Entidades avaliaram que o emprego não cresceu e se precarizou com a Reforma Trabalhista, em seminário promovido na Câmara dos Deputados nesta terça-feira (3). Promovido pela Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público, o seminário discutiu os impactos da mudança na legislação trabalhista (Lei 13.467/17), que foi aprovada em julho e entrou em vigor em novembro do ano passado.
Para o deputado Lula Bohn Gass (PT-RS), um dos proponentes para a realização do evento, nenhuma das promessas da Reforma Trabalhista se concretizou: o crescimento econômico, a estabilidade jurídica para a análise dos processos trabalhistas e a geração de empregos.
Bohn Gass defende a aprovação de propostas em tramitação no Congresso para reverter a reforma. Entre elas, o Estatuto do Trabalho (Sugestão 12/18), em análise no Senado. A proposta, sugerida pela sociedade, é uma espécie de nova Consolidação das Leis Trabalhista (CLT) e revoga a reforma.
“Vamos trabalhar para que esse estatuto [do trabalho] possa ter sua aprovação, que é, na verdade, uma nova CLT, e para repor artigos retirados. E vamos reunir todos os projetos, de diferentes deputados, de diferentes partidos, e fazer uma articulação para levá-los à votação na Câmara”, adiantou.
André Santos, representante do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), também afirmou que o objetivo de gerar novos empregos a partir da reforma não foi atingido. “Os dados da PNAD [Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, realizada pelo IBGE] mostram que não houve crescimento do emprego no primeiro trimestre”, apontou.
O Diap avalia ainda que há precarização das relações do trabalho, a partir da inserção na lei de modalidade de contrato que permite a prestação de serviços não-contínua. “O trabalho intermitente deveria existir apenas nas áreas em que é necessário, como buffets, feiras, mas a forma como foi colocada na lei é abrangente, para todos, a ponto de empresários quererem demitir trabalhadores formais e quererem contratar na forma intermitente”, disse. “A reforma precisa de várias correções”, completou.
André Santos destacou ainda que há uma avaliação de entidades como o Diap e o Dieese que a nova lei causou o “efeito de precarização nas relações de trabalho”. Segundo ele, pesquisas revelam também que houve queda no rendimento do trabalhador em torno de R$ 14. “Isso pode não significar muito para a classe média, mas é significativo para o trabalhador que ganha salário mínimo”, ponderou o analista.
Mulheres negras
Marilane Teixeira, pesquisadora do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Unicamp (CESIT), destacou que os postos de trabalho gerados são caracterizados pela precarização e pelos baixos salários. Segundo ela, a taxa de desemprego hoje do Brasil é de 12,7% e atinge especialmente as mulheres negras.
A pesquisadora da Unicamp apontou que nesses seis meses da nova legislação trabalhista, a expectativa de crescimento econômico foi frustrante (expectativa de crescimento que era de 3,7% caiu para 1,5%) e houve retração 2%, numa expectativa de 2,8% no consumo, um dos vetores que alavancam a economia.
Segundo a pesquisadora, os indicadores do mercado de trabalho são termômetros para avaliar os impactos da legislação trabalhista. Para ela, se o objetivo da Reforma Trabalhista era empregar e formalizar nesses primeiros seis meses, não se comprovou. A taxa de desemprego, segundo ela, chegou ao patamar de 12,7%. “É uma taxa de desemprego que está mais associada à perda de posto de trabalho que, necessariamente, a uma pressão no mercado de trabalho por aquelas pessoas que estavam fora do mercado, voltam e não encontram emprego e vão engrossar a fila de desempregados. Não é esta a situação que está ocorrendo no Brasil”, afirmou Marilane Teixeira.
A pesquisadora citou os dados da Pnad, do IBGE – pesquisa que mostrou que havia no primeiro trimestre deste ano 27,7 milhões de trabalhadores subutilizados – 1,2 milhão a mais do que nos três meses imediatamente anteriores. Desses 27,7 milhões, cerca de 10 milhões são de mulheres negras. Subutilizado é um conceito que abrange desempregados, pessoas empregadas que gostariam de trabalhar mais e pessoas que desistiram de buscar emprego, mas estão disponíveis para trabalhar.
Marilane Teixeira enfatizou que trabalhadores sem registro, por conta própria, trabalhadores domésticos são ampla maioria. “Trabalhador sem carteira foi o que mais cresceu no último período”, assinalou.
“Até o momento a Reforma Trabalhista não foi capaz de estimular um processo de formalização do grande contingente de trabalhadores informais gerados até o final de 2017. As formas de contratação atípicas se concentram nos empregos precários e com baixa remuneração”, lamentou.
Grupo técnico
A formação de um grupo técnico para analisar os impactos da nova legislação trabalhista foi uma das contribuições de Clemente Ganz Lúcio, representante do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Segundo ele, a Reforma Trabalhista impacta o sistema de relação de trabalho. “Mandaram oito itens e foram aprovados 300. É uma legislação que foi feita sem nenhuma mensuração dos impactos. Ela altera profundamente a vida laboral”, constatou.
“É importante a criação de um grupo técnico de acompanhamento para olhar de forma sistemática os impactos dessa nova legislação”, defendeu.
Previdência
A Previdência Social foi um dos destaques levantados por Marcos Chiliatto, representante da Comissão Econômica das Nações Unidas para a américa Latina e o Caribe (CEPAL). Segundo ele, qualquer legislação que reduza a formalidade, amplia a rotatividade, reduza o salário e dificulta a contribuição, é um risco para a Previdência. “A nova lei poderá reduzir as receitas da Previdência Social”, alertou.
Para Chiliatto é problemático especialmente o trabalho intermitente, já que o trabalhador pode ganhar menos que o salário mínimo e, neste caso, teria que fazer contribuição voluntária para a Previdência – o que pode não ocorrer. Conforme o pesquisador, as mulheres seriam mais vulneráveis à uma possível generalização de empregos mais precários, assim como os trabalhadores das regiões Norte e Nordeste.
Já Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), observou que a reforma foi feita sem que o governo e o Legislativo dimensionassem os impactos sobre as relações de trabalho, sobre a proteção previdenciária e o impacto fiscal, por exemplo.
“A reforma foi feita com o objetivo genérico de gerar emprego, mas sem mostrar como seriam criados”, disse Ganz. Ele observou ainda que o Brasil foi o 110º país no mundo a fazer Reforma Trabalhista, sendo que resultados de reformas em outros lugares mostram o impacto negativo delas – por exemplo, na Espanha.
Benildes Rodrigues com informações da Agência Câmara Notícias