Em artigo publicado no site Brasil 247 e em entrevista às redes sociais do PT na Câmara nesta terça-feira (20), o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) critica o que ele chama de “intervenção oportunista de Temer” e defende um novo modelo de Segurança Pública para o Brasil. “Não podemos aceitar factoides e demagogia. Intervenção militar é oportunismo do presidente Michel Temer, que convoca as Forças Armadas, mas elas não estão preparadas para fazer o papel de polícia”, afirmou.
Reginaldo Lopes, que presidiu na Câmara a CPI de enfrentamento ao homicídio de jovens negros e pobres, afirma que a segurança pública brasileira faliu e propõe uma reforma constitucional estruturante do sistema, para que o País tenha uma segurança que priorize a garantia de direitos, que promova a cidadania e atue na mediação de confrontos e no investimento em territórios de paz. “Não podemos mais ter uma polícia de confronto, e sim de aproximação. É preciso refazer todo o caminho penal no Brasil por meio de mudanças constitucionais”, defendeu.
Leia a seguir a íntegra do artigo e veja a entrevista completa do deputado
Segurança Pública precisa de uma agenda e não de oportunistas!
A intervenção militar no Rio de Janeiro, decretada por Michel Temer, é gravíssima. Não passa, porém, de uma cortina de fumaça de um governo ilegítimo, imoral e impopular que tenta, de maneira covarde, pegar carona no sentimento de insegurança da população. Isso sem enfrentar de fato o verdadeiro problema, que só se dará com uma mudança estrutural – com a participação da sociedade – e que se importe com o futuro da juventude brasileira.
E por que o Rio? A jogada oportunista e autoritária de Temer precisava de um grande cenário, do nosso maior cartão-postal, para muitos a capital cultural do Brasil. Das 50 cidades mais violentas do mundo, nenhuma delas está no estado fluminense, que é o décimo mais violento do Brasil, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Temer e Globo, que é do Rio de Janeiro, autuarão juntos para tentar mascarar um governo pífio e um país em crise.
O interventor militar (agindo em um cargo civil) terá eventuais excessos e arbitrariedades julgados por um Tribunal Militar, um tribunal corporativo. E a população não terá ninguém para recorrer. Um absurdo para um país democrático regido por uma Constituição. A Segurança Pública não é uma atribuição do Exército, que não foi preparado para essa missão e sim para combater um “inimigo externo”. Também é sua função garantir a soberania do país e de suas fronteiras, justamente por onde passam as armas usadas pelo crime organizado brasileiro.
A sociedade precisa urgente dominar o debate sobre Segurança Pública. Lamentavelmente, grande parte da bancada do tema no Congresso Nacional se divide na defesa de corporações diferentes; a polícia civil e a polícia militar. Isso impede um olhar mais abrangente, fora da zona de conforto, e que acaba se comprometendo com a manutenção de um status quo, que está absolutamente falido. Com a sociedade fora da jogada, esse debate fica restrito aos agentes de Segurança Pública que, infelizmente, também não enxergam nenhum palmo à frente do seu nariz corporativista e pouco, ou nada, pensam a política pública.
Definitivamente, o atual modelo fracassou e não é por falta de diagnóstico. 90% dos homicídios no Brasil estão concentrados em 142 municípios. Nesses municípios, os crimes ocorrem em uma faixa territorial, onde a única presença do Estado é a polícia (quando deveria ser a última). A primeira presença deveria ser a da institucionalidade; escola em tempo integral, creche, escolas técnico-profissionalizante, infraestrutura para esportes, cultura, lazer e etc.. O que falta é vontade política.
Fui o autor e presidente de uma CPI de enfrentamento ao homicídio de jovens negros e pobres. Ela atestou que são cerca de 200 jovens mortos por dia, 80% deles, 160, são negros. Com essa intervenção, o Estado assume sua omissão e torna-se protagonista dessas mortes.
Outro aspecto fracassado nesse modelo é a chamada “guerra às drogas”, assim como os Estados Unidos fracassaram no Plano-Colômbia, onde foram gastos trilhões de reais resultando em uma desmoralização na política norte-americana. Não existe uma guerra possível contra as drogas e sim contra as pessoas. Na Comissão sobre o tema na Câmara, em 2011, desenhamos um projeto estratégico de proteção das fronteiras. O, então, vice-presidente Michel Temer era o responsável para pôr em prática, e nada fez…
O que o Brasil precisa é de um novo modelo de Segurança Pública, que priorize a garantia de direitos, que promova a cidadania e atue na mediação de confrontos e no investimento em territórios de paz. Não podemos mais ter uma polícia de confronto, e sim de aproximação. É preciso refazer todo o caminho penal no Brasil por meio de mudanças constitucionais. A CPI realizou mais de 40 reuniões, dentre elas audiências públicas e debates e resultou em diversos projetos, que culminou em uma Agenda Legislativa para 2018.
O uso progressivo da força (PL 2439/2015), a perícia independente (PEC 117/2015), que desvincula perícia criminal das estruturas das polícias, a federalização dos crimes cometidos por milícias privadas e grupos de extermínios (PEC 128/2015), atribuindo a obrigação de apuração ao Estado e a PEC 126/2015 que cria o Fundo Nacional de Promoção da Igualdade Racial, Superação do Racismo e Reparação de Danos, são apenas alguns dos projetos apresentados.
A PEC 127/2015 prevê uma polícia de ciclo completo e que seja avaliada pela sua competência. Hoje, no Brasil, temos duas “meias polícias”, que consomem muito dinheiro para um resultado ineficaz. O projeto visa também a criação do Conselho Nacional de Polícia e da Ouvidoria Nacional de Polícia, que devem ser um instrumento de controle social, além de determinar que as polícias não devam ser força auxiliar do Exército.
Para o enfrentamento a esse alto índice de homicídios, que deverão aumentar no Rio de Janeiro, sou autor de dois outros projetos. O PL 2438/2015 institui o Plano Nacional ao Homicídio de Jovens que estabelece cinco grandes metas para a segurança pública. Nada impossível para a quinta economia do mundo. São elas: 1- Reduzir o índice de homicídios para um dígito a cada 100 mil habitantes (Segundo as organizações internacionais, o estado que o Brasil se encontra é de guerra-civil). 2- Elucidar 80% dos crimes (hoje, se elucida 8% e apenas 3% são condenados.) 3- Zerar a letalidade policial (O policial é garantidor e não violador de direitos.) 4- Zerar a mortalidade entre os policiais, em sua grande maioria, também negros e pobres. 5- Garantir a implementação de programas sociais de reparação de danos nas áreas mais violentas.
Já a PEC 129/2015, que foi aprovada na CCJ em novembro de 2017, estabelece a obrigatoriedade da participação popular no planejamento das políticas públicas relacionadas à Segurança Pública. O projeto aguarda votação para ser aprovado no Plenário da Câmara dos Deputados.
A ineficácia desse modelo atual recai, naturalmente, sobre os negros e os pobres, que pagam a conta com muito mais intensidade do que o restante da sociedade. Não é esse “remédio” dado por alguém sem a menor sensibilidade social e legitimidade para o cargo que ocupa que irá resolver alguma coisa. O que o Brasil precisa é planejar a Segurança Pública, com a participação da sociedade para finalmente, nos livrar do racismo estrutural que permeia a maioria das instituições e corporações brasileiras.
PT na Câmara