O ministro da Justiça, Sérgio Moro, mesmo escolhendo as perguntas que quer responder e ignorando aquelas que considera espinhosas, já entrou em contradição no primeiro bloco de perguntas feitas a ele nesta terça-feira (2), em audiência pública na Câmara dos Deputados. Logo após dizer que não pode reconhecer a autenticidade das conversas que manteve com os procuradores da Força-Tarefa da Lava Jato, Moro reconheceu o diálogo sobre a procuradora Laura Tessler.
A contradição foi em resposta ao deputado Rogério Correia (PT-MG), que iniciou a sua intervenção afirmando que o jornalista Reinaldo Azevedo provou que Moro mentiu aos senadores na semana passada. “Espero que não minta aqui”, pediu e o confrontou sobre a orientação que o ex-juiz deu ao Dallagnol para afastar uma procuradora (Laura Tessler), e ele afastou. “Ela foi afastada porque o senhor achava que ela era ruim para interpelar o presidente Lula, porque ela não era do seu gosto, ela tinha que ser mais firme contra o presidente Lula. Isso é papel de juiz? Isso é trivial ou isso é crime?”, indagou.
Em sua resposta Moro disse que na mensagem que foi divulgada, cuja autenticidade ele não reconhece, não há nenhuma solicitação de substituição. Ele repetiu o trecho da sua conversa com Dallagnol, divulgado pelo The Intercept. “Consta ali na mensagem: ‘A colega Laura, de vocês, é excelente profissional, mas para inquirição em audiência, ela não vai muito bem. Desculpe dizer isso, mas, com discrição, tente dar uns conselhos, para o próprio bem dela, um treinamento faria bem’. Tem um pedido de substituição aqui? Não tem nenhum pedido de substituição?”, explicou.
Indicação de testemunhas
Rogério Correia ainda citou que a revista Veja foi atrás das “testemunhas” que foram fraudadas quando Moro as indicou para o Dallagnol, para a acusação. “Um juiz indicando testemunha para a acusação. E as pessoas confirmaram para a Veja que o mau elemento Dallagnol foi lá, e ainda disse: ‘Liguei e ele arreou’. E combinaram, você e ele, de fazer denúncia apócrifa! Juiz e promotor. Isso é conluio! Isso é o fim do mundo! Ou é trivial?”, questionou indignado. E continuou: “E o senhor disse: ‘A pessoa estaria disposta a prestar informação. E eu estou repassando. A fonte é séria’. Isso é papel de juiz?”
O deputado do PT mineiro ainda citou matéria da Folha, que trouxe o caso do Léo Pinheiro, “e no diálogo ficou claro que não tinham provas, apenas no interrogatório a você. Aí você tirou, de 26 anos e meio de cadeia para ele, para 2 anos e meio, com direito a [prisão] domiciliar e patrimônio”, reforçou. E ainda lembrou conversa do Dallagnol, que disse: “Não pode parecer prêmio por denunciar o Lula”. E reforçou: “Está lá na Folha. Isso é trivial ou é crime? Ou seja, The Intercept, Band News, Folha de S. Paulo, Correio Braziliense, todos confirmam que não há sinais de fraude ou adulteração nas conversas e o senhor vai continuar negando?”.
Rogério Correia encerrou sua participação defendendo CPI para ver se os diálogos são verdadeiros ou não. Ele ainda cobrou de Moro se diante das denúncias feitas, ele na qualidade de Ministro da Justiça, ficar no comando da Polícia Federal, não colocaria em cheque a seriedade das instituições. “O senhor não acha que seria o caso de se afastar do cargo de ministro, ao menos até que as investigações sejam concluídas?”.
Pedido de desculpa
O deputado Helder Salomão (PT-ES), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minoria e um dos autores da proposta de audiência com o ministro, em uma das suas indagações quis saber porque Moro pediu desculpas ao MBL. “O senhor gravou áudio pedindo desculpas ao MBL, isso me causou estranhamento. Se o senhor coloca em dúvida a veracidade das informações divulgadas pelo The Intercept Brasil, porque fazer um pedido de desculpas ao MBL?. A pergunta também ficou sem resposta.
“Isso é rasgar a toga”
A deputada Erika Kokay (PT-DF) questionou o teor das mensagens trocadas por Moro e os integrantes da Lava Jato. Criticou a seletividade das delações e relembrou que Moro, quando vazou diálogos da presidenta Dilma e do ex-presidente Lula, sem autorização judicial para captá-los, disse que o problema ali não era a captação ilegal do diálogo e sua captação. O problema era o conteúdo do diálogo. “Agora mudou o discurso. Hoje é ‘ah, os diálogos, eu não posso confirmar se são verdadeiros ou não, eu não tenho mais os arquivos…’ e um dos procuradores diz que conseguiu recuperar alguns arquivos no celular, no entanto, essas conversas realmente ocorreram” afirmou.
Para Erika isso não é imparcialidade, “isso é rasgar a toga, desmoralizar a Operação Lava Jato e o combate à corrupção”. E concluiu afirmando que vivenciamos um absurdo. “Condena-se Lula por convicções. O próprio senhor Dallagnol tinha insegurança nas provas que ia apresentar. Por isso, diria eu que, entre togas rotas, balas e bijuterias de nióbio, o Brasil está vivendo uma farsa no Palácio do Planalto!”.
As indagações dos deputados ficaram sem resposta por parte do ministro Moro.
Vânia Rodrigues
Foto: Lula Marques