Em mais uma rodada de debate na Comissão Especial da Reforma Administrativa (PEC 32/20), palestrantes e parlamentares manifestaram preocupação com o conteúdo privatista e de desmonte do Estado, contidos na proposta gestada pelo governo Bolsonaro e encaminhada ao Congresso Nacional. “O problema é que a alma dessa PEC 32 também é a privatização”, sentenciou o deputado Rogério Correia (PT-MG).
Os temas debatidos na audiência pública nesta quinta-feira (5) abordaram a avaliação de desempenho e a qualificação de servidores públicos.
Correia reclamou da ausência dos defensores da proposta. “Quero deixar registrado que, mais uma vez, ninguém veio aqui fazer a defesa da PEC 32 de Bolsonaro e de Paulo Guedes, ninguém”, lamentou o deputado.
Rogério Correia avaliou que os expositores, independentemente de terem um espectro de indicação mais à direita, à esquerda ou ao centro, “ponderam que é preciso fazer alguma Reforma Administrativa, com o que todos nós concordamos, mas que não é o caso da PEC 32, porque ela não vai melhorar o serviço público, não vai qualificar os servidores públicos”.
“Então, essa pauta que a Câmara tem priorizado é uma pauta privatista que tem levado a esvaziar o Estado brasileiro”, reiterou o parlamentar mineiro.
Interesse mercadológico
O presidente da Associação dos Servidores do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (ASSETJ) e presidente da PÚBLICA Central do Servidor, José Gozze, avaliou que a Reforma Administrativa de Bolsonaro e Guedes não está interessada em melhorar o sistema de serviços públicos e de administração dos servidores. Para ele, trata-se de uma proposta que está voltada ao interesse do mercado.
“Nós estamos numa reforma direcionada ao estado mercadológico. É o mercado buscando tomar conta de parte do serviço público, buscando o lucro, tanto que há artigos na reforma dizendo desse compartilhamento com o mercado”, denunciou.
Segundo José Gozze a PEC 32 rasga a Constituição na sua parte social. “A Constituição virou uma pedra no caminho do mercado, e o servidor público é a pedra no sapato”, criticou.
Objetivo de Guedes
O sindicalista questionou ainda sobre que interesse se tem em melhorar o serviço público “se parte dele poderá ir, como o SUS, o serviço de saúde, a educação, até parte da segurança etcétera e tal, para a iniciativa privada?”.
Para Gozze, está evidente o objetivo do ministro da Economia, Paulo Guedes, com a edição da PEC 32. “Está claro para o ministro Guedes que por que não levar parte do serviço público para iniciativa privada, ou seja, para o lucro”.
Hoje, segundo o palestrante, o serviço público não está preocupado com o lucro, mas com a pessoa, com o atendimento ao cidadão. “Ele não está preocupado em obter lucro, mas a iniciativa privada adoraria trabalhar, por exemplo, com voucher, voucher para a saúde, voucher para a educação etc.”, alertou José Gozze.
Ajuste fiscal
Para o coordenador da Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal e Ministério Público da União (Fenajufe), Fernando Freitas, a PEC 32 é um ajuste fiscal proposto pelo governo Bolsonaro.
“Qualquer Reforma Administrativa ela tem que ser olhada sempre pelo prisma da gestão do serviço público. A proposta do governo já começa pecando por aí porque traz uma Reforma Administrativa com olhar de ajuste fiscal”, criticou.
Segundo Freitas, trata-se de “um erro primário porque coloca o Estado não sob a ótica da prestação de serviço e, sim, do custo do serviço, e aí, a gente tem que diferenciar uma visão de gestão de recursos humanos para uma visão de gestão de recursos econômicos financeiros”.
“Não há não há condição presidente de nós fazermos um debate aprofundado na gestão de competências, da avaliação do servidor público que, ao final, é a avaliação da prestação do serviço público sobre a ótica de uma Reforma Administrativa que tenta impor a nós a visão mercadológica da economia”, defenestrou.
Avaliação de desempenho
Fernando Freitas esclareceu que os servidores públicos não têm receio de avaliação mas dos critérios de avaliação e da forma que essa avaliação pode ocorrer. “A avaliação de desempenho dos servidores, a discussão da estabilidade vem num contexto onde o governo claramente tenta precarizar o vínculo entre o servidor e o Estado”, argumentou.
“Ninguém aqui é contra a avaliação do serviço público, pelo contrário, a avaliação deve ser permanente, aperfeiçoada, porque os serviços públicos precisam de aperfeiçoamento constante”, frisou.
Para o professor da Fundação Dom Cabral Humberto Martins, a gestão do desempenho é mais do que avaliação de desempenho. Segundo ele, a gestão do desempenho tem a ver com a forma como uma instituição ou um conjunto delas definem os resultados dos seus esforços a serem empreendidos “para que, no fim das contas, possa haver uma coisa chamada geração de valor público, para que, no fim das contas, em última análise, os cidadãos beneficiários das políticas e dos serviços públicos possam estar satisfeitos com aquilo que recebem com os impactos das políticas públicas, que isso possa fortalecer a sociedade, que isso possa gerar confiança nas instituições”.
Benildes Rodrigues