O deputado Rogério Correia (PT-MG) entrou com uma representação na Procuradoria-Geral da República (PGR), contra o presidente Jair Bolsonaro, pela prática de improbidade administrativa. Na ação, o parlamentar afirma que o presidente praticou o delito ao ter determinado que o laboratório do Exército aumentasse substancialmente a produção da hidroxicloroquina (ou cloroquina) para tratamento da Covid-19, sem qualquer amparo médico-científico.
Segundo o parlamentar, a ação do presidente indica “a prática de ato de improbidade administrativa que resulta em grave dano ao erário, em razão dos indícios de aumento indiscriminado de produção da cloroquina e hidroxicloroquina, além do superfaturamento e compra, mediante dispensa de licitação, da matéria prima para sua fabricação”.
Rogério Correia lembra na representação que, por ordem expressa de Bolsonaro, a produção do medicamento nos últimos meses foi aumentada 84 vezes em relação ao mesmo período compreendido entre os anos de 2017 e 2019, mesmo sem nenhuma comprovação científica ou de organizações médicas que atestassem a eficácia da cloroquina.
O parlamentar denuncia ainda que o Exército pagou um valor seis vezes maior pela matéria prima, destinada à fabricação do medicamento, do que era pago anteriormente. “Os fatos narrados também indicam que o ora requerido dispensou indevidamente a licitação para a aquisição da matéria prima do medicamento que não possui qualquer evidência de eficácia, contrariando, também, as normas estabelecidas pelo Art. 10, inciso VIII da Lei de Improbidade”, aponta a ação.
Ele diz ainda que “a situação supracitada acarreta em injustificável e gravíssimo dano ao erário público, que se agrava ainda mais pelo momento de histórica crise econômica decorrente da pandemia da Covid-19”, afirma o petista.
Na representação, o parlamentar lembra que desde o início da pandemia no País Bolsonaro tenta promover uma suposta eficiência da hidroxicloroquina para o tratamento da Covid-19. Segundo o petista, esse foi um dos motivos que ocasionou a demissão de dois ministro da Saúde em plena pandemia. Em entrevistas após terem deixado o governo, os dois ex-ministros revelaram em entrevistas que saíram porque não concordaram com a pressão de Bolsonaro para reconhecerem o medicamento no protocolo do SUS, para o tratamento da Covid-19.
Charlatanismo e impessoalidade
O parlamentar ainda acusa o presidente de praticar o crime de charlatanismo ao aparecer em público, após ter testado positivo para o novo coronavírus, fazendo uso e incentivando o consumo da cloroquina para tratamento da Covid-19, sem apresentar nenhuma evidência científica. “Por volta das 17h (de terça-feira) tomei um comprimido de cloroquina. Recomendo que você faça a mesma coisa. Sempre orientado pelo médico. É um testemunho meu: tomei e deu certo, estou muito bem”, disse o presidente da República durante sua live semanal, visualizada por cerca de 1,6 milhão de pessoas.
Para Rogério Correia, tal atitude é prevista no artigo 283, do Código Penal Brasileiro. Segundo ele, a norma tem como objetivo “punir aquele que, sendo médico ou não, se promove à custa de métodos questionáveis e perigosos de curar pessoas, de maneira oculta ou ignorada do paciente e do poder público, além de divulgar mecanismos inverídicos de cura, visto não existir nada infalível quando se trata de cura de enfermidades”.
Ainda de acordo com o deputado, ao fazer propaganda do medicamento o presidente Bolsonaro também violou o princípio constitucional da impessoalidade. Na mesma live em que exalta as qualidade da cloroquina, Bolsonaro apresenta a caixa do medicamento fabricado pela empresa SEM, que integra o grupo empresarial de Carlos Sanchez. O empresário, que também é dono do Laboratório Germed, é apontado pela imprensa como um apoiador do presidente e já se reuniu duas vezes com o próprio Bolsonaro durante a atual pandemia.
Dados sobre a produção de cloroquina
Em outra representação, Rogério Correia entrou com um mandado de segurança, com pedido liminar, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), para obter informações imediatas junto ao ministério da Defesa sobre a produção e distribuição da hidroxicloroquina. O parlamentar lembra nesta ação que solicitou esses dados desde o dia 23/06, ao Laboratório Químico e Farmacêutico do Exército, via requerimento aprovado na Comissão Externa da Câmara Destinada a Acompanhar as Ações Preventivas ao Coronavírus no Brasil. Porém, até hoje não foi atendido.
Segundo Rogério Correia, a omissão na prestação de informações está atrapalhando o seu trabalho de controle das medidas públicas adotadas pelo governo, conforme determina o artigo 45 da Constituição Federal. O deputado diz ainda que a atitude de sonegar informações é ilegal porque fere o “direito líquido e certo” garantido na Constituição Federal (art. 5º, XXXIII da CF) e na Lei que regula o acesso a informações no âmbito da administração pública (Lei 12.527/11).
O parlamentar lembra que, mesmo sem comprovação científica, a produção desenfreada do medicamento já ocasiona um estoque nos laboratórios do Exército de 1,8 milhão de comprimidos. O montante é muito superior à demanda média de 100 mil comprimidos, segundo dados da Associação Brasileira de Redes de Farmácia e Drogaria (Abrafarma).
O deputado petista pede que sejam esclarecidas as seguintes questões:
a) as ordens e procedimentos que determinaram a produção da Cloroquina nos laboratórios das Forças Armadas, e a respectiva indicação da data de início de sua produção;
b) informado o parâmetro científico utilizado para embasar a produção em larga escala da Cloroquina, com a apresentação de comprovação fática da efetividade da utilização do mencionado medicamento;
c) informado qual o volume, até o presente momento, já produzido do medicamento, e se já houve distribuição a hospitais. Em caso afirmativo, requer seja informado quais hospitais receberam remessas do remédio, e em que proporção;
d) esclarecido o montante gasto com a produção do medicamento.
Segundo o parlamentar, as informações são necessárias para “verificar o embasamento técnico que autorizou a produção em larga escala de cloroquina pelo governo federal, bem como a real efetividade da aplicação de tal medicamento àqueles enfermos pela Covid-19, que, destaca-se, geraram ônus financeiro significativo aos cofres públicos”.
Veja as ações na íntegra:
NEDD – Representação – ROGERIO CORREIA x Bolsonaro – Cloroquina-convertido
NEDD – MS – ROGERIO CORREIA x Min. Defesa – Cloroquina-convertido
Héber Carvalho