O bilionário sul-africano Elon Musk se utiliza da rede social X, adquirida por ele em 2022, para questionar leis, julgamentos, decisões judiciais e sistemas econômicos e políticos de outros países. Tudo para favorecer seus próprios interesses financeiros. Nas publicações que faz, o empresário se posiciona ao lado de representantes da direita extremista, manipulando informações e dando voz a discursos sectários, disruptivos e violentos. Agora em ação no Brasil, a tática dissimulada representa uma escalada de violações às soberanias dos países e tenta colocar em xeque a democracia brasileira.
Musk costuma se valer de princípios próprios para cometer os abusos. Antes mesmo de comprar o Twitter, pela soma de US$ 44 bilhões, ele já havia contribuído para a deflagração de uma crise política e institucional na Bolívia, país rico em lítio, algo que o empresário deseja capturar para as baterias dos carros Tesla, outra companhia de sua propriedade.
Já à frente como CEO do Twitter, rebatizado de X, o empresário, que se diz defensor da liberdade de expressão, suspendeu os perfis de jornalistas críticos à sua maneira de operar, sem qualquer aviso prévio. Eram profissionais do The New York Times, The Washington Post, CNN, The Intercept e Voice of America.
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No início de 2024, derrubou os perfis de outros dois jornalistas críticos a ele, um com 72 mil seguidores e, outro, com quase 500 mil. A arbitrariedade foi novamente cometida sem qualquer comunicação prévia, assim como o restabelecimento das mesmas contas, logo depois de sofrer duras reprimendas de ambos os profissionais banidos da plataforma.
Em 2 de abril, o bilionário sul-africano compartilhou notícias falsas sobre o sistema eleitoral dos Estados Unidos. Na publicação contendo um perfil anônimo, Musk endossava a narrativa de fraude nas eleições, defendida pelo ex-presidente Donald Trump e que culminou no ataque ao Capitólio, em 2021. O conteúdo falso, desmentido pelas autoridades, informava um crescimento de eleitores registrados com documentos sem foto nos estados do Texas, do Arizona e da Pensilvânia.
A plataforma X ainda responde a processo sobre direitos humanos na justiça norte-americana. A companhia de Musk é acusada de contribuir para o cometimento de vários crimes na Arábia Saudita, parceiro estratégico dos EUA, especialmente no setor petrolífero. Em processo civil movido pela irmã de um apoiador humanitário que foi condenado a 20 anos de prisão, a rede social é apontada como responsável pela detenção e tortura de pessoas críticas ao governo do rei Mohammad bin Salman. Elas tiveram seus dados vazados por Musk.
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Ataques na Europa
Na Europa, o empresário agiu para incitar a extrema direita na Alemanha e na Bélgica. Em 6 de abril, o líder mais radical do partido Alternativa para a Alemanha (AfD), Björn Höcke, resolveu se vitimizar na rede X. Ele responde a processo por ter violado o código penal alemão, que proíbe a apologia ao nazismo. Na campanha de 2021, Höcke se utilizou do sombrio “Tudo pela Alemanha”, lema das milícias de Hitler antes de o nazista tomar o poder. “Por que isso é ilegal?”, questionou Musk, em socorro ao extremista da AfD.
Outro radical da direita europeia também foi defendido pelo bilionário sul-africano, dessa vez, na Bélgica. Condenado a um ano de prisão por compartilhar conteúdos racistas e macabros, o ex-parlamentar Dries Van Langenhove elogiou a ideologia nazista, responsável pela morte de milhões de pessoas. A justiça belga vê em Van Langenhove o afã de minar a sociedade democrática e substituí-la por um modelo social de supremacia branca. As mensagens incluíam piadas sobre a fome na África e o sobre Holocausto.
Em 12 de março, Musk aproveitou uma publicação de Van Langenhove para questionar se havia mais alguém condenado à prisão por “enviar esse meme em um grupo de conversa”. O empresário compartilhou a publicação de uma holandesa da direita radical, na qual ela chama a decisão da justiça belga de “total tirania”. Em resposta a Musk, o secretário de estado para a Recuperação Econômica e Investimentos Estratégicos da Bélgica, Thomas Dermine, disse, na rede X, que “o racismo não é uma opinião. É um crime”.
Escalada de abusos
Para Marcio Pochmann, presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a agressão à democracia brasileira perpetrada por Elon Musk é uma ação deliberada e bem executada, pois conta com a melhor tecnologia existente, que somente as chamadas big techs conseguem arcar. Pochmann avalia que o debate sobre a liberdade de expressão nas redes sociais é o pano de fundo escolhido pelo bilionário para afrontar as instituições democráticas brasileiras.
”E por trás dessas ações de guerra contra os países, está a luta pela própria sobrevivência das big techs e desse modelo em que empresas são maiores que países, não precisam obedecer a leis, operam com sua própria constituição (a política de privacidade) e precisam, juntas, combater a soberania dos países e seus povos”, escreve Pochmann, em artigo publicado nesta quarta-feira (10), no site do Partido dos Trabalhadores (PT).
Ao G1, o filósofo Pablo Ortellado, da Universidade de São Paulo (USP), aponta que as agressões de Musk ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e ao presidente Lula representam o ponto mais grave na escalada de abusos contra as instituições de países soberanos. “Ele deu um passo a mais, ele claramente disse que vai descumprir uma ordem judicial”, ressalta Ortellado.
De acordo com o pesquisador da USP, as ações de Musk, em todos esses casos, “tem a ver com a posição da direita com a ideia de que os sistemas constitucionais defendem demais as minorias e limitam as maiorias”.
O Brasil representa um mercado estratégico para o bilionário sul-africano: é o sexto com mais utilização no mundo, somando 22 milhões de usuários, uma parcela de 6% de todas as contas da rede X. O país fica atrás dos Estados Unidos, do Japão, da Índia, do Reino Unido e da Indonésia.
PTNacional, com G1, O Globo, Uol, Associated Press, Deutsche Welle