Nesta quinta (26) a programação que marca as duas décadas de instalação da Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados prosseguiu com o seminário “CLP: 20 anos em defesa da democracia participativa”. O debate trouxe o olhar da academia sobre a democracia brasileira, a institucionalização da participação social e, de modo mais específico, a participação da sociedade civil no processo legislativo. O colegiado é presidido pelo deputado Waldenor Pereira (PT-BA).
Para Luiz Moreira Gomes Junior, mestre em filosofia e doutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais, o Brasil segue o papel determinado aos países do capitalismo dependente que é “ter a sua democracia subordinada para que permaneçamos no neocolonialismo, com a submissão da política do Direito, com a criminalização da política, através de instituições como o Judiciário e Ministério Público. No Brasil, assistimos a interferência dessas instituições, que se converteram em atores querendo intervir em todos os assuntos, abalando as instituições democráticas e republicanas”.
Gomes Junior abordou “Projeto e subordinação: desafios para a democracia brasileira”. Ele afirma ainda que o presidente Jair Bolsonaro tem sido o protagonista de todas as crises e diz que “não há de se confundir a fragilidade pessoal de Bolsonaro com a robustez do projeto político que o elegeu, que começou com o impedimento da ex-presidente Dilma Rousseff e a prisão do ex-presidente Lula”.
Participação da sociedade civil
O mestre em Teoria do Direito e Doutor em Política Social, Daniel Pitangueira de Avelino abordou “Sociedade civil e participação em instâncias institucionalizadas”. Ele contextualizou a participação popular na história do país.
“No Império, foi criado o primeiro conselho para gestão da província. Apenas em 1888 as pessoas escravizadas passam a fazer parte do cenário como cidadãos. Em 1932, as mulheres passam a ter direito ao voto através de uma lei nacional. Em 1941, acontece a primeira Conferência Nacional de Saúde. Entre 1961 e 1964 houve um total descolamento da sociedade do Estado, para impedir a posse de João Goulart. A partir de 1988, com a Constituição que fez um pacto social com a ‘participação de todos’, a partira daí se fala em legislação participativa, como as leis que criaram o SUS e que estabeleceu consultas e audiências públicas na administração pública”, conta Avelino.
Cléber Ori Cuti Martins, mestre e doutor em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, apresentou “Processos Participativos nas Assembleias Legislativas: Organizações e características”. Hoje, 13 assembleias legislativas e 21 câmaras municipais já criaram suas respectivas comissões de legislação participativa.
Para Martins “o princípio de participação previsto na Constituição de 1988, que também foi estabelecido nas constituições estaduais, criou possibilidades para que a participação cumprisse uma função, não de oposição, mas com uma série de medidas para uma interlocução mais efetiva entre organizações sociais e os legislativos e, assim, participar do debate e exercerem funções até de fiscalização do trabalho legislativo. É algo estratégico”.
Experiência da CLP
Paula Vivacqua Boarin, doutora em Ciências Políticas pela Universidade Federal de Minas Gerais coloca que “as desigualdades sociais se reproduzem na participação das instituições no Congresso. Os grupos têm recursos e interesses diferentes, até quando apresentam suas preferências nas comissões e audiências públicas. Nesse sentido, a CLP é um grande tema para estudar a representação de interesses. A maioria das sugestões trata de alteração ou criação de leis, a maior parte trata de política social e direitos humanos. Constatamos também que a CLP é mais atraente para grupos menos poderosos”.
“A CLP e a legitimidade democrática do processo de formação das leis” foi tratada pela doutoranda Ariane Duarte Seleghim. Ela fez da ação da comissão a sua tese de mestrado. “Cheguei em alguns dados como que a maior parte das sugestões são requerimentos para que fossem feitas audiências públicas. Ou seja, pedindo por mais participação, e isso já um ganho para democracia, abrindo espaço para mais pessoas falarem”, diz Seleghim”.
Rony Coelho, doutor em Ciência Política pela Universidade Estadual de Campinas, trouxe considerações sobre “Inovações institucionais e legislação participativa”. Ele estudou a CLP há dez anos para tese de mestrado. “Devido aos ataques às instituições feitas pelo governo federal a situação está mais dramática, com a limitação da participação da sociedade civil na gestão pública. Porém, quando a CLP foi instalada, o país vivia um momento de inovação com, por exemplo, o orçamento participativo criado em Porto Alegre, conselhos e conferências. A participação da sociedade é um processo civilizatório e a CLP, apesar dos limites, é uma inovação institucional, um órgão perene que permitiu o envolvimento do cidadão com o legislativo de forma continuada”.
Thiago Ribeiro Rafagnin, doutor em Política Social e Direitos Humanos pelo Universidade Católica de Pelotas tratou sobre “A Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados e a Efetividade do Art. 3º da Constituição Federal de 1988”. O artigo trata dos direitos fundamentais como objetivos do Estado.
“É preciso que o Estado e a sociedade atuem para atingir essas metas, incluindo a prática do legislativo, através da CLP como meio para chegar aos objetivos de uma sociedade livre, justa e solidária. A importância da Comissão de Legislação Participativa está na busca, cada vez maior, pela efetivação da democracia participativa, e democracia, além de forma de poder é investidura e legitimidade do poder. E essa é uma das razões da CLP, porque somente na democracia participativa que o povo é soberano”.
A íntegra do seminário, em áudio e vídeo, está disponível na página da CLP no site da Câmara dos Deputados.
Assessoria da CLP