CRM de São Paulo quer calar deputado petista que critica a política de saúde mental do governo Bolsonaro

A Câmara dos Deputados tenta impedir no Supremo Tribunal Federal (STF) o prosseguimento de um Processo Ético-Profissional aberto pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) contra o deputado e médico Alexandre Padilha (PT-SP), por causa de uma crítica a mudanças propostas pelo Ministério da Saúde do governo Bolsonaro na política de saúde mental adotada pelo País. Na Reclamação, assinada pela assessoria jurídica da Mesa Diretora da Câmara, são invocadas normas constitucionais que garantem o livre exercício da atividade parlamentar – inclusive por palavras e opiniões.

A Câmara pede também concessão de liminar suspendendo de imediato o processo disciplinar e o julgamento da nulidade do ato do Cremesp. A ação foi distribuída ao ministro Ricardo Lewandowski.

“Os manicômios no período da ditadura tentavam calar os gritos e vozes de quem sofria com transtornos mentais. Hoje tentam calar as vozes de quem critica o retrocesso das políticas de saúde mental do Bolsonaro, que abrem uma avenida para o retorno das práticas manicomiais. Lutamos muito pela democracia, pelo funcionamento do Congresso e para acabar com os manicômios no Brasil e não permitiremos que calem a nossa voz. Utilizaremos todos instrumentos para garantir o direito a opinião e a voz daqueles que não querem o retorno das práticas manicomiais no Brasil”, disse Padilha.

O processo, aberto em maio deste ano, contra o deputado petista foi motivado por um vídeo publicado em fevereiro de 2019, no qual o parlamentar critica uma nota técnica do Ministério da Saúde que defende, entre outros pontos, a autorização para internação de crianças e adolescentes em hospitais psiquiátricos e a compra de equipamentos de eletrochoque (eletroconvulsoterapia) para tratamentos. Segundo o parlamentar, essas ações representariam o retorno de práticas manicomiais já abandonadas pelo País.

No vídeo postado no Facebook, Alexandre Padilha disse: “Loucura não se prende, loucura não se tortura. A prática de liberdade é prática terapêutica para a loucura. Estou dizendo isso porque é muito grave, embora ainda não seja uma medida oficial, mas os rumores, as notas técnicas, as informações dentro do ministério do Bolsonaro de ampliar espaços para os antigos manicômios, autorizar os hospitais psiquiátricos a adquirir, inclusive com recursos do Ministério da Saúde, equipamentos para choque elétrico. Loucura não se prende, loucura não se tortura”.

Ao instaurar o Procedimento Ético-Profissional contra o petista, o Cremesp alegou que o vídeo de Padilha teria desrespeitado o artigo 111 e 112 da Resolução de Ética Médica. O primeiro artigo aponta como infração “permitir que sua participação na divulgação de assunto médicos, em qualquer meio de comunicação de massa, deixe de ter caráter exclusivamente de esclarecimento e educação da sociedade”. O outro artigo (art.112) aponta como falta “divulgar informação sobre assunto médico de forma sensacionalista, promocional ou de conteúdo inverídico”.

Defesa

Em sua defesa junto ao Cremesp, Padilha sustentou que as críticas foram realizadas em sua página de “agente político”, e que todas as questões relacionadas a saúde são tratadas sob a ótica da política pública. O petista disse ainda que nenhuma de suas críticas se enquadra nas vedações da Resolução que dita as normas de comportamento dos médicos, como de autopromoção ou sensacionalismo.

Por sua vez, o Conselho Regional de Medicina de São Paulo alegou que ao se tratar de assunto médico “não é possível separar o profissional que exerce a medicina do cidadão político”. Em resposta a essa argumentação, a assessoria jurídica da Mesa Diretora da Câmara defendeu que justamente pela impossibilidade de separar o médico do político as prerrogativas deste último prevalece, uma vez que são garantidas pela lei maior do País (Constituição Federal) e não por um código disciplinar de classe.

“Exatamente porque não se pode separar o médico do deputado federal que não pode o Código de Ética Médica prevalecer sobre o que dispõe o art. 53 da Carta da República, que assegura a imunidade material aos parlamentares por suas palavras e opiniões. Até o momento, pelo menos, a Constituição Federal de 1988 continua a ser a norma de maior hierarquia da nação brasileira, servindo de fundamento para aplicação de todas as outras normas de hierarquia supralegal, legal ou infralegal”, afirmou a assessoria jurídica da Mesa Diretora da Câmara.

 

Héber Carvalho

 

 

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