Governo beneficia bancos ao permitir empréstimo consignado a quem recebe Auxílio Brasil, agravando ainda mais o endividamento de quem já está em situação de miséria e enfrenta o desemprego
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Armadilha contra os pobres
Reginaldo Lopes (*)
O governo Bolsonaro armou uma verdadeira cilada contra os pobres ao liberar crédito consignado com juros de agiota para famílias que participam de programas federais de transferência de renda, como o Auxílio Brasil. Com juros escorchantes que podem chegar a 98% ao ano, a suposta bondade é na verdade uma bomba-relógio contra os pobres, para ampliar seu endividamento e até comprometer o auxílio pago mensalmente. Na prática, trata-se de retirar dinheiro dos pobres e passar para os bancos.
Diante dessa armadilha montada por Bolsonaro, apresentei, junto com o deputado Alencar Braga (PT-SP), o Projeto de Lei 2.185, para que os juros sobre o empréstimo consignado a quem recebe Auxílio Brasil sejam de 6,16% ao ano, a taxa de remuneração da caderneta de poupança, mais até 5%. Esse percentual está muito próximo da atual taxa Selic (13,75%) e muito menor do que as taxas de juros cobrados pelo mercado financeiro neste tipo de operação de crédito.
É grave o fato de a Lei 14.431/2022 sancionada pelo presidente, fruto da Medida Provisória 1.106, aprovada pelo Congresso, comprometer até 40% do benefício sem limites para cobrança de juros. Ou seja, com parcelas de até R$ 240, já que o benefício, até dezembro, é de R$ 600 por mês. Quem precisa de R$ 2 mil, paga quase R$ 4 mil no final. Isso precisa mudar. Os lucros dos bancos não podem se dar às custas da boa fé do povo e de sua situação de vulnerabilidade!
A lei que cria o ‘Auxilio Banqueiro’ simplesmente agrava ainda mais o endividamento de quem já está em situação de miséria e enfrenta o desemprego, a inflação e a falta de perspectivas em decorrência de um governo que prima por enriquecer ainda mais milionários e bilionários enquanto cresce a pobreza no país. O governo dá com uma mão e tira com outra. Um absurdo.
Os bancos vão emprestar com baixíssimo risco, já que as parcelas ficam retidas pelo governo federal, e estratosféricas taxas de remuneração, uma verdadeira agiotagem em cima das camadas pobres do País. O recurso destinado pelo Auxílio Brasil deve ser direcionado em sua maior parte para as famílias e não sofrer qualquer tipo de desvio, como quer o governo federal.
Instituições que atuam em defesa do consumidor alertam que a lei foi sancionada sem qualquer providência para coibir o assédio das instituições financeiras. Agentes do “mercado” desrespeitam os consumidores diuturnamente com publicidade enganosa sobre empréstimos consignados. Assédios que significam simplesmente golpe. E os mais humildes, sem conhecer regras sobre juros e empréstimos e vítimas de uma crise gerada por Bolsonaro, são os principais prejudicados.
Assumem dívidas que comprometem seu orçamento e ainda reduzem mais o benefício que é destinado a sua manutenção. Os benefícios sociais destinam-se a pessoas desempregadas, fora do mercado do trabalho e que não têm outra renda. Precisam ser defendidas de agiotas que agem com o beneplácito de Bolsonaro. As famílias atendidas pelo Programa Auxílio Brasil estão em condição de vulnerabilidade, em situação de insegurança alimentar, e, neste contexto, o crédito consignado poderá agravar seus problemas.
O número de brasileiros endividados e com contas atrasadas não para de subir, numa clara demonstração da incapacidade de Jair Bolsonaro de melhorar a vida dos trabalhadores. Segundo pesquisa da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo, em julho passado 78% das famílias tinham dívidas e 29% estavam inadimplentes, ou seja, com contas atrasadas. São os maiores índices já registrados na história da pesquisa, que começou a ser feita em 2010. Isso porque governo não consegue apresentar soluções duradouras para a crise. São 66 milhões de brasileiros inadimplentes.
Num quadro de gravíssima crise social e econômica criado pelo governo Bolsonaro, a cilada armada contra o povo é inaceitável.
() *Economista, é deputado federal por Minas Gerais e líder do PT na Câmara dos Deputados.
Artigo publicado originalmente na revista Focus