Zeca Dirceu, líder do PT, diz que vai buscar diálogo com todos os partidos

Foto: Gustavo Bezerra

Deputado federal afirma que CPI dos atos golpistas pode gerar desagregação

O deputado federal Zeca Dirceu (PR), 44, que assumirá a liderança da bancada do PT na Câmara a partir de fevereiro, afirma que buscará diálogo inclusive com o PL do ex-presidente Jair Bolsonaro.

“A minha postura é de muita cautela, de muito cuidado e de disposição para dialogar até com quem não gosta da gente”, diz, em entrevista à Folha.

Ele defende ainda prudência sobre a instalação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para apurar os ataques golpistas de 8 de janeiro.

“CPI pode ser um elemento de confusão, de desagregação, de divisão”, afirma o deputado, segundo quem o colegiado só seria necessário caso as instituições não estivessem atuando plenamente no caso.

Questionado sobre a atuação histórica do PT na oposição, entre elas a pressão pela instalação de CPI para investigar a conduta do governo Bolsonaro na pandemia, o filho do ex-ministro José Dirceu diz que o ex-mandatário estimulou o negacionismo e medidas fora das recomendações das autoridades sanitárias.

Como vai ser a sua atuação na Liderança do PT? Vão tentar isolar o PL?

Da minha parte, há uma disposição, como a gente já fez após os atos terroristas, de dialogar até com os partidos que são da oposição; como foi feito com o PL, que participou ativamente da aprovação da intervenção aqui na segurança pública do Distrito Federal.

Eu imagino ser adequado, nos primeiros dias, talvez no primeiro mês, se evitar temas polêmicos, que possam gerar muito conflito e disputa política. Porque lá fora os golpistas, os terroristas, os criminosos, em boa parte não desistiram ainda dos seus objetivos.

A gente não pode perder foco, se distrair aqui com polêmicas às vezes menores e daqui a pouco nós estamos vendo rodovia ser fechada de novo, acampamento sendo montados, refinaria sendo ocupada ou um bando de doidos tentando de novo ocupar a praça dos Três Poderes.

A minha postura é de muita cautela, de muito cuidado e de disposição para dialogar até com quem não gosta da gente.

Inclusive com o PL?
Sim.

Quais são esses temas polêmicos?
Tem muitos temas que podem ser polêmicos. Esses de pautas de costumes, que envolvem questões de religião, por exemplo, são altamente complexos e difíceis de se posicionar.

E a própria CPI pode ser um elemento de confusão, de desagregação, de divisão. Ainda não dá para medir muito, mas a partir de 1º de fevereiro haverá mais elementos para avaliar.

As providências que estão sendo tomadas pelo Judiciário, Ministério Público, pelos próprios governos, as polícias, o governo federal, elas têm que ser levadas em consideração quando você pensa em criar ou não uma CPI.

Se tudo tiver avançando, todo mundo está sendo identificado, todo mundo sendo punido, inclusive os deputados que possivelmente tenham participado, qual vai ser o papel da CPI?

Se não está sendo feito nada, se o que está indo bem hoje daqui a 15 dias mudar completamente, aí vai caber uma nova avaliação. Eu estou recomendando prudência.

Na pandemia era diferente [ocasião em que o PT defendeu a CPI], o governo não estava agindo ou estava agindo contra.

Qual a posição da bancada com relação a deputados que incentivaram os atos golpistas?

Dura e justa. A gente recebeu aqui denúncias sobre talvez 20, 30 deputados que em tese teriam participado de alguma forma. A gente apresentou denúncia contra apenas quatro, porque para esses apareceu algo consistente, tem vídeo, tem foto, tem testemunho.

Com o avançar das investigações, outros políticos vão acabar aparecendo. Havendo prova, nós vamos encaminhar ao Judiciário, ao Ministério Público, para que as providências sejam tomadas. E quando tiver Conselho de Ética instalado [na Câmara], vamos representar também ao conselho, quando tiver prova.

A próxima Legislatura terá uma base bolsonaristas forte e uma grande bancada do PL [99 de 513]. Ela será de mais confronto ou será possível manter essa unidade criada após os atos golpistas e isolar os mais radicais?

É possível. Tem temas que são de inevitável discordância, vai ter polêmica, e nós vamos administrar. Ninguém leva desaforo para casa, ninguém aceita insulto, ninguém amolece na hora de ter uma vitória, mas o nosso objetivo principal não pode ser destruir a oposição, essas figuras do PL que são caracterizadas como mais bolsonaristas. Não pode ser prioridade.

As prioridades são aprovar as medidas para as políticas públicas voltarem a acontecer. Quando esse tipo de tarefa chegar aqui no Congresso, se alguém for se opor a ela vai se autoisolar. Não vai nem precisar que a bancada do PT ou que o presidente da Câmara [deputado Arthur Lira, do PP de Alagoas] isole.

