A melhor forma de combater as chamadas “fake news”, ou notícias falsas em português, é apostar cada vez mais na liberdade de informação e na conscientização do uso adequado da internet, além de cobrar da justiça a aplicação da lei nos casos de crime contra a honra ou relacionados a discursos de ódio. Essa foi a síntese da análise da maioria esmagadora dos representantes da sociedade civil, especialistas e parlamentares que participaram nesta terça-feira (19) da Comissão Geral, no plenário da Câmara, que debateu “o tratamento dado às notícias reconhecidamente falsas ou “fake news”.
O líder da Bancada do PT na Câmara, deputado Paulo Lula Pimenta (PT-RS), disse que a internet não pode ser controlada, nem por agências de checagem ou mesmo pelo poder público, e rechaçou a adoção de qualquer tipo de ação que limite a liberdade de expressão.
“Qualquer solução que passe pelo Facebook contratar uma agência para saber o que é verdade ou mentira fatalmente nos levará ao autoritarismo ou à censura prévia. Definir o que é “fake news” é algo muito subjetivo. Nem o Facebook, nem uma agência (de checagem de notícias), nem o TSE podem exercer censura prévia, porque a Constituição garante a liberdade de expressão. A Justiça tem que garantir o que determina o Marco Civil da Internet, que assegura a reparação de crimes como calúnia e difamação”, observou.
Indicado pela Bancada do PT para debater o tema o editor da Revista Fórum, Renato Rovai, demonstrou, na prática, como uma análise subjetiva pode causar uma injustiça. Ele acusou o Facebook, em conjunto com a Agência Lupa (contratada pela plataforma para checar a veracidade de notícias), de terem censurado o site por conta da publicação da notícia sobre o terço abençoado pelo Papa e entregue por um assessor do Papa Francisco ao ex-presidente Lula em Curitiba.
“Pela primeira vez em 30 anos de vida profissional fui censurado. A Fórum foi vítima de censura ao ter um conteúdo retirado de sua página no Facebook. Enviamos à Agência Lupa todas as informações sobre o terço entregue ao Lula. Era uma notícia que não caluniava, não continha racismo, nem era discurso de ódio. Ainda assim, foi feita uma checagem de forma açodada e classificada de “fake news”. E mesmo após o site do Vaticano corrigir a informação e reconhecer que o terço fora mesmo abençoado pelo Papa, a Agência Lupa não voltou atrás e ainda persiste a punição imposta pelo Facebook reduzindo o alcance da página da Fórum”, acusou.
Contra a censura prévia de conteúdo supostamente considerado “fake news”, o jornalista Paulo Moreira leite, colunista do portal de notícias Brasil 247, lembrou que esse tipo de atitude ofende a lei maior do País. “A liberdade de expressão é um valor absoluto garantido pela Constituição brasileira”, atestou.
O outro convidado da bancada, o jornalista Brian Mier, editor do site Brasil Wire, destacou ainda que é enganoso atribuir as “fake news” apenas à mídia independente.
“Grandes veículos de comunicação pelo mundo também manipulam notícias, principalmente durante períodos de guerra. Aconteceu assim com as supostas armas de destruição de massa no Iraque. Portanto, “fake news” não acontece apenas na internet, mas também nos grandes veículos de comunicação do mundo como Washington Post, The New York Times ou na CNN”, afirmou.
Já a secretária-geral do instituto Barão de Itararé, Renata Mielli, alertou para o perigo de se tentar combater as notícias falsas criando uma legislação punitivista. Ela lembrou que existem projetos de lei em tramitação na Câmara, como o PL 9532/18, que chegam a estabelecer prisão de até 8 anos para a produção e divulgação de “fake news”.
Cidadania digital – Ao também participar do debate, a representante do coletivo Intervozes, Bia Barbosa, defendeu que a aprovação da Lei de Proteção de Dados (PL 4060/12) – aprovado recentemente pela Câmara e em análise no Senado – é a forma mais eficaz de evitar o roubo de informações para a criação de perfis “fakes’. Segundo ela, “essa é uma das formas mais utilizadas para a disseminação em massa de notícias falsas”.
A representante do Intervozes também defendeu a educação digital como uma forma de conscientizar os usuários da internet sobre o problema das “fake news”. “Defendemos a educação para a utilização da internet como forma de dotar a sociedade de consciência crítica para analisar as notícias e combater as notícias falsas”, destacou.
Pelo Facebook, a diretora de Políticas Públicas da Plataforma, Mônica Rossino, reconheceu que a forma que a empresa encontrou para combater as chamadas “fake news” é a política de remoção de conteúdos e de perfis fakes. “Temos mais de 15 mil funcionários em todo mundo removendo contas falsas. Somente no último trimestre, foram seis milhões de contas falsas removidas. Também temos reduzido os conteúdos de baixa qualidade, as chamadas notícias caça cliques, além de atuar em conjunto com agências de checagem de notícias, além de programas de alfabetização midiática para conscientizar sobre as notícias falsas”, explicou.
Ao comentar o resultado do debate, o deputado Celso Pansera (PT-RJ), ex-ministro da Ciência e Tecnologia no governo Dilma Rousseff e relator na Comissão de Ciência e Tecnologia de um conjunto de propostas sobre o tema, prometeu apresentar nos próximos dias um parecer sobre o assunto.
“Posso adiantar duas bases que definem o relatório. Primeiro, a mensagem não é o meio. Não podemos criminalizar a internet por conta das mensagens que nela transitam, e nem as plataformas ou agências (de checagem) podem definir o que é verdade ou mentira. Temos lei que já tipifica o que é calúnia, injúria, difamação ou discurso de ódio, previstos no Marco Civil da Internet”, adiantou.
O deputado Luiz Lula Couto (PT-PB), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara (CDHM), também participou do debate.
Héber Carvalho