Em sessão solene muito representativa, a Câmara dos Deputados celebrou nessa terça-feira (18) os 25 anos da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM), considerada uma das comissões mais importantes da Casa. O ato simbólico foi proposto pelo presidente do colegiado, deputado Helder Salomão (PT-ES). Ele destacou que desde a sua criação, a CDHM procurou receber denúncias, investigar e cobrar respostas de autoridades competentes contra chacinas, massacres, execuções “e todo o tipo de horror que, ainda hoje, mancha a história da nossa jovem democracia”.
Helder Salomão reconheceu o papel exercido pelos presidentes que o antecederam ao longo desses 25 anos. Para ele, todos foram gigantes na defesa dos direitos humanos, como o fundador e primeiro presidente do colegiado, ex-deputado Nilmário Miranda (PT-MG), que lutou pelos familiares dos mortos e desaparecidos durante a ditadura militar.
O presidente da CDHM reconheceu ainda o trabalho do ex-deputado Padre Luiz Couto (PT-PB), que se dedicou na luta contra a tortura e os grupos de extermínio; a ex-deputada federal Iriny Lopes (PT-ES) que, segundo ele, foi impulsionadora da Comissão da Verdade e da Lei Maria da Penha; e a ex-deputada Manuela D’ávila (PCdoB-RS), que denunciou violações de direitos humanos por grandes empresas.
“Mas os maiores gigantes da história desta comissão não foram parlamentares e nem autoridades. Foram homens e mulheres, indígenas, sem-terra, sem-teto, quilombolas, negros e negras, feministas, mulheres camponesas, LGBTs, atingidos por barragens e pela mineração e muitos outros sujeitos que não aceitaram a opressão como destino”, elogiou o presidente da CDHM.
Alerta contra retrocessos
Helder Salomão e o líder da Bancada do PT, deputado Enio Verri (PR), alertaram para os retrocessos que o atual presidente da República impõe às conquistas do povo brasileiro. Segundo Salomão, as ofensas aos direitos humanos nunca foram tão grandes desde a redemocratização. “Temos, por parte das mais altas autoridades, posturas contra o sistema internacional de defesa dos direitos humanos. Vemos ameaças à liberdade de imprensa, incentivo ao genocídio da população negra e ataque aos mecanismos de participação social”, lamentou. Ele ainda acrescentou que é preciso continuar firme na resistência contra todas violações de direitos.
O deputado Enio Verri lembrou que nesses 25 anos a CDHM tem como marca a defesa da vida, e que nesse período se presenciou a redução da miséria, respeito à vida e às minorias e o avanço na construção de uma sociedade um pouco mais justa. Ele, no entanto, alertou que o Brasil não pode aceitar o que está acontecendo hoje. “É como se estivesse sendo destruído tudo aquilo que sonhamos, tudo aquilo que construímos”, enfatizou.
Verri criticou os movimentos que hoje estão contra a vida, que defendem e permitem a exploração de minérios nas terras indígenas, que aceitam a destruição da soberania nacional e de universidades federais e institutos federais.
“A pergunta é, para nós que defendemos a vida, para onde nós vamos? É um momento de reflexão: Qual é o País que queremos? É este onde o lucro se impõe à vida”, indagou.
“Deixo aqui um desafio que não é só nosso, do Partido dos Trabalhadores, mas é um desafio de cidadania, de juntos lutarmos para que a sociedade possa retomar o seu trilho de uma sociedade civilizada, na procura de justiça e igualdade”, afirmou o líder do PT.
Ele disse ainda que tudo isso só será possível com organização social, sindicatos fortes, organização das mulheres, dos negros, dos índios. “A luta social, somada ao Parlamento, é o que vai fazer diferença ao que está acontecendo hoje no País”, ensinou.
CNBB
Vice-presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Jaime Spengler, fez questão de lembrar da Declaração Universal dos Direitos que, segundo ele, “talvez seja a maior prova de consenso de todos os povos sobre um determinado sistema de valores”. Ele disse que a Declaração é fundamental para a promoção da dignidade da pessoa humana. “O reconhecimento da dignidade de toda a pessoa humana e de seus direitos iguais inalienáveis é a base da liberdade, da justiça e da paz. No entanto, não basta conhecer e proclamar esses direitos, urge que o sistema de poderes os assumam, protejam, observem e promovam”, afirmou Jaime Spengler.
Nesse sentido, ele constatou a triste realidade pelo qual passa o País. Segundo ele, o Brasil vive tempos nebulosos, desafiadores. “Não falta trabalho, sobre tudo nesses últimos tempos em que entre nós parece crescer a falta de abertura e capacidade para ouvir e acolher as diferenças”.
Observatório
O representante regional do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Jan Jarab, anunciou o lançamento do Observatório Parlamentar da Revisão Periódica Universal. Segundo ele, o observatório estará sob a liderança da Comissão de Direitos Humanos e Minorias com apoio do Alto Comissariado. “A Revisão Periódica Universal foi criada em 2006 como um modo de tornar avaliação nos países no âmbito do Conselho de Direitos Humanos da ONU mais transparente, justa e efetiva. O observatório será um marco na história desta Casa”, salientou.
Helder Salomão informou que as atividades do Observatório se iniciarão, formalmente, quando as comissões permanentes forem instaladas no próximo mês. Segundo o deputado, o Observatório se pautará em dois eixos: o de difusão de conhecimento e o de monitoramento das recomendações recebidas e aceitas pelo Brasil, para produção de conteúdo analítico que oriente a ação do Estado e da sociedade.
O parlamentar também informou que o Observatório analisará o orçamento das políticas de direitos humanos, “já que a escassez de destinação de recursos públicos é a gênese da maior parte das violações de direitos no Brasil”.
A criação
O ex-deputado Nilmário Miranda relembrou da criação da CDHM em 1995. Ele disse que para além da criação da comissão, “a tarefa principal agora é a democracia, é lutar por ela, pelo fundamento da Constituição brasileira”.
“Sem ela os direitos humanos viram só uma ação de resistência, não uma política de Estado. E a gente vê esse descompromisso, discursos vazios sobre direitos humanos e sobre democracia, que não correspondem às práticas reais do Estado”, constatou.
De acordo com Nilmário, não se pode admitir em hipótese alguma que movimentos sociais, representantes da sociedade civil sejam tratados como estão sendo tratados hoje no Brasil. “Precisamos retomar aquele espírito de 1995, de que a pessoa, independentemente de ser de partido de esquerda, direita ou do centro, manifestaram compromisso com a democracia, aquela década notável que foi a positivação do direito”.
Ele enfatizou ainda que ao tirar a Constituição do papel, foi possível construir políticas públicas ousadas nos anos seguintes. “Essa comissão foi tão importante nesse processo”, orgulhou-se Nilmário Miranda.
Benildes Rodrigues