Você prevê alguma mudança nas legislações para punir parlamentares envolvidos nos atos golpistas?

Se o Judiciário, as polícias ou o Ministério Público entenderem que [mudanças legislativas são necessárias] para poder avançar com a identificação e a punição, acho que vai ter todo apoio não só da bancada do PT, mas do conjunto da Câmara. Agora, a gente também não pode ficar inventando coisa. Se o Judiciário, o Ministério Público e as polícias não precisarem, é desnecessário, uma perda de tempo em um país que tem que cuidar do emprego, da educação, da saúde.

Qual o sr. acha que vai ser a base do governo em fevereiro?

Vai ser uma base com muita incidência das questões regionais e sociais. Vão ter partidos que vão parecer divididos, porque não vão entregar 100% dos votos, e isso é um processo que não pode ser encarado como um pecado, como algo inaceitável. É natural, pelas circunstâncias, que isso [a formação da base] seja feito aos poucos.

E o governo vai se dedicar muito para estabelecer sua relação com o Sudeste, com os governadores, com os prefeitos, e isso leva um pouco mais de tempo. Mas as políticas públicas que vão ser implementadas nesses estados e que vão muitas vezes atender segmentos que se opuseram a nós, como o caso do agronegócio, é que vão acabar mudando a percepção das coisas.

O efeito que as fake news tiveram de 2018 a 2022… quando você é governo, é totalmente diferente. Quando passar seis meses, um ano, e o Lula não fechar nenhuma igreja, como é que fica quem falava que ele ia fechar igreja?

O presidente Arthur Lira foi um dos principais aliados do Bolsonaro. Hoje ele já é da base do governo?

O Lira é um grande aliado das suas palavras, dos seus acordos e dos seus compromissos. Ele tem um histórico aqui [na Câmara]. Nós chegamos juntos em 2011, ele sempre honrou a palavra. O que ele teve com o Bolsonaro não foi por paixão, foi uma questão ocasional, ele cumpriu o papel que ele tinha [que cumprir].

Desejo que aconteça com o presidente Lula também o cumprimento de acordos e, espero que no caso do Lula, tenha paixão também, entusiasmo com o que a gente vai estar fazendo.

Vai ter um componente a mais, que não havia com Bolsonaro, que é o componente de trato. O quanto o Lula é agradável, simpático e humano e o quanto o outro é arrogante, prepotente e que não tem o mínimo de conhecimento para dividir na mesa.

É promessa desse governo haver uma política ambiental transversal, mas e se isso entrar em conflito com as políticas do agronegócio?

Eu acho que só vai ter conflito com aqueles poucos que nem são agricultores, são criminosos que estão lá no garimpo, destruindo a floresta. Eu sou do Paraná e posso falar sobre o que eu conheço. As pessoas do agronegócio, por mais que tenham divergências políticas da gente, por mais que tenham sido injustos e exagerados nas críticas, nas ofensas ao presidente Lula, eles não são criminosos. Eles não estão lá destruindo os rios do Paraná, as florestas.

Na política, vamos ter que ajustar novos termos de relacionamento para, mesmo a gente sendo diferente, se respeitar, dialogar e construir juntos. Quando eu me encontrei com o ministro da Agricultura [Carlos Fávaro], uma das coisas que ele pediu —e o presidente Lula já tinha pedido lá atrás e eu fiz durante a campanha— é conversar com as cooperativas do Paraná. O Paraná tem a maior cooperativa da América Latina, que é Coamo. E lá não tem crime ambiental. Se tiver, é uma exceção.

Eu não tenho dúvida, espero que apareçam as provas de que essa turma do garimpo ilegal, do desmatamento ilegal, foi quem mais financiou [os ataques golpistas]. Até porque eles estão ganhando muito dinheiro.

As falas do presidente Lula às vezes foram distorcidas ou foram mal compreendidas [na campanha, o petista sugeriu que uma ala do agronegócio é fascista e direitista]. Ele também tem essa clareza, ele sabe a diferença do agronegócio bom, positivo, empresarial e que ajuda as exportações do país, que produz alimento, dessa outra parte, que eu nem considero do agro, que são criminosos. Uma minoria, mas com poder de destruição muito grande.

RAIO-X | ZECA DIRCEU, 44 ANOS
Formado em ciências da computação pela Universidade Paranaense (Unipar), está em seu quarto mandato. Filho do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e de Clara Becker, Zeca Dirceu foi duas vezes prefeito de Cruzeiro do Oeste, no Paraná.

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Entrevista publicada originalmente na Folha de São Paulo

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