Óleo no Nordeste: Comissão vai propor ações para reduzir impactos desse crime ambiental

A comissão externa responsável pelo acompanhamento do derramamento de óleo no Nordeste avaliou nesta quinta-feira (28) os impactos socioeconômicos na cadeia produtiva do pescado, causados pelo desastre ambiental na costa litorânea do Nordeste. O coordenador da comissão, deputado João Daniel (PT-SE), explicou que o colegiado busca medidas de curto, médio e longo prazo para a proteção da saúde e assistência social aos grupos mais vulneráveis. “Buscamos também estratégias para a recuperação da cadeia econômica local da pesca, do turismo e ações capazes de assegurar a manutenção das atividades econômicas regionais”, completou.

João Daniel, um dos autores do requerimento que garantiu a realização da audiência pública, explicou que papel da comissão externa não é o de punir. “Estamos investigando e debatendo, queremos contribuir para a apuração desse crime ambiental ocorrido no Brasil. Vamos também, a partir do trabalho do colegiado e das sugestões apresentadas, preparar legislações para o setor”, afirmou.

O coordenador da comissão informou ainda que, por sugestão do presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, o colegiado além de ajudar na formulação de projetos, vai participar da discussão do orçamento que contemple esse ramo de atividade. “Nós queremos apresentar na próxima semana sugestões para o orçamento com o objetivo de ajudar nessa questão dos impactos e amenizar a situação pela qual passam os pescadores, pescadoras, marisqueiros e a população do Nordeste”, adiantou o deputado.

O deputado Carlos Veras (PT-PE), que juntamente com o deputado João Daniel, sugeriu o debate disse que o derramamento de óleo no Nordeste, que vem ocorrendo desde o fim de agosto de 2019, atinge, sobremaneira, a cadeia produtiva do pescado. Para reforçar sua argumentação, Veras utilizou reportagem veiculada no jornal Correio Braziliense sobre a questão.

“Vendedores relatam queda de até 90% nas vendas de peixe por causa do óleo”. Segundo relatado pelos comerciantes, “a preocupação dos consumidores é sem motivo, já que praticamente toda a mercadoria vendida no local vem de estados da região Sul e Norte, sem ligação com os vazamentos”, diz o jornal.

Para Carlos Veras, os efeitos são dispersos e atingem, também, a produção de pescados em outros estados.

Plano Nacional de Contingência

A professora da Universidade Federal da Bahia, Rita de Cássia Franco Rêgo, que trabalha com saúde do trabalhador artesanal, impactos ocupacionais e ambientais que afetam a saúde do pescador artesanal, participou do debate e afirmou que toda a beleza das praias nordestinas foi sobreposta por “um grande lamaçal de óleo cru”. Segundo ela, faz mais de dois meses e meio que o derreamento de óleo vem ocorrendo e o governo federal não acionou o Plano Nacional de Contingência de acidentes por poluição em águas sobre jurisdição nacional, que foi um decreto presidencial de 22 de outubro de 2013, do governo Dilma.

Ela denunciou também que não foi criado o comitê executivo que é coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente, que tem a função de autoridade nacional desse Plano Nacional de Contingência.

“Os potenciais impactos à saúde devido a toxicologia desses derivados são extensos. O óleo cru é uma mistura de hidrocarbonetos complexos com contaminantes diversos químicos, orgânicos voláteis incluindo produtos químicos tóxicos”, alertou Rita de Cássia. Ela informou ainda que a pesca artesanal corresponde a 75% da pesca produzida no Nordeste e que, atualmente, em estatística aproximada, na região existem 130 mil pescadores artesanais.

Desastre-crime

De acordo com a professora, a população potencialmente exposta, atingidas por esse “desastre-crime” são os trabalhadores de limpeza urbana que estão lá, atuando na limpeza de óleo bruto, os voluntários de limpeza do petróleo – homens, mulheres e até crianças -, e banhistas frequentadores das praias que foram atingidas. “Também são atingidos os consumidores de pescados e mariscos e toda a cadeia alimentar da produção de pescado, mas especialmente os pescadores artesanais e os marisqueiros, além dos trabalhadores informais de tratamento e beneficiamento do pescado”, afirmou.

A professora informou ainda que foi escrito um manifesto que aponta para a necessidade de transparência das informações, em todos os níveis de governo, sobre as providências tomadas, as investigações realizadas, os recursos aplicados, além da declaração de estado de emergência em toda a região afetada. Cobra ainda apoio emergencial aos pescadores, pescadoras e marisqueiros com benefício assistencial, tendo em vista a situação de subsistência e segurança alimentar.

Pescadores já passam necessidade

Maria Martilene Rodrigues de Lima, representante do Movimento de Pescadores e Pescadora Artesanais, em fala emocionada, contou que os pescadores já estão passando necessidade. “Já tem pescadores passando fome. Quem está nos ajudando são as Ongs e as universidades. E agora o governo diz que quem está nos ajudando são criminosos. Enquanto isso, os verdadeiros criminosos – porque isso que aconteceu não é acidente, é crime – não aparecem”, protestou.

A representante dos pescadores lembrou da forma desdenhosa como o governo tratou a questão. “Levamos tapa na cara quando o ministro, o governo, vem a público dizer que o peixe é inteligente e foge do óleo. Isso é fazer pouco de nós pescadores artesanais”, lamentou. Ela disse ainda que não é só a comunidade pesqueira que está sendo atingida, mas a sociedade brasileira como um todo, que consome o pescado do Nordeste.

Maria Martilene lamentou ainda o fato de até agora ninguém saber de onde vem esse óleo. “E parece que não há interesse do governo em descobrir a fonte”, lamentou. “O que podemos pensar de um governo desse que odeia o nosso Nordeste e coincidentemente o petróleo derramado chegou no Nordeste e está avançando para outros estados”, completou.

 

Benildes Rodrigues

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