Zeca Dirceu: “Não pode haver anistia e nem tolerância com golpistas”

Líder Zeca Dirceu. Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Em entrevista para revista Isto É,  o líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu, disse que 2024 será um ano de alianças apenas com partidos que possam fortalecer o governo Lula, os candidatos do partido ou aliados que tiverem mais chances como cabeças de chapa, mas sem acordo ou concessões ao bolsonarismo. “Se o PT e o governo não tiverem cuidado podemos ver um aliado abraçado a alguém que nos odeia e vai nos tratar como inimigo durante a eleição. Sempre que puder vou dizer ao presidente Lula que não abra concessão a ministro que esteja na campanha com bolsonarista. Tem de ser tolerância zero com quem é extremista.” Mesmo em municípios onde tem dificuldades eleitorais, diz ele, o PT conta com 20% dos votos, um capital que pode ser negociado com aliados. Certo de que o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) será cassado por caixa dois e abuso de poder econômico, Zeca Dirceu anuncia que é pré-candidato à eventual vaga. O deputado afirma que a bancada na Câmara quer a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann, como ministra na reforma que está sendo organizada pelo governo.

 

Como o sr. viu a efeméride de um ano do 8 de janeiro, na última segunda-feira?

A gente aplaude a postura do Judiciário de continuar julgando, condenando e punindo. Não pode haver anistia e nem tolerância com atitude tão criminosa, terrorista, como ocorreu no 8 de janeiro. E o País conseguiu fazer isso sem parar e sem deixar de tratar os assuntos prioritários. Nós não desejávamos a CPMI, mas a oposição insistiu em criar e acabou evidenciando ainda mais o quanto que o Jair Bolsonaro é responsável por todo esse caldo de cultura antidemocrática, golpista.

O que mudou?

Não tem mais espaço para sentimento de ódio, violência e golpe. Quem tinha dúvida sobre o respeito à democracia e às instituições não tem mais porque está vendo as pessoas sendo condenadas a penas duríssimas. O País viveu um momento muito delicado e triste, mas evoluiu e conseguiu avançar. Mas faltam algumas coisas. Temos que aprovar a legislação para combater a mentira, a propagação do ódio e penalizar quem produz e distribui mensagens insanas, atentando muitas vezes contra crianças nas redes sociais. Acho que o País virou uma página, amadureceu e evoluiu.

Qual será a estratégia do PT nas eleições municipais?

Tenho defendido que além de eleger os seus, o PT estabeleça estratégia de apoiar todos aqueles que têm ajudado Lula a governar. Encaro 2024 como o ano de alianças e de pactos. Não vamos entrar em qualquer disputa só pra marcar posição. A gente tem de ter responsabilidade com Lula e com o Brasil que está esperando soluções em todas as áreas. Mas não pode ter nenhum tipo de tolerância ou concessão com aqueles que já estão se mostrando explicitamente aliados a esse modelo atrasado que o Bolsonaro representa. Sempre que puder vou dizer ao presidente Lula que não podemos abrir concessão ou ser tolerante com o extremismo. Um ministro de Estado, seja lá de que partido for, não pode se aliar a figuras do bolsonarismo. Isso seria inaceitável. Tem de ser tolerância zero com quem é extremista.

O que o preocupa nesse sentido?

Se o PT e o governo não cuidarem, daqui a pouco a gente vai ter gente do governo ou do partido, por uma questão local, abraçando alguém que nos odeia, é adversário e vai nos tratar como inimigo no processo eleitoral. Não podemos fazer essa concessão.

Como será o processo de alianças?

Precisa ter equilíbrio. Vai ter uma política de alianças muito forte para eleger os que são governistas. Importante o governo sair vitorioso da eleição, elegendo gente que apoie partidos que são da base do governo e derrote os bolsonaristas raiz, que são poucos, mas estão aí se preparando para eleições, inclusive com chance de ganhar. Não vamos fazer concessão, mas a exclusão não pode se dar por sigla partidária. No Paraná conheço prefeitos que estão filiados ao PL, mas não têm nenhum tipo de simpatia pelo Bolsonaro. O critério é o posicionamento político, o histórico de vida e o comprometimento com a democracia. Tem de chamar os ministros para uma conversa. O PT é muito grande e pode ser decisivo em muitas cidades. Mesmo em lugares mais difíceis o PT tem 20% do eleitorado.

Parte do radicalismo migrou para o Congresso e busca confrontar o STF. É reflexo da tentativa de golpe?

Com certeza. Um ou outro extremista na Câmara ou no Senado quer transformar criminosos do 8 de janeiro em vítimas, tentando criar uma narrativa insana. Quem está preso e foi condenado é criminoso, atentou contra a democracia e queria destruir as sedes dos Três Poderes dando um golpe. Eles ficaram isolados, se apequenaram e foram para um extremismo que vai custar caro mais adiante. O Lula foi impedido de disputar a eleição de 2018. O Fernando Haddad fez uma bela disputa e nós aceitamos a derrota. Quem per- de na democracia tem de ter postura, caráter de reconhecer a derrota e ir cuidar da vida.

É difícil ser governista num Congresso de maioria conservadora, bolsonarista?

