As medidas do governo Bolsonaro para retirar direitos dos trabalhadores não param. Nesta quarta-feira (14) a Câmara conclui a aprovação da MP 881/2019, que “travestida de modernidade” e apelidada de “liberdade econômica” acaba com o descanso dominical remunerado e fragiliza a possibilidade de cobrança de horas extras, pois acaba com a obrigatoriedade do registro de ponto dos empregados. A Bancada do PT votou contra a medida e tentou reduzir danos ao apresentar destaques ao texto, que não foram aceitos pela base do governo. “Liberdade econômica não pode ser apenas a de quem detém os meios de produção. Isso é um desequilíbrio na relação entre capital e trabalho. E isso é liberdade de quem? Liberdade só de quem detém o capital?”, indagou o deputado Enio Verri (PT-PR).
A deputada Erika Kokay (PT-DF) encaminhou as votações pelo PT e disse que a Câmara, com o voto contrário da Oposição, aprovou não a liberdade econômica, “mas a liberdade de não se cumprir a lei, a liberdade de não se cumprirem os direitos, a liberdade de se precarizarem as relações de trabalho, a liberdade de se avançar sobre aquilo que está consolidado neste País há décadas”, afirmou. O governo Bolsonaro, na avaliação da deputada, quer que “você trabalhe até morrer sem direito à aposentadoria, inclusive, nos domingos e feriados sem pagamento extra”.
Adicional de 100%
Em defesa da classe trabalhadora, a Bancada do PT apresentou destaque para retirar do texto a possibilidade de compensação do trabalho aos domingos com folga determinada pelo patrão em outro dia da semana, sem pagamento de adicional de 100% da hora trabalhada. Atualmente, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT – Decreto-Lei 5.452/43) define o descanso semanal aos domingos como regra. O deputado Fontana argumentou que o trabalho aos domingos hoje é permitido, mas em questões excepcionais, mas tem que haver uma lei, tem que haver um acordo coletivo e se paga 100% de acréscimo.
“Infelizmente essa MP retira esse direito, por isso, eu chamo de liberdade para escravizar, é tornar o trabalho aos domingos liberado para toda e qualquer profissão sem pagar 100% de acréscimo para aqueles que vão trabalhar”, lamentou o Henrique Fontana (PT-RS), ao defender o destaque do PT. E pior, continuou o deputado, “o trabalhador vai ser obrigado a trabalhar aos domingos, e, quando a empresa quiser obrigar, vai dar uma folga durante a semana. Então, termina a concepção do descanso semanal remunerado. É um retrocesso civilizatório para a economia e para a vida social brasileira”, protestou.
Hora extra
A Bancada do PT também tentou retirar do texto da MP a permissão para o empregador usar o sistema de registro de ponto por exceção com acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho. Ao defender a manutenção do registro do ponto, o deputado Fontana argumentou que o registro de ponto é o mecanismo em vigor honesto e transparente do número de horas que um trabalhador, de fato, trabalhou.
“Se ele trabalhou horas a mais do que a jornada normal, ele tem que receber por hora extra. O que inventaram aqui os liberais, chamando de liberdade econômica? Que não se deve mais registrar o ponto. Por que não querem registrar o ponto? É para fazer coisa boa? Os empresários honestos não concordam com essa ideia atrasada. Isso aqui é uma descivilização das relações de trabalho no País. O ponto é a única alternativa que o trabalhador tem para ir à Justiça, se precisar, para cobrar horas extras que não foram pagas”, defendeu Fontana. A base do governo, no entanto, não aceitou e manteve no texto a desobrigação do registro do ponto.
Personalidade Jurídica
O deputado Enio Verri defendeu o destaque do PT que tinha como objetivo impedir que o projeto desconsiderasse a personalidade jurídica do grupo econômico. “Isso é simples de explicar. Se você tem uma holding que tem três, quatro, empresas. Se uma delas descumpre a legislação trabalhista, não paga seus trabalhadores, não contribui com a Previdência, hoje, o grupo tem que pagar, afinal de contas é o mesmo grupo econômico. A direção dessa empresa está em outras, e ela precisa pagar a conta. Mas lamentavelmente a MP 881 retira essa responsabilidade do grupo sobre essa empresa. Isso é um absurdo”, protestou.
Enio Verri disse que a partir dessa desconsideração, uma empresa terceirizada de prestação de serviços que não paga seus servidores, por 3 ou 4 meses, – isso acontece com frequência – as outras empresas que têm a mesma direção, os mesmos sócios, não serão mais obrigadas a responder por isso. “A decisão vai causar um tremendo prejuízo aos trabalhadores. Isso indica o caminho da fraude e da desonestidade”, lamentou.
E, segundo Enio Verri, não adianta esperar que depois digam que os agentes da área do trabalho vão fiscalizar. “Não vai porque não existe no Estado brasileiro quadro de técnicos suficiente para fazer essa fiscalização”, alertou. Para o deputado, com a finalização da apreciação da MP 881, que ainda terá que ser aprovada pelo Senado, “relaxam-se ainda mais os direitos e enfraquecem-se ainda mais aqueles que já são frágeis no Brasil hoje, que são as trabalhadoras e os trabalhadores”.
Vânia Rodrigues