Acuado entre a perda da popularidade devido aos altos preços dos combustíveis e a pressão do mercado pela continuidade da política de dolarização da Petrobras, Jair Bolsonaro tornou recorrente a ideia de privatização da estatal. Mera ameaça ou não, a presidenta nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), condenou as intenções no plenário da Câmara, e a Federação Única dos Petroleiros (FUP) anunciou que prepara uma greve nacional contra o projeto.
O tema voltou à tona nesta quarta-feira (27), quando Bolsonaro revelou já ter encomendado um estudo sobre a venda ao ministro-banqueiro Paulo Guedes, em entrevista à Rede TV. “Eu no passado, bem lá atrás, eu era contra privatizações, eu mudei bastante. Hoje em dia, falei com o Guedes, vamos começar a estudar esse negócio”, disse, ao falar sobre a solução para os altos preços dos combustíveis.
“Nós temos que partir para acabar com o monopólio, não deixar ir para outro monopólio, mas a gente fazer a Petrobras ter concorrência”, disse Bolsonaro. Ele ainda reclamou que só serve “para levar pancada” por causa da Petrobras e da escalada dos preços dos combustíveis, como se não fosse o responsável direto pela manutenção da política adotada em outubro de 2016, sob o usurpador Michel Temer.
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) abriu processo administrativo sobre a Petrobras, também nesta quarta. O registro no site da CVM não menciona o objetivo da investigação. Mas uma fonte informou a um repórter da Agência Reuters que o processo foi aberto após a Petrobras ter publicado fato relevante na segunda-feira (25), anunciando que questionou o governo sobre a existência de estudos para privatização da companhia. Instantaneamente, o anúncio alavancou para cima as ações da empresa.
Ainda nesta quarta, Gleisi Hoffmann rechaçou a privatização da Petrobras em pronunciamento na Câmara dos Deputados. Ela afirmou que a empresa, estratégica para o País, precisa inverter o rumo para baratear os preços da gasolina, do óleo diesel e do gás de cozinha, e a estatal retomar o papel de vetor do desenvolvimento nacional.
Segundo a deputada, o desmonte da Petrobras começou com o governo golpista de Michel Temer, em 2016, e foi aprofundada pelo governo militar de Bolsonaro. “Tiraram a Petrobras de operadora única (do pré-sal), abriram a concessão dos poços do pré-sal para as petroleiras internacionais, mudaram a política de preço do petróleo e fizeram a política de paridade internacional”, disse a presidenta do PT.
Gleisi também deplorou a venda de ativos da empresa, como refinarias e gasodutos, além do fato de o Brasil hoje exportar petróleo bruto e importar gasolina dos Estados Unidos, com uma política que levou o preço da gasolina a mais de R$ 7 o litro.
A deputada denunciou ainda que os acionistas enriquecem com a dolarização, enquanto os salários estão congelados ou reajustados abaixo da inflação, o desemprego e o subemprego atingem milhões de brasileiros, a inflação dispara e ressurge a fome.
“Reestatização integral é questão de sobrevivência”
Para o deputado Frei Anastácio (PT-PB), a atitude de Bolsonaro e Guedes diante da escalada dos preços tem um objetivo oculto. “É deixar acontecer esse absurdo para criar a narrativa de que a solução será privatizar a Petrobras”. Isso, diz ele, “mostra mais uma vez que Bolsonaro não tem nenhuma preocupação com o bem-estar do povo brasileiro”.
Em postagem em seu perfil no Twitter, o também deputado federal Jorge Solla (PT-BA) complementa o raciocínio. “Barril do petróleo está em US$ 85. Wall Street estima que preço sobe 10 dólares até estabilizar por longo período. Litro da gasolina chegará a R$ 8 – se real seguir perdendo valor, chega a R$ 10. Reestatizar a Petrobras integralmente virou questão de sobrevivência para o Brasil”, aponta.
Barril do petróleo está em US$ 85. Wall Street estima que preço sobe 10 dólares até estabilizar por longo período. Litro da gasolina chegará a R$ 8 – se real seguir perdendo valor, chega a R$ 10. Reestatizar a Petrobras integralmente virou questão de sobrevivência para o Brasil.