Muito mais difícil do que eu imaginava. Tem deputados e senadores que vivem uma busca por likes, mídia, com repercussão em redes sociais. Para alguns atacar o Supremo entra nesse contexto, que rejeito. Não que não tenha queixas, porque sei o que o Supremo representou para vida do meu pai (o ex-ministro José Dirceu) e para o presidente Lula. Eles pagaram por uma decisão do STF e gente acabou sofrendo junto como família, mas não guardo nenhum tipo de mágoa e acho que não cabe nenhuma revanche ou tentativa de limitar a atuação do Supremo. Claro que é justo e natural que a Câmara queira ser respeitada e não seja tolhida de nada, mas não é com rompantes que a gente vai amadurecer a relação das instituições no País. Trabalhamos inclusive para que aquele texto que veio do Senado restringindo a atuação do STF entrasse na gaveta, onde espero que fique por muito tempo.

Acredita que Bolsonaro deve responder pelo 8 de janeiro?

Ele será responsabilizado! Tem um processo em curso, mas não vamos querer para nossos adversários o que foi feito com o Lula. Não queremos julgamento sem provas, atropelado. Queremos que o processo legal e dentro do Estado de Direito prevaleça para nossos adversários.

O PT já dá como certa a cassação do senador Sergio Moro. Caso ocorra, o que mudaria?

A provável cassação do Moro muda muito a conjuntura política no Paraná. Vamos ter uma nova eleição. Estou muito animado: sou pré-candidato e acho que nós temos uma chance grande. O Requião (ex-governador Roberto Requião) foi nosso candidato ao governo do estado e fez 26,23%. Com a votação que o Lula teve lá, o PT larga com 30% dos votos. A gente tem a condição de ganhar a eleição, o que seria uma façanha muito relevante do ponto de vista político e simbólico.

De onde vem a confiança na cassação?

Pelo que o Moro cometeu. Ele deve ser cassado porque tem provas contra ele. Não estamos fazendo uma vingança e nem um ato à margem da lei. Converso com advogados do PL e do PT, dois partidos bem distintos, apontando a mesma coisa, ou seja, caixa 2, abuso do poder econômico, campanha eleitoral fora de época. São crimes sobre os quais a lei é muito clara: cassação. Se outros já foram cassados por isso, por que ele não vai ser? Estou já com vontade de fazer campanha, mas não posso porque estaria cometendo os crimes que o Moro cometeu.

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, também era candidata.

No PT e na bancada o destino da Gleisi é um assunto bem resolvido: ela deve ocupar um espaço na Esplanada dos Ministérios. Mas isso cabe ao presidente Lula, que sabe qual é o momento. Se ele tomar essa decisão agora, ela vem em boa hora. Gleisi tem toda capacidade para contribuir muito com o governo e com o País. É honesta, qualificada, competente, trabalhadora e muito corajosa. Sabe enfrentar os assuntos mais espinhosos e faz bem o debate político, o que é muito importante. A política muitas vezes é deixada em segundo plano, o que considero um erro, porque ela tem de puxar as ações e decisões de governo.

Deputada Gleisi Hoffmann. Foto: Reprodução PT

Que reforma ministerial o PT defende?

O governo está no rumo certo. Vai ser de forma ampla, com gente diferente, que não esteve na campanha para um governo de união e reconstrução. O governo vai permitir que o Congresso participe da execução orçamentária, vai levar para dentro da Esplanada gente de outros partidos, como União Brasil, PP, Republicanos, MDB e PSD, ocupando cargos dos mais importantes. O governo decidiu romper com aquele período de aposta na polêmica, no conflito, nas ameaças e estabeleceu um processo muito contínuo de diálogo. Trouxe para dentro outros partidos, dialoga e tem votos de uma parte da oposição para temas importantes do País. Lula soube requalificar essa questão de o Congresso influenciar na execução orçamentária. Ficou pra trás o orçamento secreto e veio um processo de programas. O dinheiro está lá dentro dos ministérios, mas tem critérios para liberar. É em cima de questões programáticas.

Mas reclamações, inclusive no PT, sobre demora nos acordos.

É que essa decisão muitas vezes é lenta ou não teve a amplitude que os partidos imaginavam, o que é natural e acontece também em outros países. Partido, líderes, deputados sempre querem mais e nem sempre o governo consegue dar ou então há contratempos. Mas o governo tem cumprido o que combinou.

O Brasil assumiu compromissos com a pauta verde, mas passou a fazer parte da OPEP+. Não há contradição?

Nas agendas internacionais que participei todos, é claro, colocam a pauta ambiental como o principal foco de negociação. O Brasil tem tudo para ser a grande potência ambiental verde de produção de energia renovável, em meio ao petróleo. É um ativo valioso. O Brasil vai trazer eles também para um pouco mais junto dessa transição energética para a qual a Petrobras já tem planos, mantendo a produção do petróleo, mas fazendo a transição para a energia verde. A Petrobras, Rio Grande do Sul, já produz diesel a partir de matéria verde, de soja. Quando se coloca o diesel verde ao lado do petróleo é praticamente igual. Isso mostra que o governo já deu passo para ser uma grande potência verde. Se o Brasil, que não é tão rico como os países do Oriente Médio, faz, esses países também podem produzir ener- gia sem depender só do petróleo. Foi um gol de placa do Brasil e em nada desabona a pauta verde ou a imagem que o Lula foi construindo. Se associa justamente para levar a pauta verde para lá. Não estamos sendo capitula- dos, não mudamos o nosso conceito de cuidar do meio ambiente como uma pauta prioritária. Pode ser que eles mudem com a nossa presença.

IstoÉ #2814 – 17Jan24_240112_065250

Entrevista publicada originalmente na Revista Isto É

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