essa portaria altera a lógica do cuidado e traz novamente a figura do médico obstetra como assistência integral, acaba com os Centros de Parto Normal e com papel das enfermeiras obstetrizes na condução do parto, também deixando de lado o importante acompanhamento de outros profissionais médicos no pré-natal, estimula a indústria da cesárea no país, não incentiva a promoção da alimentação saudável, entre outros absurdos que só retrocedem a dignidade da saúde integral da mulher.
O Sistema Cofen/Conselhos Regionais de Enfermagem após a divulgação da portaria, publicaram nota de repúdio ao anúncio afirmando que a “Portaria 715/2022 ignora avaliação técnica e dispositivos legais para impor o fim de política pública bem sucedida” e destacaram o reconhecimento da Enfermagem Obstétrica que é reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) na atuação multidisciplinar e com especialistas na retaguarda.
Apresentei um Projeto de Decreto Legislativo que pede a sustação dos efeitos dessa portaria o quanto antes. Não podemos permitir que mulheres e suas crianças sofram pelo descompromisso assistencial de um governo que mostra não se preocupar com atendimento integral em saúde em um dos momentos mais importantes da vida de uma mulher. Não vamos permitir que o trabalho das enfermeiras obstetrizes seja desvalorizado, também é por elas que estamos nessa luta.
A enfermagem brasileira deve ser respeitada. A categoria foi heroína no atendimento à pandemia da Covid-19 e o melhor agradecimento que o Congresso Nacional pode dar a esses profissionais é na aprovação do piso salarial da enfermagem. Também estamos na luta para que ele seja votado o quanto antes. Não vamos permitir que faltem com respeito aos trabalhadores da enfermagem.
*Alexandre Padilha é médico, professor universitário e deputado federal (PT-SP). Foi Ministro da Coordenação Política de Lula e da Saúde de Dilma e Secretário de Saúde na gestão Fernando Haddad na cidade de SP.