— Jorge Solla (@depjorgesolla) October 27, 2021
Para acelerar a privatização da Petrobras, o desgoverno Bolsonaro quer alterar a Constituição com o aval da Câmara e do Senado, como está fazendo com os Correios e já fez com a Eletrobrás. É a leitura do Conselho Deliberativo da FUP, que aprovou em reunião no último dia 21 uma agenda de ações para barrar o processo.
As assembleias setoriais nas bases prosseguem até 12 de novembro. Na sequência, será realizado um novo Conselho Deliberativo para a FUP e os sindicatos avaliarem as propostas discutidas nas bases e definir os próximos passos da mobilização.
“Não vamos aceitar de forma alguma calados esse projeto de privatização”, avisa o coordenador geral da FUP, Deyvid Bacelar. “Eles estão enfrentando a nossa resistência nas tentativas de privatização da Petrobrás, por isso querem impor um projeto de lei que acabe de vez com qualquer possibilidade de reconstrução da estatal. Não vamos permitir isso. A categoria petroleira vai responder à altura e a luta vai ser grande”.
👊🏾Petroleiros preparam greve nacional contra projeto de privatização da Petrobras pic.twitter.com/c8WV6s8Yw5
— CUT Brasil (@CUT_Brasil) October 26, 2021
Venda de ativos da Petrobras
Enquanto não conseguem privatizar a empresa mãe, os governos do golpe seguem fatiando as subsidiárias da Petrobras como um corte de carne na churrascaria. Criado pelo Observatório Social da Petrobras (OSP) em junho, o Privatômetro contabiliza a venda de R$ 231,5 bilhões em ativos da estatal entre janeiro de 2015 e julho de 2021.
Desde o primeiro balanço, com base no relatório do primeiro trimestre de 2021, foram entregues sete ativos, totalizando R$ 15,54 bilhões. A maior negociação foi a venda de 34,1% das ações que a estatal ainda detinha da BR Distribuidora, equivalente a 73% do montante. Também foram vendidos o Campo Dó-Ré-Mi, o Polo de Alagoas, o Campo Papa-Terra, a Gaspetro, a Termelétrica Potiguar e a Cia. Energética Manauara.
Só neste ano, as privatizações somaram R$ 26,86 bilhões. Entre as principais negociações estão as vendas da fatia da BR (R$ 11,36 bilhões) e da Refinaria Landulpho Alves (Rlam), primeira refinaria brasileira, comprada pelo Mubadala Capital, fundo soberano dos Emirados Árabes, por R$ 9,33 bilhões.
A Gaspetro foi comprada por R$ 1,98 bilhão pela brasileira Compass (empresa da Cosan). Também foram entregues 10% restantes da participação da companhia na NTS (R$ 1,88 bilhão) e o Polo de Alagoas (R$ 1,5 bilhão).
Em termos setoriais, a maior privatização do ano foi na distribuição/revenda (BR e Gaspetro), que totalizou R$ 13,34 bilhões. Em seguida, o refino, com a Rlam. A área de Exploração e Produção (E&P), com quatro campos/polos, totalizou R$ 2 bilhões.
Um dos responsáveis pela elaboração e atualização do Privatômetro, Eric Gil Dantas afirma que a Petrobras integrada, do poço ao posto, está sendo substituída por monopólios e oligopólios privados regionais e nacionais.
“Com a venda da Gaspetro, por exemplo, a Compass herdará a participação acionária de 19 das 27 distribuidoras de gás natural do país, participações que variam entre 23,5% e 100%. A Cosan ficará com aproximadamente 80% do mercado de distribuição de gás natural nos estados”, revela Dantas. “Um verdadeiro desastre para o consumidor brasileiro, que pagará cada vez mais caro pelos produtos derivados de petróleo e gás”.
O economista do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos e Sociais (Ibeps) chama a atenção para o caso da BR Distribuidora. Em leilão da Bolsa de São Paulo, 34% dos compradores eram de fora. Agora rebatizada de “Vibra Energia”, 43% de suas ações estão nas mãos de estrangeiros.
“Privatizamos a segunda maior empresa do país, em receitas de vendas líquidas. Uma empresa com 50 anos de vida pública e responsável por fatos históricos do mercado de derivados, como ser a primeira a oferecer Gás Natural Veicular (GNV) e biodiesel em 100% do território nacional”, lamenta Gil Dantas.
Da Agência PT de Notícias